Martha Medeiros*
“Quem não tem filhos sofre.
Quem tem se arrebenta.
Não é algo que se explique.
Nenhum racionalismo conforta”
Por uma infelicidade tremenda, fui ler os comentários de um site
sobre o acontecido em Santa Maria e dei com uma criatura funesta que
falou coisas impublicáveis. Um só. Um único demente entre tantos
solidários, e pensei: precisa mais que um para lamentarmos a falta de
compaixão? Porque essa foi a palavra que me invadiu desde as primeiras
horas de um domingo ensolarado lá fora e nublado aqui dentro: compaixão.
Qualquer pessoa que tenha um filho ou uma filha não tem como não se
colocar no lugar dos pais, dos avós, dos tios daquela garotada que saiu
no sábado à noite para se divertir e que foi vítima do destino —
poderíamos também chamar de descaso, insensatez, irresponsabilidade —,
mas é cedo para diagnósticos precisos. Destino é uma palavra mais
abrangente.
"A tragédia mostrou como somos
todos vulneráveis diante da
fragilidade da vida"
Tenho duas filhas que comumente saem à noite, dançam, se divertem em
lugares fechados, e eu não faço vistorias prévias, não peço laudos, não
investigo, simplesmente confio que elas estarão em segurança. Quem pode
garantir? Alguém deveria, mas o destino não se responsabiliza. Nunca se
responsabilizou.
Sei de dois irmãos e de um casal de namorados que tinham relações com
amigos meus e que estão entre as vítimas. De íntimo, eu não conhecia
ninguém. Isso me afasta da tragédia? Nada nos afasta dessa tragédia, a
não ser que não tenhamos compaixão. Essa palavra não me sai da cabeça.
Um mundo individualista como o nosso precisa abraçar esse conceito, esse
sentimento: compaixão. Se colocar no lugar do outro. Dói, mas é
necessário.
Quem não tem filhos sofre. Quem tem se arrebenta. Não é algo que se
explique. Nenhum racionalismo conforta. É um soco que nos tira o ar e
nos faz lembrar o que tanto buscamos esquecer: que somos todos
vulneráveis diante da fragilidade da vida.
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* Escritora. Cronista da ZH
Fonte: ZH on line, 28/01/2013
Foto:
Félix Zucco / Agencia RBS
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