Juremir Machado da Silva*
Passei o dia no CNRS, o prestigioso Centro Nacional de
Pesquisa Científica da França, em Paris, onde Michael Oustinoff e
Dominique Wolton comandaram um colóquio em defesa da diversidade
cultural e linguística como patrimônio universal e base para a
criatividade, a inventividade e as novas ideias.
Falei à tarde.
Dividi a mesa com um físico e um sociólogo.
Entre os palestrantes, havia franceses, canadense, belgas, suíço,
português, inglês. etc. Um mosaico de intervenções complementares e
antagônicas.
Ao final, a ministra encarregada dos Franceses no Exterior fez um
discurso político em favor da importância do multilinguismo nas
ciências.
Por fim, Claude Hagège, um dos mais valorizados linguistas da França,
sustentou que a hegemonia de uma única língua tem consequências
cognitivas de formatação cultural. Meu cérebro agradece. Foi bastante
sacudido.
Trabalhei bem.
Mereço um vinho em companhia dos amigos agora à noite.
Nos intervalos e no almoço, preocupações com a crise europeia: para
onde vai a França. Os mais pessimistas temem que a França venha a ser a
nova Grécia. Os mais otimistas relativizam: no máximo, uma nova Espanha.
Enquanto isso, em Portugal, greve geral.
Na Bélgica, greve parcial.
Passeatas em Madrid, Berlim e Bruxelas e, obviamente, na Grécia.
Na França, 130 manifestações aconteceram só nesta quarta-feira.
Todas contra as chamadas medidas de austeridade.
População irada nas ruas de 22 países da Europa.
Não à austeridade.
Sim à Europa social.
Na frente da Assembleia Nacional, Stéphane Gatignon, prefeito de
Sevran, faz greve de fome em defesa de mais apoio financeiro para as
pequenas cidades.
O presidente da República, François Hollande, falou, mas não convenceu.
Pediu tempo para aplicar o seu método de reconstrução do país.
Não convenceu.
A esquerda garante que ele está mesmo guinando para a direita.
A direita entende que ele permanece, no máximo, no centro.
Como a vida continua, nesta noite tem França e Itália no futebol.
Jogo tido como uma revancha da Copa do Mundo.
Nas ruas, frio.
Um outono quase gelado.
Paris com aquele jeito melancólico das grandes cidades depois do verão.
Aquela atmosfera de silêncio contido em meio à quase explosão.
A ira queimando os corações.
A política e a literatura retomando todos os espaços e direitos.
A vida encolhendo dentro dos casacos e transbordando nas críticas e
nas polêmicas em torno do terrorismo, da precarização do trabalho e do
desalento em relação ao futuro duvidoso.
Na Córsega, o presidente da Câmara de Comércio foi fuzilado.
Os ódios nunca se apagam na velha Europa de tantas guerras.
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* Sociólogo. Prof. Universitário. Tradutor. Escritor.
Fonte: http://www.correiodopovo.com.br/blogs/14/11/2012
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