Celso Ming*
Há quem o tenha admirado pela facilidade com que criava
metáforas engraçadas, como a do sujeito que, lá pelas tantas, metia "o
pé 42 em sapato 38". Outros, pela fluência com que se expressava - ainda
mais elogiável quando se soube que teve de superar uma séria gagueira
na infância. Outros mais, pela especial capacidade de compreensão de um
mundo tão complicado.
Depois de ter sido noticiada a sua morte, na madrugada desta
quinta-feira, muita gente lembrou a grande contribuição que o jornalista
Joelmir Beting deu à tarefa de traduzir o hermético economês para o
brasileiro comum.
Ele deu, sim, enorme contribuição para isso quando soube explicar com
palavras simples o que acontecia no jogo da produção, do emprego e das
finanças pessoais. Mas sua maior contribuição foi anterior. Foi ter
quebrado a resistência das pessoas, das mais simples às de escolaridade
superior, para as coisas da economia, que sempre pareceram tão
complexas. Quem ouvia o Beting se sentia mais seguro para navegar em
águas que antes pareciam tão turbulentas, mesmo não tendo entendido o
assunto.
Pelo menos até meados dos anos 60 a economia era o que a física
quântica é hoje para tanta gente: assunto enfrentado quase
exclusivamente por iniciados. O noticiário de economia nos jornais quase
se limitava a passar recado do governo federal para as chamadas classes
produtoras e o destas para o governo. Era o produtor de café que
forçava o governo federal a fazer mais estoques e era o empresário
têxtil a pressionar por mais liberação comercial para a matéria-prima e
por mais proteção para o produto acabado.
A partir de 1967 veio o chamado milagre brasileiro. As classes médias
precisaram entender as reviravoltas do seu orçamento. As editorias de
economia tiveram, então, de abrir espaço para comunicadores que se
empenhassem em ajudar as pessoas a enfrentar situações novas.
Logo em seguida, o primeiro choque do petróleo, em 1973, e o segundo,
em 1979, pegaram o País no contrapé, atolado na dívida externa. Foi um
tempo de crises recorrentes e enorme inflação, quando o assalariado
recebia no dia 30 menos da metade do salário combinado com o patrão no
início do mês. Um vacilo na administração do patrimônio familiar podia
provocar uma tragédia.
Foi também quando surgiram os comentaristas, cuja principal função
foi ajudar o brasileiro a lidar com esse mundo adverso. Foi uma época em
que até mesmo o Jornal Nacional da TV Globo teve de veicular comentários quase diários sobre o comportamento da economia.
Foi nesse cenário que Joelmir se notabilizou e foi nele que passou o
recado diário ao leitor, ao ouvinte e ao telespectador - sempre com boa
dose de bom humor, qualidade rara em desbravadores. Beting foi um
pioneiro também na comunicação multimídia. Não foi eficiente só na
produção de textos. Tornou-se grande comunicador ainda no rádio, na TV e
nas apresentações para públicos mais restritos.
"O sapo não pula por boniteza, mas por precisão", já filosofou
Guimarães Rosa. E foi também a necessidade criada pela crise econômica
que ensinou o brasileiro a lidar com ela. O titular que me antecedeu
nesta Coluna do Estadão teve grande mérito nessa boniteza.
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* Jornalista econômico
Fonte: Estadão on line, 30/11/2012
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