Marcelo Gleiser*
Imagine que outras porções do espaço, vizinhas da nossa, também sejam universos, como ilhas
Talvez alguns dos leitores se lembrem do best-seller de Immanuel
Velikovsky, "Mundos em Colisão", publicado em 1950. Nele, Velikovsky
tenta demonstrar a veracidade de várias catástrofes registradas nos
mitos de culturas antigas usando supostos eventos astrofísicos.
Velikovsky imaginou que Vênus foi ejetada de Júpiter como um cometa no
século 15 a.C., tal como, na mitologia grega, Atena é ejetada da cabeça
de Zeus. A passagem do "cometa Vênus" perto da Terra em diversas
ocasiões teria gerado uma série de catástrofes.
As ideias de Velikovsky foram sumariamente refutadas pela comunidade
astronômica. Mas seu catastrofismo continua a tradição de várias
religiões, como mostro no livro "O Fim da Terra e do Céu".
Embora dramáticos, os eventos imaginados por Velikovsky não se comparam
ao que a cosmologia moderna anda propondo. Não falo dos efeitos da
aproximação de cometas, mas de colisões de universos inteiros, inclusive
o nosso. Bem-vindos ao catastrofismo cósmico.
O Universo surgiu 13,7 bilhões de anos atrás e vem se expandindo desde
então. Porém, observações atuais indicam que essa expansão não foi
sempre regular. Logo no início, o Cosmo aparentemente passou por um
período de expansão acelerada, chamado de inflação.
Segundo essa teoria, o Universo inteiro teria se originado de uma
pequena porção de espaço que foi estirada como uma tira de borracha por
um fator de cem trilhões de trilhões em uma fração de segundo.
Nosso Universo cabe nessa região inflada, como uma ilha no oceano.
Imagine que outras porções de espaço, vizinhas da nossa, tenham também
sido estiradas, mas de maneiras diferentes. Teríamos, então, uma espécie
de oceano repleto de universos-ilhas, cada qual com a sua origem, tipos
de matéria etc. -é o chamado Multiverso.
Como a física é uma ciência empírica, qualquer hipótese precisa ser
testada. Isso é tanto verdade para uma bola que rola ladeira abaixo
quanto para o Universo todo.
No caso da bola, basta descrever como a gravidade e a fricção do solo
agem sobre ela; no caso da inflação, ela prevê que nosso Universo seja
geometricamente plano e repleto de radiação com a mesma temperatura em
todas as direções -ambas previsões confirmadas.
Se não podemos receber informação de fora do nosso Universo (ou além do
"horizonte", a esfera que delimita o quanto a luz pôde viajar em 13,7
bilhões de anos de expansão), como provar a existência de outros
universos?
Tal como bolhas de sabão, que vibram quando colidem sem se destruir, se
outro universo colidiu com o nosso no passado distante, a radiação
dentro do nosso Universo teria vibrado devido às perturbações criadas
pela colisão.
Essas perturbações estariam registradas na radiação que permeia o Cosmos
e podem, em princípio, ser observadas: seriam anéis concêntricos onde a
radiação teria temperatura um pouco mais alta ou baixa. A notícia ruim é
que a probabilidade de colisão com outro universo aumenta com o tempo:
podemos desaparecer a qualquer instante!
A boa é que os anéis ainda não foram encontrados. Mas sua possível existência demonstra a diferença entre ciência e especulação.
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