Entrevista Gerd Leonhard
Eduardo Knapp/Folhapress
Gerd Leonhard, que esteve em São Paulo no começo do mês.
Para futurólogo alemão, país tem chance de liderar em áreas como tecnologia verde, direitos
autorais e liberdade da internet
autorais e liberdade da internet
O Brasil ainda está no início de sua "espiral de crescimento" e, por
isso, ainda tem chances de apresentar ao mundo um novo modelo de
desenvolvimento econômico.
A análise é do pensador alemão Gerd Leonhard, 52, considerado um dos
principais futurólogos da atualidade pelo jornal "Wall Street Journal" e
autor de cinco livros sobre o futuro das indústrias da mídia e dos
negócios.
"Copiar o modelo adotado pelos Estados Unidos nos anos 80 não vai
funcionar no novo cenário de negócios, onde tudo está globalmente
conectado", afirma Leonhard, em entrevista à Folha durante visita recente ao Brasil.
Segundo ele, o país pode criar modelos mais sustentáveis de crescimento,
que envolvem não apenas a vanguarda em áreas como tecnologias "verdes",
mas também temas como direitos autorais e liberdade da internet.
Leia a seguir os principais trechos da conversa.
(MARIANNA ARAGÃO)
Folha - Muita coisa mudou na indústria da mídia desde o seu primeiro
livro, de 2005, que fala sobre o futuro da música. Quais foram as
principais mudanças?
Gerd Leonhard - Uma das principais mudanças foi que os
dispositivos móveis tomaram conta da internet. No Brasil, vai haver 100
milhões de pessoas conectadas à web com esses aparelhos até 2015 e o
mesmo ocorre na Rússia, na China e na Indonésia.
Isso dá poder de consumo a essas pessoas e muda a forma de comunicação,
por exemplo. As redes sociais têm se desenvolvido e se tornado a
principal plataforma de comunicação no mundo.
Não é à toa que o Facebook se tornou o que é. Ele tem 1 bilhão de
usuários e perfis profundos sobre eles. São ativos valiosíssimos, que
dão à empresa a oportunidade de criar um novo sistema social.
Por isso acredito que o Facebook vai ser maior do que o Google em breve.
Como as empresas do setor conseguirão lucrar nesse novo cenário?
O grande problema é que, naturalmente, há uma redução do valor da mídia
no meio digital em relação ao físico. Geralmente, as pessoas estão
dispostas, no digital, a pagar apenas um décimo do que pagam pelo
impresso. É uma redução dramática.
Por que isso ocorre?
Porque a percepção sobre a propriedade intelectual física é totalmente
diferente da do digital. Quando assisto um vídeo na internet, via
"streaming" [transmissão em tempo real], não tenho a mesma sensação de
propriedade do que quando compro um DVD. Isso é inevitável.
O que precisamos fazer é criar grande economia e eficiência na produção e
na distribuição de mídia de forma a reduzir os custos e, depois,
encontrar novas formas de monetizar o digital.
As empresas de outros setores também precisarão migrar para o digital?
Sim. A transição para o digital, que ocorreu apenas no espaço do
consumidor, do consumo de mídia, de música ou de filme, passa a afetar
também o ambiente das empresas, de diversos setores: saúde, educação,
financeiro.
Já vemos isso ocorrer com as companhias que usam ferramentas de colaboração on-line para buscar soluções para seus negócios.
Estratégias como essas serão cada vez mais comuns no mundo dos negócios.
O que o Brasil precisa fazer para se tornar um líder global realmente?
O que aconteceu no Brasil nos últimos cinco anos foi fantástico. O ponto
principal para o país agora é resistir à tentação de copiar os Estados
Unidos, onde a crença em lucro e crescimento é tudo. Porque não é.
Hoje, podemos ver que isso não funciona. Crescemos, construímos,
gastamos e lucramos cada vez mais, mas isso não tem se traduzido em uma
sociedade mais igualitária e sustentável. Esse espiral de crescimento
vai até o topo, mas entra em colapso.
Como podemos começar a buscar esse caminho?
O Brasil ainda está no início da trajetória de crescimento. Por isso,
tem uma oportunidade única de criar um modelo de crescimento
"brasileiro". Investir, por exemplo, em ecoturismo, energias renováveis,
carros elétricos, educação digital.
O país poderia ter uma lei inovadora, que definisse regras para o uso de conteúdo na internet ou a legalização dos downloads.
O Brasil discute neste momento o marco civil da internet. Quais direitos devem ser preservados nessa legislação?
A premissa básica da internet é mantê-la aberta, transparente e
acessível a todos. Por isso a neutralidade da rede é um tema crucial. O
certo a se fazer é manter a legislação de uma forma que isso seja
preservado.
É preciso criar um sistema de licenciamento que legalize e monetize o
conteúdo na internet, em vez de apenas tornar ilegal e criminalizar o
usuário. Esse é o único caminho que faz sentido e que não representa uma
regressão ao velho mundo.
Raio-X: Gerd Leonhard
52 anos
NASCIMENTO
Bonn (Alemanha)
FORMAÇÃO
Teologia e sociologia na Universidade de Bonn e música na Berklee College of Music, de Boston
CARREIRA
Trabalhou como guitarrista, produtor musical e foi empreendedor de internet; hoje, sua consultoria, baseada na Suíça, atende empresas como Nokia, "The Guardian", Google e Ogilvy
LIVROS
"The Future of Music" (2005), "The End of Control" (2006) e " Friction is Friction (2009), entre outros
PRÊMIOS
"Quincy Jones Award", da Berklee College
--------------
Fonte: Folha on line, 18/11/2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário