Martha Medeiros*
Acabei de ouvi-la palestrar a respeito de como é
o envolvimento de uma mãe com um ser que necessita de tanta atenção. Eu estava
preparada para ouvir um chororô, e não a acusaria, ela teria todo o direito se.
Mas o “se” não veio. O que vi foi uma mulher comovente e leve ao mesmo tempo,
recorrendo ao humor para segurar a onda e para não se desconectar de si mesma.
Ela deu uma choradinha, sim, mas de pura emoção e gratidão por passar por essa experiência que dá a
ela e a esse filho uma cumplicidade também fora do comum. Quando ela terminou
de falar,
pensei: “Essa é da minha turma”. E silenciosamente a inseri no rol dos meus
afetos verdadeiros.
Estranhei ter sido essa a expressão que me
ocorreu, “minha turma”, e só então percebi que, durante a vida, a gente conhece
um mundaréu de pessoas, estabelece variadas trocas de impressões, passeia por
outras tribos e tal. São homens e mulheres que chegam bem perto do nosso
epicentro, nem sempre por escolha, mas porque são parentes de alguém,
conhecidos de não sei quem, e que acabam sendo agregados à nossa agenda do
celular. Até que o tempo vai mostrando uma dis- simulação aqui, uma maldade
ali, uma energia pesada, e você se dá conta de que alguns não são da sua turma.
Da série “Coisas que a gente aprende com o
passar dos anos”: abra-se para o novo, mas na hora da intimidade, do papo reto,
da confiança, procure sua turma. É fácil reconhecer os integrantes dessa
comunidade: são aqueles que falam a sua língua, enxergam o que você vê,
entendem o que você nem verbalizou. São aqueles que acham graça das mesmas
coisas, que saltam juntos para a transcendência, que possuem o mesmo
repertório. São aqueles que não necessitam de legendas, que estão na mesma
sintonia, e cujo histórico bate com o seu. Sua turma é
sua ressonância, sua
clonagem, é você acrescida e valorizada. Sua turma não exige nota de rodapé nem
resposta na última página. Sua turma equaliza, não é fator de desgaste. Com ela
você dança no mesmo compasso, desliza, cresce, se expande. Sua turma é sua
outra família, aquela, escolhida.
Não tenho mais paciência com o que me exige
atuação, com quem me obriga a usar palavras em excesso para ser compreendida.
Não tenho mais energia para o rapapé, para o rococó, para o servilismo cortês,
para o mise-en-scène social. Não tenho motivo para ser quem não sou, para adaptações
de última hora, para adequações tiradas da manga. Não quero mais frequentar
estranhos, em cujas piadas não vejo a mínima graça. Não quero mais ser
apresentada, muito prazer, e daí por diante ter que dissecar minha árvore
genealógica, me explicar em nome dos meus tatara- vôs, defender posições que me
farão passar por boa moça. Não quero mais ser uma convidada surpresa.
Se você mandar eu procurar minha turma,
acredite, tomarei como carinho.
*Escritora. Colunusta da ZH. - Fonte: ZH on line, 06/01/2012
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