Christopher Hitchens*
Esta semana o filme Collision estreia em diversas salas de cinema. Este é um filme que mostra os debates realizados no ano passado entre Douglas Wilson, um senhor da New St. Andrew's College, e seu humilde serviçal.
A crítica da Newsweek implora para que você não vá assistir ao filme, em grande parte porque ele mostra dois homens brancos de meia-idade tentando estabelecer quem é o macho dominante. Eu penso que este seria um motivo suficiente para comprar uma entrada, mas talvez ela tenha preferido o debate realizado em Londres na última semana, entre Stephen Fry e eu (dois magníficos espécimes do reino mamífero branco) versus uma deputada do Parlamento, que é uma católica Tory convertida, e o arcebispo da Igreja Católica Romana de Abuja, na Nigéria. Este debate encheu um dos principais auditórios da cidade. Por uma combinação de motivos, o assunto da religião está de volta ao local onde ele sempre deveria ter estado - bem no centro de qualquer argumento sobre o embate de visões de mundo.
Desde que convidei o defensor da fé para debater comigo, na primavera de 2007, fico impressionado pela vontade do outro lado de me fazer, assim como meus aliados, ficar decepcionado. Um conhecido erudito, como Richard Dawkins, que está bem acostumado com o fato de encher auditórios sempre que faz suas explicações sobre biologia, agora se encontra em plataformas com pessoas dedicadas que realmente, verdadeiramente não acreditam que a evolução seja nada mais do que uma "teoria". Estive em todo o Sul, em frente a multidões, em locais com capacidade esgotada, trocando visões com protestantes na maior parte do tempo, mas também com católicos e, em Nova York, na Costa Oeste e no Canadá, com judeus reformados em sinagogas grandes e bastante frequentadas (até agora não houve convites dos judeus ortodoxos, mórmons ou muçulmanos).
Até agora nunca entrei em um argumento que me fizesse querer mudar de ideia. Afinal, uma pessoa religiosa, por mais brilhante que seja ou por melhor que seja no debate, sente-se obrigada a ficar próxima a um "script" que é conhecido de antemão, e que eu também já conheço. No entanto, descobri que o chamado direito cristão é muito menos monolítico e muito mais educado e hospitaleiro do que eu pensava, ou mais do que a maioria dos liberais acredita. Ainda não fui convidado para ir à Universidade Bob Jones, mas já fui convidado para visitar o campus da Universidade Jerry Falwell's Old Liberty, na Virgínia, mesmo que ainda não tenhamos concordado em relação às condições.
Wilson não é um daqueles cristãos evasivos, que murmuram de forma a se desculparem sobre como algumas parábolas da Bíblia são apenas "metáforas". Ele deseja sustentar de forma incondicional que Jesus de Nazaré era o Cristo e que seu sacrifício redime nosso estado de pecado, o que, por sua vez, é o resultado de nossa rebelião contra Deus. Ele não enrola quando é questionado sobre porque Deus permite que tanto mal e tanto sofrimento existam - é claro que ele "permite" isso, já que tal é o estado inescapável dos pecadores rebeldes. Prefiro muito mais esta sinceridade ao sarcasmo ao estilo do Monty Python dos grupos interfé e ecumênicos, que mal respeitam suas próprias tradições e que vêem a fé apenas como outra palavra para organizar a comunidade (a propósito, quando será que o Presidente Barack Obama vai decidir que igreja ele frequenta?).
Geralmente, quando pergunto a um calvinista se ele é realmente um calvinista (no sentido, digamos, de acreditar que vou parar no inferno), há uma leve relutância em dizer "sim" e um leve constrangimento de sua congregação. Isso me força a concluir que isso tem algo a ver com a afamada e verdadeira hospitalidade sulina: não se pode facilmente convidar alguém para ir à sua igreja e então para um jantar e informar seu convidado que ele está destinado à perdição. Mais especificamente, todavia, logo se descobre que muitos daqueles que vão a esta congregação não têm tanta certeza sobre todas as doutrinas, da mesma forma que rapidamente percebe-se que um vasto número de católicos não acredita verdadeiramente em cerca de metade do que a sua igreja os instrui a pensar.
De tempos em tempos, leio relatórios de pesquisas que dizem que mais americanos acreditam no nascimento imaculado e no demônio do que no darwinismo: estou certo de que no mínimo alguns desses desejam confessar suas dúvidas a alguém que ligue para eles na surdina. Enquanto isso, em qualquer medida, o número daqueles que não professam aliança a igreja alguma (não estou chamando-os de ateus, apenas de céticos) forma a minoria que mais cresce nos Estados Unidos. E não venham me dizer que a guerra aumenta a fé e que não existem descrentes nas trincheiras: recentemente fui convidado para uma reunião muito animada de um grupo de livre pensadores na Academia da Força Aérea em Colorado Springs, no estado do Colorado, onde existe uma revolta contra o proselitismo no campus, realizado por instrutores literalistas bíblicos.
Graças à insensatez da facção do "design inteligente" - que vem tentando com insucesso vergonhoso contrabandear o ensino sobre o criacionismo em nossas escolas, sob um nome que é puramente estúpido e não inteligente - e graças à incessante pregação de ódio e violência contra nossa sociedade, realizada pelos fanáticos de uma outra fé, assim como outros comportamentos relacionados (tais como a tentativa irracional dos judeus messiânicos de roubar terras de outro povo), o movimento secular nos EUA está adquirindo uma confiança que não era vista em muitos anos. Muitos daqueles que colocam sua fé na revelação, na profecia e na oração estão sentindo que precisam fazer um relato sobre eles mesmos. Este é um desenvolvimento realmente bom, e é parte do pluralismo e do policentrismo que distinguem o tipo de sociedade que temos que defender contra todos os inimigos, estrangeiros e nacionais.
*Christopher Hitchens é jornalista, escritor e colunista de Vanity Fair e Slate Magazine. É autor do livro "Deus não é Grande: como a religião envenena tudo". Artigo distribuído pelo The New York Times Syndicate.
Nenhum comentário:
Postar um comentário