Rubens Ricupero*
Com queda na fecundidade, Brasil se aproxima do colapso demográfico de espanhóis e italianos
O Natal, festa de um nascimento, parece dia adequado para tratar de uma
crise despercebida no Brasil: a dos nascimentos. Desde 2003, quando pela
primeira vez se registrou taxa de fecundidade abaixo do nível de
reposição da população (2,1 filhos por mulher), os nascimentos caem em
ritmo acelerado.
Os dados recentes sugerem que a taxa esteja em 1,8, atingindo já 1,5 em cidades do interior de São Paulo e Estados do Sul.
O país se aproxima rápida e perigosamente do colapso demográfico de
espanhóis e italianos (1,2 a 1,3), para não falar dos japoneses.
Perdemos da França, da Suécia, dos escandinavos.
O surpreendente (e alarmante) é que até a Argentina e o Uruguai,
sociedades maduras, as primeiras a se urbanizarem na América Latina, já
nos deixaram para trás. O normal seria que as sociedades prematuramente
envelhecidas do Rio da Prata tivessem menos filhos que nós.
No entanto, nos mapas demográficos da América Latina, elas aparecem como
tendo fecundidade média, ao passo que o Brasil está na zona de baixa
fecundidade.
Os únicos no continente com taxas tão minguadas são cubanos e alguns
caribenhos de cultura histórica com mais de um ponto de contato com a
brasileira.
E os Estados Unidos, perguntará o leitor? Conservam fecundidade alta,
graças aos imigrantes, mas essa superioridade começa a mudar. Estudo
recente indica que os nascimentos chegaram ao ponto mais baixo desde
1920, devido à queda geral de 8% de 2007 a 2010. A queda maior foi entre
as mulheres imigrantes (declínio de 14%) e das mexicanas (23%),
justamente o grupo que antes garantia alta natalidade.
A explicação é a crise econômica, que atingiu, sobretudo, os grupos
vulneráveis. Para o Brasil, com pleno emprego, salários em alta,
expansão do consumo, tal razão não vale. Aliás, um dos paradoxos
brasileiros é que outros índices como a violência e a criminalidade, que
deveriam estar caindo com a moderação demográfica e a melhoria do bem
estar, continuam a se agravar de modo assustador.
Nos países afetados pela queda da natalidade, o problema está no centro
das atenções. Nos EUA, os índices desencadearam debate intenso. Na
Rússia, o presidente Putin anunciou um programa de 1,5 trilhão de rublos
(US$ 53 bilhões) para recuperar a fecundidade. Se falhar, os 143
milhões de russos serão apenas 107 milhões em 2050. Trata-se, como disse
o presidente, de questão de sobrevivência da nação.
A França, país histórico da queda da natalidade, inverteu a situação com
política de ênfase em incentivos a famílias com filhos e construção de
creches. O mesmo fazem os escandinavos, com resultados que permitiram
recuperar parte da fecundidade perdida. Tentam adotar políticas
similares a Coreia e o Japão, que temem se converter numa espécie de
asilo para idosos.
No Brasil, o assunto é olimpicamente ignorado. Políticas de natalidade
ou de imigração soam tão excêntricas como no tempo em que ainda vivíamos
a explosão demográfica. Véspera de Natal é um bom momento para
refletirmos que o nascimento de um ser humano pode fazer uma enorme
diferença!
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* Jurista. Ex-diplomata.
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/85453-natal-natalidade.shtml
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