''Ele era um individualista radical, mas não era inocente''
Autor de uma biografia de Nietzsche que é referência, o alemão Rüdiger Safranski (foto), 65, ataca, na entrevista a seguir, a irmã do pensador, Elizabeth, por tê-lo associado ao nacional-socialismo.
Mas ele lembra que Nietzsche tem culpa no cartório, por haver defendido posições condenáveis - como a "eliminação de formas de vida inferiores".
Safranski também fala de sua obra recém-lançada no Brasil "Romantismo - Uma Questão Alemã", Estação Liberdade, que tem um capítulo dedicado ao autor de "Além do Bem e do Mal" e de "Humano, Demasiado Humano".
Eis a entrevista.
Por que Nietzsche é tão popular entre não especialistas?
Nietzsche de fato se tornou rapidamente um mito para o grande público. Mas por quê? Tudo se encaixa! [Ele era] um solitário que, de modo ousado, proclamou que "Deus está morto" e, como se fosse castigado por isso, enlouqueceu. Sua reputação com o público era de "o ateu louco".
Depois, ficou famoso com a teoria do "super-homem". Segundo ela, é possível o desenvolvimento superior do ser humano, que se torna real quando a pessoa usa bem suas próprias forças.
Além disso, sua linguagem e seu estilo seduziam pela beleza e caía bem colocar a arte acima da ciência: para ele, o homem criativo ocupa um posto mais alto do que o positivista aplicado.
Como o estilo explica a obra?
Alguns aforismos psicológicos eram muito eficazes e não era preciso estudar um sistema para entendê-lo - na verdade, não havia sistema nenhum. Eram "insights" que faziam efeito como: "Você fez iss", diz a memória,/ "Você não pode ter feito isso", diz o orgulho,/ Mais cedo ou mais tarde, a memória cede!". Esse aforismo traz toda a teoria freudiana do recalque.
Como vê sua apropriação pelo nazismo?
A irmã de Nietzsche, que viveu décadas a mais do que ele, fez de tudo para associá-lo à ideologia nacional-socialista. Porque Nietzsche era um espírito independente, liberal, um inimigo do antis semitismo e do nacionalismo.
Era um individualista radical. Sua filosofia da "vontade de poder" se referia sobretudo à formação da individualidade, de que a pessoa deveria ter poder sobre si mesma.
Agora, de fato, ele teve experiências com pensamentos sobre raças superiores e eliminação de formas de vida inferiores. E, nesse contexto, expressou opiniões que posteriormente foram instrumentalizadas pelos nazistas.
Portanto, Nietzsche não foi completamente inocente! Aí, então, é preciso confrontar Nietzsche com Nietzsche!
No capítulo em que trata de Nietzsche, o sr. usa formulações quase idênticas às de sua biografia do pensador...
Nietzsche pertence à história do romantismo. Não se pode simplesmente dizer essas coisas de um modo melhor do que já falei. Não vejo nenhum problema em "utilizar" a mim mesmo.
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A entrevista é de Marcos Flamínio Peres e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 28-06-2010.Fonte: IHU online, 28/06/2010
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