Montserrat Marins*
“Nunca ninguém veio me pedir algo pelo Brasil”
(Getúlio Vargas)
Há 4 décadas vivíamos numa era de ingenuidade das pessoas comuns, nos
tempos do “Brasil ame-o ou deixe-o” dos anos 70, análogo ao “não
pergunte o que o seu país pode fazer por você, mas o que você pode fazer
por seu país”, lema americano dos anos 60. Nestas décadas desde então
transitamos para uma crescente consciência dos nossos direitos
individuais.
Agora nos “anos 10” do século XXI vivemos o auge desse individualismo
nas manifestações nas redes sociais, onde cada pessoa aprendeu a
manifestar sua revolta não só contra o governo, mas contra os partidos e
os políticos em geral, contra empresários, contra trabalhadores, contra
criminosos, contra preconceituosos, contra os vizinhos fofoqueiros,
quem os espia nas redes sociais, contra tudo e contra todos.
Estamos na era do “tomar no c…”, onde “quem não gostar que se f…”,
frases cada vez mais banalizadas nas redes sociais. Gozar das liberdades
plenamente é quase obrigatório, senão a pessoa se sente “trouxa”.
Pessoas que antes eram tímidas, ou recatadas, já aderiram ao “não
gostou? f…-se”. Comentam-se essas mudanças em tom moral, pró ou contra,
em alguns artigos sobre comportamento. Aqui não estamos apontando essas
liberdades de expressão como moralmente boas ou ruins, apenas
constatando uma tendência de comportamento que já se tornou óbvia.
Num recorte temporal mais amplo, de séculos ao invés de décadas,
podemos dizer que passamos da era vitoriana onde Freud diagnosticava que
os impulsos agressivos e sexuais iam para o inconsciente porque eram
proibidos, ao século XXI onde o sexo passou de assunto proibido para
obrigatório, e a agressividade também. “Não se reprima”, começaram a
dizer as letras de música lá pelos anos 80, ninguém acha graça em
reprimir mais nada. Não podia e agora pode? Aproveitemos!
Alguém poderia dizer que as Igrejas resistem, mas estas também passam
por sutis adaptações, por exemplo redes sociais evangélicas já permitem
fotos de biquinis, sem falar no espírito de tolerância do Papa católico
com a sexualidade.
O maior resultado do individualismo não é a liberdade de crítica ou
sexual, que já estavam consolidadas. A principal consequência é o
descompromisso com as construções coletivas. Qualquer projeto a ser
construído coletivamente, hoje, esbarra nos egos individuais e seus
direitos. A água que bebemos, os alimentos que consumimos, as estradas
em que transitamos, tudo depende de processos coletivos, sociais e
políticos. Ser contra tudo e contra todos não não viabiliza transporte
nem emprego. O coletivismo forçado não resolve.
Chegaremos, depois do porre de liberdade, à consciência de que vivemos e temos de agir coletivamente também?
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* Colunista do Portal EcoDebate, é médico psiquiatra, bacharel em
Ciências Jurídicas e Sociais e presidente do IGS – Instituto Gaúcho da
Sustentabilidade.
Fonte: http://www.ecodebate.com.br/2015/10/13/individualismo-vai-artigo-de-montserrat-martins/
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