Naercio Menezes Filho*
"Um estudo recente tentou separar os efeitos da renda sobre
diferentes aspectos da felicidade. A partir de pesquisas com 450 mil
residentes nos EUA que medem o número de momentos felizes no dia
anterior à entrevista e também a sua satisfação com a vida, os
pesquisadores detectaram vários resultados interessantes", escreve Naercio Menezes Filho, professor titular - Cátedra IFB e coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, professor associado da FEA-USP, em artigo publicado no jornal Valor, 15-03-2013.
Segundo o economista, "pessoas com renda mais baixa são mais
infelizes em todos os sentidos, tanto em termos de situações de
estresse, preocupação e infelicidade no dia a dia, como em termos de
satisfação com a vida. Entretanto, aumentos proporcionais de renda
familiar a partir de US$ 75 mil anuais aumentam a satisfação com a
vida, mas não alteram os momentos felizes (ou bem-estar emocional) dos
cidadãos americanos".
Eis o artigo.
A felicidade
está ganhando cada vez mais importância nos debates sobre medidas de
bem-estar pelo mundo. Afinal, será que o bem-estar da população de um
país deve ser medido somente pela sua produção anual de bens e serviços
(PIB) ou devemos levar em conta outros fatores? Quando começamos a
pensar sobre essa questão, algumas perguntas surgem naturalmente. Como
medir bem-estar? Qual a relação entre dinheiro e felicidade? Como se
comporta a felicidade ao longo da vida? Divórcios e separações aliviam o
estresse? Economistas e outros cientistas sociais vêm se debruçando com
bastante frequência sobre essas questões. O que mostram as pesquisas
recentes?
A questão que surge logo de início é como (e se) podemos medir
felicidade. Grande parte dos estudos sobre felicidade usa medidas
subjetivas (autodeclaradas) de bem-estar para mensurar a felicidade de
uma pessoa. Mas, será que podemos comparar a felicidade de pessoas
diferentes? Há evidências cada vez mais seguras de que há muita
informação relevante nas medidas subjetivas de felicidade. Por exemplo,
pessoas que se dizem mais felizes tendem a cometer menos suicídios, são
consideradas mais felizes pelos seus pares e tem menos reações físicas
(mensuráveis) a situações de estresse. Assim, podemos usar medidas
subjetivas de bem-estar para analisar os determinantes da felicidade.
Um primeiro ponto importante é que existem diferentes conceitos de felicidade.
Pesquisadores tem buscado diferenciar pelo menos dois aspectos. Um
deles é a alegria com que uma pessoa vive no seu dia a dia, ou seja, os
seus "momentos felizes", em contraposição aos momentos de estresse,
raiva e tristeza. Outro conceito de felicidade é o de "satisfação com a
vida", que reflete mais a avaliação da pessoa com relação à sua vida
como um todo, com o que ela conseguiu atingir até aquele momento. Mas,
afinal, o dinheiro compra que tipo de felicidade?
Um estudo recente tentou separar os efeitos da renda sobre diferentes
aspectos da felicidade. A partir de pesquisas com 450 mil residentes
nos EUA que medem o número de momentos felizes no dia anterior à
entrevista e também a sua satisfação com a vida, os pesquisadores
detectaram vários resultados interessantes. Em particular, pessoas com
renda mais baixa são mais infelizes em todos os sentidos, tanto em
termos de situações de estresse, preocupação e infelicidade no dia a
dia, como em termos de satisfação com a vida. Entretanto, aumentos
proporcionais de renda familiar a partir de US$ 75 mil anuais aumentam a
satisfação com a vida, mas não alteram os momentos felizes (ou
bem-estar emocional) dos cidadãos americanos.
Qual a explicação para esse resultado? Pode ser que acréscimos de
renda acima de determinado nível não aumentem a probabilidade das
pessoas desfrutarem dos momentos que trazem mais prazer, como estar com
os amigos e desfrutar do lazer. Pode ser também que os aumentos de
renda, apesar de provocarem o aumento de satisfação pessoal associada ao
status, tragam consigo situações de estresse e incapacidade de saborear
os pequenos prazeres da vida. Desse modo, é importante separar o que as
pessoas pensam a respeito de sua própria vida do quanto elas realmente
aproveitam os momentos felizes.
E com relação aos outros determinantes da felicidade? Um resultado
que sempre emerge dos estudos sobre felicidade é a relação em formato de
U entre idade e felicidade. Ou seja, a felicidade tende a diminuir à
medida que ficamos mais velhos, até alcançarmos os 50 anos de idade e
depois aumenta novamente. Estudos recentes usando o consumo de
antidepressivos (em vez de medidas subjetivas de felicidade) confirmaram
essa relação não linear entre idade e felicidade. Por exemplo, os dados
mostram que 1 em cada 13 europeus usaram antidepressivos em 2010 (com
destaque para os portugueses) e que as pessoas na meia-idade tem uma
probabilidade duas vezes maior de tomarem esses remédios do que as com
26 ou 65 anos de idade com as mesmas características. O mais
impressionante é que estudos recentes com chimpanzés também detectaram
um padrão muito parecido de bem-estar ao logo da vida. Mas, ainda não
está claro para os pesquisadores porque humanos e chimpanzés sofrem a
crise de meia idade.
Outra questão importante é a relação entre estado civil e felicidade.
As pesquisas mostram claramente que as pessoas casadas têm mais
momentos felizes e são mais satisfeitas com a vida do que as solteiras,
viúvas e divorciadas (mas, a presença de filhos em casa tende a aumentar
os momentos de estresse e preocupação). Mas, será que vale a pena
manter um casamento infeliz? Claro que não. Estudos que seguem as mesmas
pessoas ao longo do tempo mostram que a dissolução do casamento, apesar
de traumática no período de transição, reduz significativamente os
níveis de estresse dois anos após a separação, com relação à situação
inicial (que era pior que a média). Além disso, há evidências de que os
filhos não sofrem muito com a separação dos pais.
Por fim, os fumantes e as pessoas que vivem sozinhas são as que têm
menos momentos felizes, sofrem mais estresse e estão menos satisfeitas
com a vida, mesmo após controlarmos por várias outras características
socioeconômicas. Em suma, se a pessoa tem 50 anos de idade, mora
sozinha, fuma, e tem uma renda familiar baixa, a probabilidade de que
ela tenha uma vida feliz é bastante baixa. Mas, a boa notícia é que as
coisas melhoram um pouco aos 60 anos.
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*Economista, professor titular - Cátedra IFB e coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, professor associado da FEA-USP.
Fonte: IHU on line, 16/03/2013
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