Juremir Machado da Silva*
Edgar Morin está com 91 anos de idade. Recentemente
andou hospitalizado. Problema de coração. Teve alta. Anda feliz no
amor, casado com uma jovem 30 anos mais moça do que ele. Vive entre a
França e o Marrocos, país da amada. Continua escrevendo e publicando
freneticamente. Para quem está saindo de férias e quer uma leitura de
praia deliciosa e divertida, uma sugestão: “Meus filósofos” (Sulina).
Nesse livro da “maturidade tardia”, Morin, com a liberdade de sempre,
lista e analisa os “filósofos” que mais o influenciaram, encantaram ou
impressionaram: Buda, Jesus, Montaigne, Descartes, Pascal, Spinoza,
Rousseau, Voltaire, Hegel, Karl Marx, Dostoievski, Marcel Proust,
Theodor Adorno, Martin Heidegger, Henri Bergson, Gaston Bachelard, Jean
Piaget, Karl Popper, Thomas Kuhn, Husserl, Ivan Illich e Beethoven.
Pulei alguns. Poucos.
Sim, Morin considera Buda e Cristo, os escritores Proust e
Dostoievski e o músico Beethoven como filósofos. Explica: “Beethoven faz
parte dos meus filósofos. Acredito que possa haver um grande pensamento
nas obras romanescas e, no caso de Beethoven, estou diante de um
pensamento sublime, fantástico, do qual não encontro equivalente”.
Pensar livremente sempre foi a marca de Morin, autor de um “Método”, em
seis volumes, quatro traduzidos por mim para o Brasil, sem receita nem
caminho de mão única para o conhecimento. “Meus filósofos” é uma obra de
quem, nonagenário, nada tem a perder e sente-se um ganhador: um
vitorioso na capacidade de sentir prazer. O velho Edgar parece dizer
todo o tempo: pensar dá tesão. Ler é mais eficaz do que viagra. A arte é
o afrodisíaco existencial por excelência. Filosofar é uma arte especial
que mescla conceitos, razão, intuição e até imaginação.
“Proust estendeu o reino do dizível à infinita complexidade de nossa
vida subjetiva, associando duas dimensões que parecem excluir-se
inteiramente, de um lado, a extrema precisão da palavra, de outro, a
tradução da inefável vida da alma e do sentimento”, diz Morin. A gente
para, coça o queixo, coloca os pés sobre a mesinha de centro e fica
dando tratos à bola. Depois, começa a ouvir Beethoven e deixa-se
transportar para outro nível da realidade. Pensar leva a múltiplos
orgasmos. Como pode alguém achar chato um grande filósofo? Chato é o
vazio de ideias. Como não concordar com Morin: “Para mim, o maior
pensador, o mais próximo (ao mesmo tempo que Heráclito), é Blaise
Pascal: quanta força, quanto completude no inacabamento de Pensamentos! Fonte radioativa, cada um dentre eles incita-me a meditações infinitas”.
Eternas.
Pensar exige esforço, concentração e abertura para o devaneio. A
filosofia não é autoajuda. Se permite compreender melhor a vida, o belo e
os mistérios do homem, não fornece respostas prontas. Se eu não
estivesse tão ocupado, iria para a praia, qualquer praia, ler “Meus
filósofos” à beira do mar. Imagino um diálogo assim:
– Olha só aquela gata…
– Hummm…
– Gostosa demais…
– Hummm…
– Melhor não existe…
– Quem? Pascal?
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* Sociólogo. Prof. Universitário. Escritor. Tradutor. Jornalista.
Fonte: Correio do Povo on line, 16/01/2013
Imagem da Internet: Edgar Morin.
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