‘As pessoas se sentem autorizadas a nos enviar ameaças de morte’, diz Sourisseau
(Foto: Flickr)
MEDO CONSTANTE
Sobreviventes do jornal satírico sofrem com traumas do ataque que matou 12 membros da equipe em janeiro e com constantes ameaças de mort21 out, 2015
Há nove meses, a sede do jornal satírico francês Charlie Hebdo
em Paris, França, foi alvo de um ataque de dois extremistas islâmicos
que matou 12 membros da equipe. O ato chocou e uniu a França e a
comunidade internacional em solidariedade ao jornal, além de
ser repudiado por islâmicos em vários países do mundo, incluindo Brasil.
Após o imenso apoio mundial, que veio sob o slogan Je Suis Charlie
(Eu sou Charlie, em francês), o jornal conseguiu superar o ocorrido, e
as vendas nunca estiveram tão boas quanto agora. O jornal, que tinha uma
tiragem de 30 mil exemplares por mês, hoje conta com 180 mil assinantes
e outros 100 mil exemplares são distribuídos nas bancas. Hospedado na
sede do Libération logo após o ataque, o Charlie Hebdo acaba de se mudar para uma nova sede.
Mas
a volta por cima do jornal não é acompanhada da recuperação psicológica
dos integrantes que sobreviveram ao ataque. Traumatizados eles sofrem
com conflitos internos e depressão, além do constante temor de um novo
ataque. Esses sentimentos negativos são alimentados por ameaças de morte
de várias partes do mundo que são constantemente enviadas aos membros
da equipe, somente no mês passado foram nove.
Em entrevista ao Financial Times, o atual editor do Charlie Hebdo,
Laurent Sourisseau, descreveu a sensação de angústia entre os membros
da equipe. “As pessoas se sentem autorizadas a nos enviar ameaças de
morte, até mesmo por charges que não são de figuras religiosas. Fomos
alvo de processo, de incêndio criminoso em 2011 e de tiros em 2015. Me
pergunto o que virá a seguir”.
Após levar um tiro no braço
direito no ataque de janeiro e presenciar a execução de seus colegas de
equipe, Sourisseau não consegue superar o trauma e teme pelo futuro por
conta do histórico do jornal e das ameaças de morte que recebe. Prova
disso é que chegou para entrevista na sede do ‘FT’ acompanhado de quatro
guarda-costas e um policial à paisana, que chegou mais cedo ao
endereço.
O trauma somado aos atritos internos sobre o
funcionamento do jornal está afastando alguns dos sobreviventes do
ataque. O cartunista Rénald Luzier, que desenhou o profeta Maomé
chorando na capa da edição que circulou no dia seguinte ao ataque,
deixou a equipe alegando fadiga.
Também deixará a equipe Patrick
Pelloux, colunista que ligou do próprio celular para informar o
presidente François Hollande sobre o ataque. Ele deixará o jornal no
final deste ano. “Somos sobreviventes, sim e não. Uma parte de nós se
foi com o ataque”, disse Pelloux em uma recente entrevista dada à rádio
francesa Web7radio.
Humor politicamente incorreto fez jornal perder apoio
Para
piorar a situação, alguns chargistas e acadêmicos vem reduzindo o apoio
dado à liberdade de expressão do jornal, famoso por publicar charges e
sátiras de conteúdo politicamente incorreto ao extremo.
A última
polêmica foi no mês passado, com a charge da foto do menino Aylan, a
criança de quatro anos que morreu afogada quando migrava para a Europa e
teve a foto divulgada por vários jornais do mundo. Na charge, o corpo
menino afogado na praia aparecia com uma tabela de cardápio do McDonalds
ao fundo.
Segundo Sourisseau, o objetivo era retratar a
hipocrisia da forma como os europeus tratam a crise de refugiados, além
do desencanto dos que coneguem entrar na Europa. A crítica, no entanto,
foi mal interpretada, e o jornal recebeu uma série de ameaças de morte.
Tudo isso lança uma dúvida: será que o Charlie Hebdo
conseguirá sobreviver? “Nós continuamos fazendo o que sempre fizemos,
mas nos questionamos onde isso vai dar. Poderemos publicar o Charlie Hebdo daqui a 20 anos? O tipo de humor que ele faz será aceito? Parace bem difícil”, diz Sourisseau.
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Fonte: http://opiniaoenoticia.com.br/internacional/charlie-hebdo-sucesso-nas-vendas-nao-cura-trauma-do-ataque/
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