Gilles Lapouge*
Há dois anos o ministro da Educação Nacional da França, Luc Chatel, expulsou a história e a geografia do ensino médio.
Ele se dizia um homem "moderno", eficaz, prático: essa Idade Média,
com seus reis, suas damas, seus construtores de igrejas, seus camponeses
malvestidos e até analfabetos, tudo isso era antiquado. A data de
prescrição já tinha passado. Para o lixo com a Idade Média!
E, além disso, por que perder tempo com a Renascença? Todos esses
papas libertinos, esses Bórgia, esses "condottieri", esse tal Da Vinci,
esse Giotto, não servem para nada, não vão ajudar a encontrar petróleo.
Não rendem um tostão.
Quanto à Revolução Francesa de 1789, foi um bando de desaforados. E
mesmo Napoleão era um bom soldado, de acordo, mas, enfim, para que serve
narrar o seu gênio e sua loucura para alunos que, mais tarde, vão
dirigir bancos, arrebatarão "partes do mercado" dos chineses ou
construirão estradas do século 21? Ou somos modernos ou não, que diabo!
A história não se deixou envolver. Percebeu-se que os franceses
adoram história. Um jornal popular, o Journal du Dimanche, aumentou sua
tiragem quando promoveu o ensino da história e da geografia. Um protesto
reuniu 28 mil assinaturas de pessoas indignadas.
Retorno. Hoje, depois de dois anos de abstinência, a
história retorna graças ao novo ministro da Educação Nacional, Vincent
Peillon. Ela será novamente ensinada até o último ano do ensino médio e
será uma das provas obrigatórias do exame de admissão à universidade.
Como nos velhos tempos.
A retirada do estudo de história era particularmente escandalosa num
país como a França, como se a soma de 20 séculos tivesse sido segregada,
cristalizada. Paris, Roma, Bahia, Londres ou São Luís do Maranhão, o
que são senão uma caminhada trágica e luminosa pela memória do mundo?
E como compreender os arcanos da "modernidade" se o passado não pode
ser percebido, um pouco como uma imagem que brilha atrás de um cristal?
Em 1939, foi dito ao grande historiador Marc Bloch que era inútil
vasculhar o passado, quando eclodiu a 2.ª Guerra. Bloch respondeu: "Eu
me informo sobre Carlos Magno e Robespierre para compreender a guerra
que Hitler acabou de nos declarar".
Toda a pintura clássica, de Michelangelo a Picasso, de Cranach ou
Dürer a Turner ou Paul Klee, é simplesmente uma maneira suntuosa de
folhear os séculos que nos fabricaram.
Excesso de informação. Ocorre que o currículo
escolar de um aluno do século 21 é tão avassalador que excede a
capacidade de um adolescente comum. Como conseguiria ele amontoar na sua
cabecinha todas as matemáticas, as ciências físicas e a economia, a
ortografia e o inglês, a química, o estudo das leis, etc?
Se continuarmos a abarrotar os cérebros dos estudantes, eles acabarão
explodindo. Esse é um dos grandes desafios do ensino. Esse desafio, a
França acreditou tolamente que havia superado há dois anos, suprimindo
numa penada uma disciplina julgada "inútil".
Não teria sido mais inteligente refletir sobre novas maneiras, novos
métodos de ensino? Essa é uma missão sutil. Talvez seja até uma "missão
impossível".
Contudo, mesmo impossível, ela merece ser levada adiante, em vez de
demolir a grandes marteladas 2 mil anos da memória dos homens.
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/ TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
* É CORRESPONDENTE EM PARIS. Escritor e jornalista francês.
Fonte: Estadão on line, 30/11/2012
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