Luiz Felipe Pondé*
O pior lugar para se olhar quando buscarmos líderes é um departamento de humanidades
Pelo amor de Deus, não confie em intelectuais pedindo emprego em órgãos
executivos. Não estou enterrando meu próprio time, estou apenas dizendo
onde devemos jogar.
A função do intelectual é ler, escrever, dar aula, orientar pesquisas,
participar do debate público, mas não assumir funções executivas porque
somos obcecados por nossas visões de mundo, corretas ou não, somos
monstruosamente vaidosos e pouco democráticos, pelo contrário, adoramos o
poder, e nos achamos superiores moralmente.
Qualquer um sabe o escândalo de como os intelectuais compactuaram com
todo tipo de violência (criadora ou não... risadas?) desde o século 18.
O último lugar onde se deve olhar quando buscarmos líderes é um departamento de humanidades.
As ciências duras geram produtos técnicos, testáveis e que quando erram
são mais facilmente identificáveis. E se nem sempre o são, a causa é
aquilo que o epistemólogo Imre Lakatos chamava de conteúdos exteriores
ao "rational belt", ou cinturão racional, ou seja, componentes
exteriores ao próprio método científico, como fatores políticos,
econômicos, morais, psicológicos.
Nas ciências humanas se pode dizer tudo, porque nada é testável, e
normalmente quando se erra, se inventa alguma hipótese "ad hoc"
(basicamente, neste caso, desculpas chiques) para justificar.
Tanto no marxismo quanto no cristianismo, hipóteses "ad hoc" funcionam
porque ambas são especulações e nada mais. No cristianismo se diz "a
igreja traiu Cristo", no marxismo se diz "a União Soviética traiu a
causa da liberdade".
Quando um de nós assume cargos de gestão, começa a inviabilizar qualquer
iniciativa que não reze na cartilha de suas teorias salvacionistas.
Torquemada, o grande inquisidor espanhol do século 15, patrono dos
intelectuais em ministérios ou secretarias, se sentia moralmente
superior queimando hereges.
Concordo com isso tudo que escrevi acima, mas esta crítica não é minha.
Ela está na obra de um intelectual americano negro quase desconhecido no
Brasil. Friso que ele é negro porque quase todo mundo, devido a nossa
atávica ignorância com relação ao pensamento norte-americano que não
seja o blá-blá-blá do Partido Democrata e da "new left", pensa que
conservador americano em política é sempre branco babão e estúpido.
A razão desta ignorância é porque nossos alunos só podem ler o que achamos que está certo, e sonegamos o resto.
Thomas Sowell é praticamente desconhecido entre nós, apesar de termos a
excelente tradução de sua obra capital "Intelectuais e Sociedade", pela É
Realizações.
"Ungidos", título da coluna de hoje, é um termo usado por Thomas Sowell
no seu "The Vision of The Anointed, Self-Congratulation as Basis for
Social Policy", Basic Books, 1995 (a visão do ungido, autocongratulação
como base para política social). Esta obra é uma excelente "entrada"
para conhecer seu pensamento. Uma das vantagens é que ela é bem menor e
menos complexa do que "Intelectuais e Sociedade".
Nela, Sowell mostra como esta classe de ungidos (a esquerda que tem
formado a maior parte das políticas públicas nos EUA e Ocidente em
geral) falou besteiras nos últimos anos, principalmente em três áreas:
1. "Guerra à pobreza" (suas ideias apenas pioraram a miséria), 2.
"Educação sexual" (destruíram a família, os laços afetivos e a relação
entre homens e mulheres) e 3. "Justiça e combate ao crime" (criaram um
blá-blá-blá que o criminoso é criminoso porque é vítima da sociedade e,
portanto, se você é assaltado, a culpa é sua, e não dele, o que só
piorou muito a segurança pública).
O padrão de funcionamento deles é basicamente dizer/fazer o seguinte: 1.
Catástrofes vão acontecer e não percebemos, só eles. 2. Ação urgente
necessária que só eles sabem qual é. 3. Necessidade de medidas
drásticas, criadas por eles, uma minoria ungida e mimada, para uma
maioria ignorante. 4. Desprezo por todo argumento contrário, acusado de
ser coisa de gente malvada, desinformada, irresponsável e motivada por
interesses duvidosos (eles, claro, são movidos pela pureza de coração).
Você reconheceu o padrão?
----------------
* Filósofo. Prof. Universitário. Escritor. Colunista da Folha
Nenhum comentário:
Postar um comentário