segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Nós que temos filhos

 Martha Medeiros*

 Nós que temos filhos Félix Zucco/Agencia RBS

“Quem não tem filhos sofre. 

Quem tem se arrebenta. 

Não é algo que se explique. 

Nenhum racionalismo conforta”

Por uma infelicidade tremenda, fui ler os comentários de um site sobre o acontecido em Santa Maria e dei com uma criatura funesta que falou coisas impublicáveis. Um só. Um único demente entre tantos solidários, e pensei: precisa mais que um para lamentarmos a falta de compaixão? Porque essa foi a palavra que me invadiu desde as primeiras horas de um domingo ensolarado lá fora e nublado aqui dentro: compaixão. 

Qualquer pessoa que tenha um filho ou uma filha não tem como não se colocar no lugar dos pais, dos avós, dos tios daquela garotada que saiu no sábado à noite para se divertir e que foi vítima do destino — poderíamos também chamar de descaso, insensatez, irresponsabilidade —, mas é cedo para diagnósticos precisos. Destino é uma palavra mais abrangente. 

 "A tragédia mostrou como somos
 todos vulneráveis diante da 
fragilidade da vida"

Tenho duas filhas que comumente saem à noite, dançam, se divertem em lugares fechados, e eu não faço vistorias prévias, não peço laudos, não investigo, simplesmente confio que elas estarão em segurança. Quem pode garantir? Alguém deveria, mas o destino não se responsabiliza. Nunca se responsabilizou.

Sei de dois irmãos e de um casal de namorados que tinham relações com amigos meus e que estão entre as vítimas. De íntimo, eu não conhecia ninguém. Isso me afasta da tragédia? Nada nos afasta dessa tragédia, a não ser que não tenhamos compaixão. Essa palavra não me sai da cabeça. Um mundo individualista como o nosso precisa abraçar esse conceito, esse sentimento: compaixão. Se colocar no lugar do outro. Dói, mas é necessário.

Quem não tem filhos sofre. Quem tem se arrebenta. Não é algo que se explique. Nenhum racionalismo conforta. É um soco que nos tira o ar e nos faz lembrar o que tanto buscamos esquecer: que somos todos vulneráveis diante da fragilidade da vida.
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* Escritora. Cronista da ZH
Fonte: ZH on line, 28/01/2013
Foto: Félix Zucco / Agencia RBS

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