sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Lulismo?

Antonio Delfim Netto*


SURPREENDIDA COM a recuperação da economia brasileira e o imenso protagonismo de Lula no cenário internacional, cuja visibilidade interna é a aprovação de sua administração por três de cada quatro brasileiros, a oposição parece presa a um quadro de catalepsia.

Isso certamente não ajuda a continuidade do progresso institucional que conseguimos desde a Constituição de 1988 e que começa a nos distinguir claramente de alguns de nossos parceiros da América Latina. Estes insistem em repetir velhos erros do passado. Tentam curto-circuitos que a história mostrou levar a incêndios, mas não ao crescimento econômico sustentável.

A tragédia da discussão é que, em lugar de um programa que reforce as linhas corretas do governo Lula e leve à superação dos problemas que ele deixará, propõe-se retroagir ao caminho já percorrido. Não deixa de ser patético continuar a confundir um necessário Estado indutor forte com a fantasia de que o "mercado", por si mesmo, produz o "equilíbrio" mais conveniente para a sociedade.

É claramente possível criticar o "lulismo" por sua simpatia sindical, por seu aparelhamento e por muitos motivos. Mas qual governo não "aparelha" quando a administração pública não é profissionalizada e o número de "cargos de confiança" (sem vinculação à competência) é gigantesco?

O "aparelhamento" do Estado tem sido permanente e ligado não apenas a problemas geográficos, partidários ou ideológicos. Quem conhece Brasília sabe que se trata de um fenômeno "geológico". Cada presidente levou para lá e fixou (às vezes com duvidosos "concursos seletivos") um estrato de seus conterrâneos. Um corte do terreno mostra as "camadas" (os mineiros, os maranhenses, os alagoanos, os paulistas, os sindicalistas...) sobre as quais cada governo acrescentou a sua, respeitando cuidadosamente as anteriores...

É preciso reconhecer que a rápida recuperação se deve a pelo menos dois pontos que dependeram do próprio comportamento de Lula. Primeiro, com sua inteligência e perspicácia, rejeitou o terceiro mandato, que destruiria toda a obra institucional constituída em 1988; segundo, com sua intuição, assumiu o risco de minimizar a crise, afastando o "pânico", e reforçou as políticas públicas que deram sustentação ao consumo interno.

Isso não é pouca coisa, e é por isso que ele tem o apoio de 3/4 da população!

A eleição de 2010 não pode se fazer em torno das pobres alternativas de, ou voltar ao passado, ou dar continuidade a Lula. A discussão precisa incorporar os horizontes do século 21 e a superação dos problemas que certamente restarão do seu governo.

*Economista.Escreve às quartas-feiras na Folha - 11/11/2009

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