Desafio é evitar armadilhas comuns a presidentes reeleitos e preservar legado
NOVA YORK e WASHINGTON — O presidente Barack Obama ainda estava nos
bastidores do centro de convenções McCormick Place, em Chicago, após o
discurso da vitória na madrugada de quarta-feira, quando disparou
ligações para os líderes da oposição pedindo colaboração. O gesto marcou
o início antecipado de sua nova temporada na Casa Branca e evidenciou
sua disposição de evitar a maldição do segundo mandato - na qual
presidentes reeleitos caem na armadilha dos erros estratégicos, do ego
inflado pela vitória e de uma agenda pouco inspirada, e acabam por se
despedir chamuscados por conflitos ou menores do que entraram. Para
Obama, chancelado por 65 milhões de eleitores e rechaçado por 62 milhões
deles, o caminho para o sucesso passa por explorar as fragilidades do
Partido Republicano e por tornar-se um líder incisivo, mas capaz de
forjar novas alianças em torno de seu projeto de governo.
Arrancando o segundo mandato numa eleição com tom de referendo sobre sua política econômica, nada mais natural que resida na economia um dos fatores que determinarão o sucesso ou o fracasso dos próximos quatro anos. Não à toa, o pontapé inicial de Obama foi abrir as negociações para evitar o abismo fiscal - corte de despesas e aumento de impostos automáticos a partir de 2 de janeiro que, se vigorarem, jogarão os EUA em nova recessão.
Será o resultado desta tensa barganha - na qual Obama tem a responsabilidade de liderar a costura de um acordo de redução do déficit público no longo prazo — que dará a dimensão da dificuldade que ele terá para passar no Congresso o restante da agenda prioritária que delineou: reformas tributária e no sistema de imigração, independência energética (com incentivo a fontes limpas) e mudança climática.
- A vitória foi sólida, mas não arrasadora. O Partido Republicano ainda está atordoado, precisa de uma agenda positiva para as eleições legislativas de 2014, mas não está morto. Se Obama não se engajar para aproveitar esta maré como o grande conciliador, poderá ficar preso na armadilha republicana e falhar - diz o cientista político Robert Watson, da Lynn University.
O estrategista republicano John Weaver, que trabalhou nas campanhas de John McCain, em 2008, e de John Huntsman nas primárias deste ano, acredita que Obama tem mais cartas na mão para negociar com a oposição, porque a desoneração de impostos para os ricos, aprovados por George W. Bush, vai expirar sem um acordo sobre o déficit:
- Nenhum dos partidos quer ser visto como responsável por devolver o país à recessão. Ambos terão que ceder.
Os republicanos, que exerceram com sucesso uma política de obstrução da agenda do presidente nos últimos dois anos, estão começando a sentir o desgaste causado pela imagem de oposição intransigente, avalia Weaver:
- Os integrantes do Partido Republicano têm um trabalho profundo de autoanálise pela frente, e a última coisa de que precisam é cultivar essa imagem de obstrucionismo.
Neste caso, Obama depende também muito de si mesmo, diz o cientista político Allan Litchman, da American University. O presidente tem que se distanciar das pesquisas de opinião, assumir riscos e ser agressivo - tudo o que não fez no primeiro mandato. Isso inclui um engajamento direto com a população e a conquista de aliados como os moderados republicanos.
Sem peças de reposição
Thomas Mann, da Brookings Institution, acrescenta à lista o setor produtivo. As grandes empresas, temendo alta de impostos e regulações, se afastaram do presidente, mas não podem esperar mais quatro anos pela chance de emplacar um republicano na Casa Branca. Empresários poderiam funcionar como cabos eleitorais na busca de consensos econômicos.
No seu primeiro discurso na Casa Branca como presidente reeleito, Obama acenou com a construção de um pacto nacional. Avisou que chamará para negociação partidos, empresários, sindicalistas e líderes da sociedade civil.
Para Litchman, um fator essencial para a vitória de Obama foi a recuperação da economia em 2012 - embora ainda pouco robusta e exuberante. Mas estão em curso quedas do desemprego e do endividamento, altas do consumo e da confiança e recuperação do mercado imobiliário. Evitado o caos no primeiro trimestre, isso se refletirá em maior apoio popular ao presidente, o que aumentaria seu cacife político.
Isso será importante nas discussões posteriores, como a reforma do sistema de imigração. Weaver acredita que haverá votos suficientes para passá-la na Câmara e no Senado. A derrota no eleitorado de origem hispânica, no qual Mitt Romney obteve apenas 27% dos votos, será suficiente para mover uma parcela do partido:
- O presidente reafirmou o compromisso de fazer a reforma em 2013, e os republicanos têm que ajudar nisso para reverter o problema que enfrentam com os hispânicos. Não há escolha.
A cientista política Susan MacManus, da Universidade do Sul da Flórida, acredita que uma aceleração do processo de concessão de vistos de imigração tem mais chances de aprovação do que uma reforma ampla, que incluísse anistia aos ilegais, à qual os republicanos resistem. Na Flórida, a redução do apoio dos latinos aos republicanos pode ter como subproduto um impacto nas relações EUA-Cuba:
- Pode acontecer uma mudança se o presidente puser nova ênfase nas relações com a América Latina. Uma intensificação da parceria comercial começaria com a América do Sul, para só depois chegar a Cuba.
A política externa é considerada uma das poucas áreas nas quais o presidente pode fazer mais no segundo mandato do que no primeiro, porque depende menos do Congresso. Mas Obama enfrenta um desafio comum a antecessores: a dificuldade de encontrar “peças de reposição” à altura das originais. A secretária de Estado, Hillary Clinton, deixou claro que quer deixar o governo em janeiro, e os nomes mais cotados para substituí-la (o senador John Kerry e a embaixadora Susan Rice) não têm o mesmo prestígio internacional. Obama precisa estar forte nesta área, pois são ameaças ao brilho de seu governo a perda de controle nas situações de Irã e Síria e a estagnação do processo de construção democrática dos países da Primavera Árabe.
O destino da economia também será moldado no exterior. A Europa ainda enfrenta severa crise, e uma nova recessão vai desacelerar as máquinas das fábricas nos EUA. A perda de fôlego da China e seu lento avanço em reformas são outros fantasmas. Isso significa que Obama não poderá repetir o erro de não apoiar efetivamente os europeus - inclusive com recursos - e terá de pressionar o novo governo chinês.
Arrancando o segundo mandato numa eleição com tom de referendo sobre sua política econômica, nada mais natural que resida na economia um dos fatores que determinarão o sucesso ou o fracasso dos próximos quatro anos. Não à toa, o pontapé inicial de Obama foi abrir as negociações para evitar o abismo fiscal - corte de despesas e aumento de impostos automáticos a partir de 2 de janeiro que, se vigorarem, jogarão os EUA em nova recessão.
Será o resultado desta tensa barganha - na qual Obama tem a responsabilidade de liderar a costura de um acordo de redução do déficit público no longo prazo — que dará a dimensão da dificuldade que ele terá para passar no Congresso o restante da agenda prioritária que delineou: reformas tributária e no sistema de imigração, independência energética (com incentivo a fontes limpas) e mudança climática.
- A vitória foi sólida, mas não arrasadora. O Partido Republicano ainda está atordoado, precisa de uma agenda positiva para as eleições legislativas de 2014, mas não está morto. Se Obama não se engajar para aproveitar esta maré como o grande conciliador, poderá ficar preso na armadilha republicana e falhar - diz o cientista político Robert Watson, da Lynn University.
O estrategista republicano John Weaver, que trabalhou nas campanhas de John McCain, em 2008, e de John Huntsman nas primárias deste ano, acredita que Obama tem mais cartas na mão para negociar com a oposição, porque a desoneração de impostos para os ricos, aprovados por George W. Bush, vai expirar sem um acordo sobre o déficit:
- Nenhum dos partidos quer ser visto como responsável por devolver o país à recessão. Ambos terão que ceder.
Os republicanos, que exerceram com sucesso uma política de obstrução da agenda do presidente nos últimos dois anos, estão começando a sentir o desgaste causado pela imagem de oposição intransigente, avalia Weaver:
- Os integrantes do Partido Republicano têm um trabalho profundo de autoanálise pela frente, e a última coisa de que precisam é cultivar essa imagem de obstrucionismo.
Neste caso, Obama depende também muito de si mesmo, diz o cientista político Allan Litchman, da American University. O presidente tem que se distanciar das pesquisas de opinião, assumir riscos e ser agressivo - tudo o que não fez no primeiro mandato. Isso inclui um engajamento direto com a população e a conquista de aliados como os moderados republicanos.
Sem peças de reposição
Thomas Mann, da Brookings Institution, acrescenta à lista o setor produtivo. As grandes empresas, temendo alta de impostos e regulações, se afastaram do presidente, mas não podem esperar mais quatro anos pela chance de emplacar um republicano na Casa Branca. Empresários poderiam funcionar como cabos eleitorais na busca de consensos econômicos.
No seu primeiro discurso na Casa Branca como presidente reeleito, Obama acenou com a construção de um pacto nacional. Avisou que chamará para negociação partidos, empresários, sindicalistas e líderes da sociedade civil.
Para Litchman, um fator essencial para a vitória de Obama foi a recuperação da economia em 2012 - embora ainda pouco robusta e exuberante. Mas estão em curso quedas do desemprego e do endividamento, altas do consumo e da confiança e recuperação do mercado imobiliário. Evitado o caos no primeiro trimestre, isso se refletirá em maior apoio popular ao presidente, o que aumentaria seu cacife político.
Isso será importante nas discussões posteriores, como a reforma do sistema de imigração. Weaver acredita que haverá votos suficientes para passá-la na Câmara e no Senado. A derrota no eleitorado de origem hispânica, no qual Mitt Romney obteve apenas 27% dos votos, será suficiente para mover uma parcela do partido:
- O presidente reafirmou o compromisso de fazer a reforma em 2013, e os republicanos têm que ajudar nisso para reverter o problema que enfrentam com os hispânicos. Não há escolha.
A cientista política Susan MacManus, da Universidade do Sul da Flórida, acredita que uma aceleração do processo de concessão de vistos de imigração tem mais chances de aprovação do que uma reforma ampla, que incluísse anistia aos ilegais, à qual os republicanos resistem. Na Flórida, a redução do apoio dos latinos aos republicanos pode ter como subproduto um impacto nas relações EUA-Cuba:
- Pode acontecer uma mudança se o presidente puser nova ênfase nas relações com a América Latina. Uma intensificação da parceria comercial começaria com a América do Sul, para só depois chegar a Cuba.
A política externa é considerada uma das poucas áreas nas quais o presidente pode fazer mais no segundo mandato do que no primeiro, porque depende menos do Congresso. Mas Obama enfrenta um desafio comum a antecessores: a dificuldade de encontrar “peças de reposição” à altura das originais. A secretária de Estado, Hillary Clinton, deixou claro que quer deixar o governo em janeiro, e os nomes mais cotados para substituí-la (o senador John Kerry e a embaixadora Susan Rice) não têm o mesmo prestígio internacional. Obama precisa estar forte nesta área, pois são ameaças ao brilho de seu governo a perda de controle nas situações de Irã e Síria e a estagnação do processo de construção democrática dos países da Primavera Árabe.
O destino da economia também será moldado no exterior. A Europa ainda enfrenta severa crise, e uma nova recessão vai desacelerar as máquinas das fábricas nos EUA. A perda de fôlego da China e seu lento avanço em reformas são outros fantasmas. Isso significa que Obama não poderá repetir o erro de não apoiar efetivamente os europeus - inclusive com recursos - e terá de pressionar o novo governo chinês.
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Fonte: http://oglobo.globo.com/mundo/obama-tenta-fugir-da-maldicao-do-segundo-mandato-6695479#ixzz2BwzPBYUV
Fonte: http://oglobo.globo.com/mundo/obama-tenta-fugir-da-maldicao-do-segundo-mandato-6695479#ixzz2BwzPBYUV
Segundo mandato nos EUA: um mal que vem desde o século XVIII
De George Washington a Bush, reeleição costuma ser marcada por críticas e crises
GEORGE WASHINGTON: O primeiro presidente americano,
herói da independência e unanimidade ao fim do primeiro mandato, teve de
lidar com multidões enfurecidas cercando sua casa pela assinatura do
tratado de amizade e comércio com a antiga metrópole britânica em 1794,
dando início à maldição do segundo mandato. Os manifestantes preferiam
que os EUA tomassem o partido da França na disputa com os britânicos
FRANKLIN ROOSEVELT: O presidente que salvou os EUA da Grande Depressão com o New Deal em seu primeiro mandato, perdeu apoio dentro do próprio partido e não conseguiu avançar com sua agenda legislativa ao propor em 1937 uma reforma que lhe permitiria indicar membros adicionais para a Suprema Corte — e assim garantir o controle do órgão que derrubara uma série de medidas aprovadas nos seus primeiros anos de governo. Mesmo assim, conseguiu se eleger para um terceiro mandato, permitido na época
RICHARD NIXON: Seu primeiro mandato foi bom o suficiente para garantir sua reeleição com vitórias em 49 dos 50 estados — só perdeu em Massachusetts e no Distrito de Columbia. Seu segundo mandato, no entanto, nem sequer chegou ao fim: envolvido no escândalo de Watergate, renunciou ao cargo em 1974 para evitar ser deposto
RONALD REAGAN: O presidente que até hoje é um ícone republicano pelas políticas econômicas de diminuição da regulação, redução de impostos e incentivos a empreendedores adotada no início do seu governo, em 1981, viu seu legado manchado pelo escândalo Irã-Contras, o envolvimento da CIA no contrabando de armas para o país persa como forma de financiar a guerrilha que tentava derrubar o governo esquerdista da Nicarágua. O caso veio à tona em 1986, em meados do segundo mandato de Reagan
BILL CLINTON: No primeiro mandato, viu a economia do país crescer rapidamente e conseguiu aprovar a formação do Nafta, bloco de livre comércio com os vizinhos México e Canadá. Os feitos o ajudaram a ser o primeiro democrata a se reeleger desde Franklin Roosevelt. Mas, no segundo mandato, o escândalo sexual envolvendo a estagiária da Casa Branca Monica Lewinsky fez que ele fosse submetido a um processo de impeachment - do qual acabou escapando
GEORGE W. BUSH: Sua reação após os atentados do 11 de Setembro, com a guerra ao terror, ajudou a torná-lo, no primeiro mandato, um dos presidentes mais populares da História do país, com um patamar de aprovação na casa de 80%. Um cenário muito diferente ocorreu no fim de seu governo, após um segundo mandato em que os Estados Unidos mergulharam na maior crise econômica desde a Grande Depressão da década de 1930
FRANKLIN ROOSEVELT: O presidente que salvou os EUA da Grande Depressão com o New Deal em seu primeiro mandato, perdeu apoio dentro do próprio partido e não conseguiu avançar com sua agenda legislativa ao propor em 1937 uma reforma que lhe permitiria indicar membros adicionais para a Suprema Corte — e assim garantir o controle do órgão que derrubara uma série de medidas aprovadas nos seus primeiros anos de governo. Mesmo assim, conseguiu se eleger para um terceiro mandato, permitido na época
RICHARD NIXON: Seu primeiro mandato foi bom o suficiente para garantir sua reeleição com vitórias em 49 dos 50 estados — só perdeu em Massachusetts e no Distrito de Columbia. Seu segundo mandato, no entanto, nem sequer chegou ao fim: envolvido no escândalo de Watergate, renunciou ao cargo em 1974 para evitar ser deposto
RONALD REAGAN: O presidente que até hoje é um ícone republicano pelas políticas econômicas de diminuição da regulação, redução de impostos e incentivos a empreendedores adotada no início do seu governo, em 1981, viu seu legado manchado pelo escândalo Irã-Contras, o envolvimento da CIA no contrabando de armas para o país persa como forma de financiar a guerrilha que tentava derrubar o governo esquerdista da Nicarágua. O caso veio à tona em 1986, em meados do segundo mandato de Reagan
BILL CLINTON: No primeiro mandato, viu a economia do país crescer rapidamente e conseguiu aprovar a formação do Nafta, bloco de livre comércio com os vizinhos México e Canadá. Os feitos o ajudaram a ser o primeiro democrata a se reeleger desde Franklin Roosevelt. Mas, no segundo mandato, o escândalo sexual envolvendo a estagiária da Casa Branca Monica Lewinsky fez que ele fosse submetido a um processo de impeachment - do qual acabou escapando
GEORGE W. BUSH: Sua reação após os atentados do 11 de Setembro, com a guerra ao terror, ajudou a torná-lo, no primeiro mandato, um dos presidentes mais populares da História do país, com um patamar de aprovação na casa de 80%. Um cenário muito diferente ocorreu no fim de seu governo, após um segundo mandato em que os Estados Unidos mergulharam na maior crise econômica desde a Grande Depressão da década de 1930
Fonte: http://oglobo.globo.com/mundo/segundo-mandato-nos-eua-um-mal-que-vem-desde-seculo-xviii-6695635#ixzz2Bx09LZiT
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