sábado, 17 de agosto de 2013

Sobre espiritualidade e desenvolvimento sustentável


Fundação Findhorn, a ecovila mais famosa do mundo
 "O jogo, como a vida, tem muitas experiências diferentes. 
Há ideias e recuos, os milagres e 
as noites escuras da alma, 
e as oportunidades de servir 
(a si mesmo e aos outros)."
Não foi muito planejada a primeira visita da canadense Judy McAllister à Fundação Findhor, a ecovila mais famosas do mundo, localizada ao norte da Escócia. Ela havia lido sobre o local em algum dos livros sobre plantas que um professor havia lhe dado. Anos depois, em viagem pela Europa com o marido, voltou a ler por acaso sobre o assunto. Foi quando decidiu que, antes de voltar para o Canadá, visitaria aquela comunidade. “Mas quando entrei ali, percebi que estava em casa”, conta a escritora que, passados 35 anos, ainda se encontra na fundação da qual se tornou coordenadora.

Findhorn foi criada em 1962 e logo se tornou famosa por seus jardins maravilhosos e sua abordagem espiritual. Isso é tão forte dentro da fundação, que mesmo o pilar ambiental do famoso tripé da sustentabilidade – que leva em conta o equilíbrio entre aspectos ambientais, sociais e econômicos de uma iniciativa bem sucedida – é sobreposto pelo espiritual. “A espiritualidade tem sido a linha de fundo em Findhorn desde o seu início. Ela inclui o trabalho em harmonia com a natureza”, diz Judy. “Respeitar o meio ambiente é intrínseco à forma como buscamos incorporar o tipo de espiritualidade que estamos explorando. Aprendemos a colocar os valores e a ética dos princípios espirituais na prática de todos os tipos de atividades”, completa.

Dentro desse ambiente de vivências únicas, muitas atividades foram criadas para desenvolver o bom relacionamento com a comunidade e o meio ambiente. Um deles é o Jogo Global, uma versão extendida do Jogo da Transformação, que, a grosso modo, busca representar formas de como as pessoas lidam com a vida em todos os seus aspectos. Em setembro, ele será realizado pela primeira vez no Brasil, em uma iniciativa inédita promovida por Olga Balian, da Taygeta Consultores (os interessados em participar devem se inscrever no site http://jogoplanetario.com.br/). Judy estará presente e nesta entrevista para o Mercado Ético, ela conta um pouco mais sobre o game, além da sua visão de como o lado espiritual está diretamente ligado ao desenvolvimento sustentável.

Confira abaixo.

Mercado Ético - Recentemente, a Fundação Findhorn, completou 50 anos de existência e faz 35 que você vive na comunidade. O que aprendeu ao longo deste tempo?
Judy McAllister – Eu poderia encher um livro falando sobre isso. Nós aprendemos muito sobre todos os tipos de coisas. Como equilibrar a vida espiritual com a vida cotidiana, como viver de forma cooperativa (na maioria das vezes) em um grupo diversificado de nacionalidades e idades, como construir uma comunidade, como viver mais harmoniosamente com o planeta. Descobrimos que o riso compartilhado, especialmente quando estamos rindo de nós mesmos, é uma poderosa ferramenta de união. E é claro que meditar juntos diariamente também.

Também aprendemos a construir casas ecológicas, a criar um ecossistema inteiro na terra ocupada. Antes, a área onde está a ecovila não era nada mais do que areia e seixos. Hoje, temos um grande espaço verde. E para você ter uma ideia, a Fundação Findhorn registrou a menor pegada ecológica de todo o mundo desenvolvido. Nossos impactos da natureza são a metade da média de todo o Reino Unido.

Então estamos construindo uma cultura baseada em um espaço comum de valores espirituais compartilhados. Uma cultura que é sustentável de todas as maneiras possíveis e cria sistemas e procedimentos que podem ser replicados em outros lugares e situações. Principalmente, acho que nós temos aprendido que, a fim de aprender realmente você precisa cometer erros. E estamos fazendo muitos deles há 50 anos.

ME – Um ponto que me surpreendeu quando vi a apresentação de Findhorn foi o tripé no qual a organização se baseia. Em vez do típico tripple botton line, vocês levam em conta estruturas sustentáveis do ponto de vista espiritual, social e econômico. Por que trocar a parte que fala do meio ambiente pela espiritualidade?
JA – Espiritualidade tem sido a linha de fundo em Findhorn desde o seu início. Ela inclui trabalhar em harmonia com a natureza. Respeitar o meio ambiente é intrínseco à forma como buscamos incorporar o tipo de espiritualidade que estamos explorando. Foi o jardim cultivado em parceria com os aliados espirituais que criou a comunidade de Findhorn. O jardim excepcional chamou as pessoas que gostaram do que viram e acabaram ficando. À medida em que a comunidade cresceu, ampliamos o trabalho na sustentabilidade social e econômica. Aprendemos a colocar os valores e a ética dos princípios espirituais na prática de todos os tipos de atividades. Por xemplo, temos quatro grandes moinhos de vento, que agora produzem quase 100% de nossa eletricidade. Temos uma máquina viva que processa o lixo doméstico no sítio original. Demos início a programas de reciclagem de vidro e papel muito antes da prefeitura local tornar isso uma política pública. Temos um serviço de transporte entre os nossos dois campi principais para reduzir o uso do automóvel. Cultivamos boa parte da nossa própria comida, mas com tantos convidados, e uma localização no norte da Escócia, há limites para a variedade de culturas que podemos produzir na pequena quantidade de terra que temos.

ME - Você também falar sobre o sagrado na vida cotidiana. Mas parece que hoje em dia, principalmente nas grandes cidades, também em países ricos e em desenvolvimento, nada é mais sagrado do que o dinheiro. Então, antes de mais nada gostaria de saber o que significa este sagrado que você fala, uma vez que não há nenhuma religião oficial em Findhorn. E onde está esse sagrado diante do cenário em que vivemos hoje?
JA – Ao usar a palavra sagrado, refiro-me a todo o sistema de auto-organização inerente a todas as coisas. Alguns chamam de Deus, outros se referem a ele como a Presença ou a Fonte. Uns ainda o chamam de Todo, outros, de vazio. Eu acho que é importante reconhecer que existem milhares de nomes, e até mesmo mais aparências, para o Divino. Em Findhorn, muitos caminhos e tradições diferentes foram seguidas. O que nos une é a nossa busca individual e coletiva de conexão com esse “algo mais”, seja lá qual for o nome que escolhemos dar.

Eu acho que parte do desafio do nosso tempo é encontrar o sagrado em nós mesmos e, especialmente, ver e celebrar o sagrado na natureza. As cidades são lugares fáceis de perder esse contato. É tão fácil ser pego na agitação, no barulho, no tráfego… No entanto, mesmo nesta mega-cidade de São Paulo, a natureza não é assim tão difícil de ser encontrada. Há alguns parques maravilhosos e as árvores ao longo de muitas ruas são incríveis, muitas vezes inteiros ecossistemas vivem em uma planta! Há pássaros na maioria dos lugares e belas pedras nos prédios e calçadas. Se usarmos nossos olhos para ver e pararmos para observar, a natureza está em toda parte. Viver uma vida moderna e ao mesmo tempo estar atento ao sagrado em todas as coisas não são coisas que se excluem. O espírito de comunidade pode ser construído em um apartamento, em uma empresa ou em um bairro. Leva tempo. É preciso empenho, paciência, persistência e perseverança. Mas é divertido tentar!

ME - Em breve você vai realizar o “Jogo Planetário” no Brasil. É a primeira vez que essa atividade acontece fora da Escócia. Por que aqui?
JA – O Jogo Planetário é um evento de grande porte (80-120 pessoas) que exige uma equipe de facilitadores de cerca de 20 pessoas. É um empreendimento logístico enorme e há poucos lugares fora de Findhorn com pessoas dispostas a realizá-lo. Aqui no Brasil há cerca de 100 pessoas credenciadas no Jogo da Transformação (atividade da qual o Jogo Planetário se originou) que podemos contar na realização do evento. Olga Balian, da Taygeta Consultores, vem trazendo várias versões do jogo para o Brasil nos últimos 20 anos. Tem sido um sonho a longo prazo trazer essa atividade para o Brasil. No ano passado, como parte das comemorações de aniversário dos 50 anos de Findhorn, jogamos o Jogo Planetário. Foi quando Olga decidiu que era hora de tornar seu sonho em realidade. O grupo de guias que trabalham com o jogo concordaram com a proposta, então aqui estamos.

ME - Como funciona esse jogo?
JA – Poderia escrever um outro livro aqui. O jogo, em todas as suas versões, é uma ferramenta para exploração pessoal e espiritual. É uma forma lúdica, mas significativa, de explorar uma ampla gama de questões da vida. Também tem muito a ver com um serviço a uma causa maior, como no caso, o Brasil. Começamos com um foco, uma declaração de intenção que esperamos que venha a ser finalizado em breve. Sem dúvida, terá algo a ver com a alma do Brasil e da sustentabilidade. O jogo, como a vida, tem muitas experiências diferentes. Há ideias e recuos, os milagres e as noites escuras da alma, e as oportunidades de servir (a si mesmo e aos outros). Cada um dos participantes encontram conexões com suas próprias experiências de vida e compartilham suas histórias com os outros jogadores, buscando a iluminação.
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REPORTAGEM POR  Henrique Andrade Camargo, do Mercado Ético
FONTE: (Mercado Étic0 http://mercadoetico.terra.com.br/arquivo/sobre-espiritualidade-e-desenvolvimento-sustentavel/?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm_campaign=mercado-etico-hoje

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