sábado, 16 de janeiro de 2010

Nossos políticos fardados

Leonardo Cavalcanti


Sempre causa-me estranheza a imagem do ministro da Defesa, Nelson Jobim, vestido com roupas militares. Por mais que ele tente parecer natural, com cara de combatente, fico com a impressão do esforço despendido para usar a indumentária sem parecer artificial. A mais recente fotografia do nosso comandante foi feita durante visita a um hospital de campanha em Porto Príncipe, capital do Haiti. Lá estava Jobim com uniforme camuflado e quepe do Exército — o político também já foi visto, em território nacional, dentro de trincheiras e ao lado de animais selvagens, como sucuris e onças.

Não quero aqui dizer que falta a Jobim autoridade para o cargo de ministro da Defesa. Ao contrário. Acredito ser legítimo um civil comandar uma pasta militar. Acho até que tal fato nos torna melhores em relação aos nossos vizinhos. Mostramos que somos um país preparado para a paz, que usa as Forças Armadas para missões pacíficas, como no próprio Haiti. No rádio, ouvi a declaração do pai de um soldado morto no terremoto haitiano. Emocionado, eles dizia-se orgulhoso do filho: “Ele (o soldado) morreu em uma missão de paz. Para sempre será um herói”, disse o homem, um militar reformado.

A tragédia do Haiti mostrou como a sociedade acredita na solidariedade. E se emociona com quem estava lá antes mesmo do terremoto, a lutar em um país miserável. Boa parte dos brasileiros que lá estavam eram militares, comandados a distância pelo civil Nelson Jobim. O ministro, portanto, tem legitimidade para comandar uma tropa militar. A questão é que, se, para isso, precisa usar farda verde-oliva.

Talvez o ministro tenha o argumento de que precise se disfarçar por uma questão de segurança. Seria um alvo fácil no meio da guerra se estivesse vestido de civil combatendo ao lado de tropas camufladas? Não é o caso, pois. Imagine um ministro da Saúde usando jaleco e estetoscópio sem ter o diploma de médico — ou um da Educação que, mesmo sem nunca ter escrito em quadros-negros, aparecer de uma hora para outra nas entrevistas coletivas com um giz na mão a falar com repórteres. Seria estranho como o Jobim de farda.

Fonte: Correio Braziliense online, 16/01/2010

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