Vive com um punhado de tempo
"passado"
na pele e qualquer coisa de tempo "futuro" na cabeça. acostumou-se a viver sem mapas… e, a se mudar de cá para
lá.
Lunna Guedes é escritora, editora... artesã de
livros e degustadora de cafés, sendo seus favoritos os que são servidos em copos
brancos, com uma sereia de duas caldas desenhada na "borda". É seu placebo...
remendo.
Nasceu em Gênova, em
1981... mudou-se para São Paulo em 2002, onde conheceu seu Mr. Darcy. Abandonou
a prática da psicanálise e foi viver sua paixão: escrever e costurar seus
livros: hoje tem um cachorro, um punhado de livros, sendo três seus e um punhado
dos outros. Nunca foi tão feliz... caminha sem pressa, com prazer e está sempre
acompanhada pelas ilusões da vida, a arte dos dias e a paixão
contínua.
Lunnaguedes por Lunna Guedes – vive com um punhado de tempo
"passado"
na pele e qualquer coisa de tempo "futuro" na cabeça. acostumou-se a viver sem mapas… e, a se mudar de cá para
lá.
mulher. sagitariana.
blogueira. se diz italiana as segundas. paulistana as terças. sem lar ou país as
quartas e, nos demais dias da semana, se diz outra que não ela, que não
ninguém…
Tem um boxer chamado
Patrick. um namorado a quem, por força da língua, chama de: "amore mio" e um
punhado de pessoas, que coleciona, como se fossem figurinhas e ela um álbum
incompleto.
não gosta de fazer
compras. detesta dias de sol e por consequência, ama dias de chuva. teve vários
outros nomes, mas como não suporta rótulos, foi ao longo dos dias, inventando
superfícies. já foi Raissa, Alexandra, Deborah, Catarina … mas volta sempre a
ser lunna das noites inteiras! E passadas as
seis horas – quando não invertem o horário e mandam tudo para mais tarde – ela
faz uma pausa: fecha os olhos e reza sua prece; um poema de Eliot, Borges ou
Campos…
BAP1: Fale-nos de como uma
psicanalista deixa para trás seu caminho profissional e abraça outro, o das
letras, da escrita. Como se deu essa ruptura/metamorfose e por quê?
Lunna Guedes: Ruptura
significa deixar a casca e não foi o que aconteceu comigo... eu percorri o
caminho inverso. Saí totalmente de mim... me abandonei e fui em outras
direções. Eu me lembro como se fosse ontem do reencontro, diante do espelho.
Senti saudades de estar sozinha, na cozinha de casa, de frente para o mar, com
um punhado de papéis em banco a conversar com esse eu que habita o fundo de
minha matéria. Eu escolhi voltar para a casa que sou. Como disse Pessoa:
“primeiro a gente estranha-se, depois entranha-se”.
BAP2: O que representa “Lua
de Papel” na sua trajetória artística?
LG: Só há uma
maneira de definir "lua de papel"... é minha metástase.
BAP3: Você escreve e edita
livros, e é blogueira. O futuro da literatura está no livro físico, nos e-books
e blogs ou em ambos? Fale também sobre esse campo de atuação da literatura no
mundo dito virtual.
O mundo virtual é apenas mais uma voz e,
se souber ser usada pelo escritor, faz eco... caso contrário, fica pelo
caminho.
BAP4: Em sua biografia,
você diz: “Lunna caminha sem pressa, com prazer e está sempre acompanhada pelas
ilusões da vida, a arte dos dias e a paixão contínua.” Até que ponto chega a
sua liberdade? Quando você percebeu que a pressa da vida não deveria mais te
atingir?
LG: ...quando li
“passagem das horas”, de Álvaro de Campos: “trago dentro do meu coração,
como num cofre que se não pode fechar de cheio. Todos os lugares onde estive.
Todos os portos a que cheguei. Todas as paisagens que vi através de janelas ou
vigias. Ou de tombadilhos, sonhando. E tudo isso, que é tanto, é pouco para o
que eu quero”. Percebi que a escrita seria o meu Norte, mas era preciso
tempo... respeitar as minhas pausas, compreender minhas quietudes e,
principalmente, aceitar a minha monotonia. A escrita pede disciplina e me
lembra constantemente de que eu sou uma escritora até a última linha... depois
disso, não sou ninguém, mais nada, e preciso aceitar que talvez seja para
sempre. Não é fácil. Já me acabei milhares de vezes... Confesso que, a cada nova
morte, tem sido bem mais fácil renascer, mas em algum momento não será mais
possível. Eu sei disso, ainda que não tenha aceitado muito bem... (risos)
BAP5: Você retira dos
acontecimentos do cotidiano a matéria-prima para seus escritos, ou tudo que
você escreve é fruto de sua imaginação? A maioria dos escritores diz que
mistura tudo. Como é esse processo da escrita para você?
LG: Demorei
muito para compreender as regras desse jogo... até que li o diário de Sylvia
Plath e uma passagem dela reverberou em minhas entranhas. Ela dizia que adorava
pessoas... eu dizia justamente o contrário, mas percebi que estava errada. Eu
adoro pessoas e tudo que elas acrescentam ao meu imaginário. Para ele, pessoas
são ingredientes... quem sou eu para dizer o contrário? (risos)
e é isso o que mais assusta, porque as pessoas têm medo da mudança, principalmente quando não há tempo para se preparar para o inevitável."
BAP6: Aos escritores, em
geral, é atribuído um lugar de “sujeito suposto saber”, afinal, eles “sabem”
tudo dos seus personagens, imaginam os leitores. Você concorda com essa
premissa? Os escritores possuem essa onipotência mesmo?
BAP7: Sendo uma genovesa
que adotou o Brasil, e mais precisamente São Paulo – uma cidade caracterizada
pela combinação de diferentes povos de todos os locais do mundo – como sua
casa, como você analisa a atual crise migratória européia?
LG: Acho um
bocado difícil... eu vim para São Paulo pela primeira vez a contragosto. Não
tive opção e, quando fui embora, disse que não voltaria. Voltei em 2002 para
“encontrar” a cidade de um dos meus autores favoritos: Mário de Andrade. Não
foi fácil... mas foi bem menos difícil. Demorei a me acostumar, ambientar. A
língua não foi o único problema. Os costumes são outros. A realidade... Então,
imagino a realidade de todas essas pessoas em fuga. Ninguém está preparado para
esse problema: nem as pessoas que fogem de seu país. nem as que terão que
recebê-las.
Acho que a Europa será outra em pouco tempo... e é isso o que mais assusta,
porque as pessoas têm medo da mudança, principalmente quando não há tempo para
se preparar para o inevitável.
BAP8: Fale um pouco sobre o seu selo artesanal, a Scenarium. Fazer e vender
livros artesanais, além do prazer enorme que deve lhe proporcionar, também é um
bom negócio (no Brasil e no mundo)? Explique como é o processo editorial de um
livro artesanal?
Foi uma surpresa – confesso – me deparar
com pessoas interessadas em ter seus livros costurados por mim. Quando me dei
conta, já não conseguia mais atender aos pedidos sozinha... foi quando surgiu a
ideia de “produção independente”.
Desde que inventei a Scenarium, o meu
trabalho consiste em garimpar autores que combinem com o meu estilo Editorial
e, principalmente, que me façam sentir vontade de alinhavá-los... eu sou uma
pessoa muito exigente, chata e tenho para mim que a escrita deve ser um diálogo
entre autor e leitor. Se não conversa comigo... recuso, mas não quer dizer que
o autor não seja bom, apenas não serve para o meu projeto.
Não gosto de nada que aconteça sem
esforço... acho que um autor deve ler seus escritos, ter consciência de que não
estão prontos e talvez nunca fiquem. Sobretudo, precisa entender que o olhar do
Editor (no caso, o meu) vai atravessá-lo e, em algum lugar, existirão
reticências...
--------FONTE: http://bocaapenas.blogspot.com.br/01/10/2015
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