quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Escritor argentino fala sobre memória, futebol e literatura

Autor de “O Segredo dos Seus Olhos”, Eduardo Sacheri autografa hoje na Feira do Livro
Crédito: Arthur Puls

A história do oficial de Justiça aposentado é o argumento de “O Segredo dos Seus Olhos”, livro de Eduardo Sacheri que virou filme de Juan José Campanella. O autor de “La Pregunta de Sus Ojos” (2005), que virou “Segredo” na tradução em português, está na 57ª Feira do Livro de Porto Alegre nesta quinta-feira para conversar com o público e autografar a obra, lançada pela Objetiva.
Em entrevista ao Correio do Povo, o autor falou do salto que foi na carreira o sucesso de “O Segredo dos Seus Olhos”, traduzido para 40 países, e também sobre o novo livro, que tem como tema futebol, uma de suas especialidades (ele é “hincha”, torcedor do Independiente). E sobre Inter e Grêmio, é claro.

Livro
Na obra, Benjamin Chaparro resolve escrever um livro que retoma um assassinato brutal, 30 anos depois, e um amor secreto por uma colega. O filme faturou uma estatueta no Oscar 2010 e tem no elenco Ricardo Darín e Soledad Villami.
Ontem, o autor, que é historiador de formação, passeou pelos corredores da Feira e viu na Calle Corrientes, da Área Internacional, alguns de seus outros livros (ele já lançou sete, sendo quatro de contos e três romances) ainda sem tradução ao português. Entre eles, estão “Te Conozco Mendizábel y Otros Cuentos (2001), “Un Viejo que se Pone de Pie y Otros Cuentos (2007) e o mais recente “Papeles en el Viento” (2011), lançado pela Alfaguara.
Com o proprietário da livraria, Miguel Angel Gómez, Sacheri falou sobre a situação do mercado livreiro aqui e na Argentina. Também conversou com alguns leitores sobre os livros.

Correio do Povo – O que “O Segredo dos Seus Olhos” representa na sua carreira literária
Eduardo Sacheri –
Um salto enorme. Antes de “La Pregunta de Sus Ojos” eu era conhecido somente na Argentina, sobretudo pelo público não tão literário, por aqueles mais ligados ao futebol. Com este livro, que já foi traduzido para 40 países, consegui equilibrar, me assentar entre os leitores mais tradicionais na Argentina e fora dela.

Correio do Povo – O que há de tão especial na história que cativa tanto os leitores e os espectadores no cinema?
Eduardo Sacheri – O núcleo da história tem a ver com a memória e com as armadilhas da memória, com o ocultamento, o subterrâneo da memória. O protagonista escreve um livro tratando de enfrentar de maneira digna isso tudo. Creio que o personagem principal, Benjamin Chaparro, é o único que termina se transformando. O assassino, o viúvo da vítima terminam iguais. Ele não. Começa derrotado, cansado, confuso e termina decidido a seguir em frente.

Correio do Povo – O futebol sempre está presente nas suas histórias. Por quê?
Eduardo Sacheri – A matéria principal das minhas histórias é a vida cotidiana, os personagens simples, normais como qualquer pessoa. Neste horizonte, o futebol tem um componente importante pela paixão, como também os laços familiares, amores, relações em geral. O futebol é um tema que os argentinos gostam de ler, assim como acho que aqui no Brasil.

Correio do Povo – Você é torcedor do Independiente. No livro e filme, uma cena crucial se passa em meio à torcida do principal rival do Independiente, o Racing, no estádio Juan Domingo Perón. Isto não o contrariou internamente?
Eduardo Sacheri – Há um detalhe do livro que começamos a planejar com o Racing. Eu gosto de futebol e não acredito nesta cultura de meu time é diferente, é melhor e vocês não são tão apaixonados. Este contexto é igual na torcida do Independiente, do Racing, do Boca Juniors, do Inter e do Grêmio. É a paixão, é o sentimento do torcedor, é igual em qualquer parte do mundo.

Correio do Povo – Na Argentina, quem é mais conhecido atualmente, Inter ou Grêmio?
Eduardo Sacheri – Me parece que nos últimos anos pelos dois títulos da Libertadores que temos mais notícias do Inter, também porque o clube tem mais jogadores argentinos como D´Alessandro, Guiñazu, Bolatti. Mas o Grêmio foi bem mais conhecido nos anos 80 e 90. A minha melhor recordação do Tricolor não é boa para a torcida gaúcha. É de julho de 1984, quando ganhamos do Grêmio por 1 a 0 aqui em Porto Alegre e seguramos o 0 a 0 em Avellaneda, sendo campeões da Libertadores.

Correio do Povo – Fale-nos um pouco do seu novo livro, “Papeles en el Viento”?
Eduardo Sacheri – O livro foi lançado há uns dois meses na Argentina. É uma história de amizade e de como a morte pode sacudir uma amizade. Alejandro “El Mono” morre e seu irmão e amigos sentem a dor desta morte e projetam o futuro da filha de Mono, Guadalupe, mas ele morreu com dívidas, pois comprou um jogador de futebol, uma promessa, que acaba não dando certo. Tentei converter-me em um espectador da amizade entre eles. É um livro sobre homens, suas idiossincrasias, torpezas. Sobre as covardias dos homens para entrar nos grandes temas. No uso do humor para se esquivar de assuntos profundos ou dos pudores para fugir destes temas.

Correio do Povo – Quais as suas preferências literárias e culturais do Brasil?
Eduardo Sacheri –
Estou começando a descobrir agora a riqueza dos textos de Clarice Lispector. Meu vínculo maior com o Brasil é pela música, rica em poesia, de gente como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gal Costa e Toquinho. A música “Aquarela”, de Toquinho, na versão dele em espanhol, eu usava como canção de ninar a minha filha.
-----------------------------------------
Fonte: Luiz Gonzaga Lopes / Correio do Povo on line, 03/11/2011

Nenhum comentário:

Postar um comentário