quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Edgar Morin, filosofia para ler na praia

Juremir Machado da Silva*

 

Edgar Morin está com 91 anos de idade. Recentemente andou hospitalizado. Problema de coração. Teve alta. Anda feliz no amor, casado com uma jovem 30 anos mais moça do que ele. Vive entre a França e o Marrocos, país da amada. Continua escrevendo e publicando freneticamente. Para quem está saindo de férias e quer uma leitura de praia deliciosa e divertida, uma sugestão: “Meus filósofos” (Sulina). Nesse livro da “maturidade tardia”, Morin, com a liberdade de sempre, lista e analisa os “filósofos” que mais o influenciaram, encantaram ou impressionaram: Buda, Jesus, Montaigne, Descartes, Pascal, Spinoza, Rousseau, Voltaire, Hegel, Karl Marx, Dostoievski, Marcel Proust, Theodor Adorno, Martin Heidegger, Henri Bergson, Gaston Bachelard, Jean Piaget, Karl Popper, Thomas Kuhn, Husserl, Ivan Illich e Beethoven.

Pulei alguns. Poucos.

Sim, Morin considera Buda e Cristo, os escritores Proust e Dostoievski e o músico Beethoven como filósofos. Explica: “Beethoven faz parte dos meus filósofos. Acredito que possa haver um grande pensamento nas obras romanescas e, no caso de Beethoven, estou diante de um pensamento sublime, fantástico, do qual não encontro equivalente”. Pensar livremente sempre foi a marca de Morin, autor de um “Método”, em seis volumes, quatro traduzidos por mim para o Brasil, sem receita nem caminho de mão única para o conhecimento. “Meus filósofos” é uma obra de quem, nonagenário, nada tem a perder e sente-se um ganhador: um vitorioso na capacidade de sentir prazer. O velho Edgar parece dizer todo o tempo: pensar dá tesão. Ler é mais eficaz do que viagra. A arte é o afrodisíaco existencial por excelência. Filosofar é uma arte especial que mescla conceitos, razão, intuição e até imaginação.

“Proust estendeu o reino do dizível à infinita complexidade de nossa vida subjetiva, associando duas dimensões que parecem excluir-se inteiramente, de um lado, a extrema precisão da palavra, de outro, a tradução da inefável vida da alma e do sentimento”, diz Morin. A gente para, coça o queixo, coloca os pés sobre a mesinha de centro e fica dando tratos à bola. Depois, começa a ouvir Beethoven e deixa-se transportar para outro nível da realidade. Pensar leva a múltiplos orgasmos. Como pode alguém achar chato um grande filósofo? Chato é o vazio de ideias. Como não concordar com Morin: “Para mim, o maior pensador, o mais próximo (ao mesmo tempo que Heráclito), é Blaise Pascal: quanta força, quanto completude no inacabamento de Pensamentos! Fonte radioativa, cada um dentre eles incita-me a meditações infinitas”.

Eternas.

Pensar exige esforço, concentração e abertura para o devaneio. A filosofia não é autoajuda. Se permite compreender melhor a vida, o belo e os mistérios do homem, não fornece respostas prontas. Se eu não estivesse tão ocupado, iria para a praia, qualquer praia, ler “Meus filósofos” à beira do mar. Imagino um diálogo assim:

– Olha só aquela gata…
– Hummm…
– Gostosa demais…
– Hummm…
– Melhor não existe…
– Quem? Pascal?
---------------
* Sociólogo. Prof. Universitário. Escritor. Tradutor. Jornalista.
Fonte: Correio do Povo on line, 16/01/2013
Imagem da Internet: Edgar Morin.

Nenhum comentário:

Postar um comentário