Thomaz Wood Jr.
A onipresença das redes sociais, a ansiedade por status e o culto
à celebridade levam à criação de índices de influência
O fenômeno foi detectado acima da linha do Equador. Em abril de 2012, a revista Wired publicou matéria a respeito. No fim de novembro, um texto no website da Harvard Business Review lhe fez eco e, em seguida, uma colunista do Financial Times
orientou sua ironia britânica ao assunto. O centro da polêmica é o
Índice Klout, criação de Joe Fernandez, um empreendedor de São
Francisco, a mesma cidade na qual Alfred Hitchcock filmou Vertigo.
A cria gerou polêmica, e alguma vertigem, porque o tal índice foi
desenvolvido para medir o grau de influência de qualquer indivíduo (eu,
tu, ele, nós, vós e eles) nas redes sociais, ou pseudossociais.
O Índice Klout, como outros similares, é calculado a partir de uma
base de variáveis que inclui o número de seguidores no Twitter, a
frequência de atualizações, o número de recomendações, o Índice Klout de
amigos e seguidores etc. A escala varia de 1 a 100: 1 equivale a um
atestado de inexistência digital; valores próximos de 20 indicam a
insignificância social do indivíduo; valores próximos de 100 são
atribuídos aos luminares do nosso tempo, como, por exemplo, a
celebridade pop Justin Bieber.
Para ter um Índice Klout decente é necessário frequentar as redes
sociais, dedicar tempo e energia a indicar os mais incríveis
restaurantes japoneses no Facebook e a inserir aforismos filosóficos em
até 140 caracteres no Twitter. Entretanto, isso não basta: é preciso
também que as pérolas, em fatos e fotos, viajem pelas redes sociais e
sejam reproduzidas por outros usuários.
Agora, reportam os cronistas do Norte, o fenômeno
chega às empresas. De fato, no mundo corporativo, o fetiche da
influência não é novo. Há duas décadas, em um estudo científico,
pesquisadores fizeram ao corpo gerencial de uma empresa três singelas
perguntas: Primeira, quem é o seu líder? Segunda, em quem você confia?
E, terceira, quem você procura quando tem um problema? Da compilação das
respostas surgiram, respectivamente, o organograma da empresa e suas
redes de confiança e expertise. Significativamente, os diagramas gerados
eram diferentes. Alguns gestores, de alta patente, apareceram
solitários nas redes de confiança e expertise. Outros, apesar da baixa
patente, mostraram-se influentes.
De lá para cá, multiplicaram-se os cursos e livros de autoajuda
corporativa, para treinar candidatos a Maquiavel na arte de fazer amigos
e influenciar pessoas. Hoje, reza o credo, explícito ou implícito, nas
empresas: não basta ser honesto, inteligente e trabalhador; o que
importa é ter influência ou parecer ter influência.
A novidade agora é a onipresença das redes sociais, inclusive nas
empresas. Com a base montada, era questão de tempo até um empreendedor
californiano, anabolizado por um investidor, criar um obscuro algoritmo
matemático e inventar um índice de influência.
Gestores de recursos humanos, sempre ávidos por novidades de baixa
densidade, começam a adotar os índices de influência para definir
contratações, promoções e demissões: “Prezado, todos aqui o respeitamos e
reconhecemos sua contribuição, mas seu índice de influência caiu 20% no
ano passado e não poderemos mais mantê-lo em nossos quadros”. Se a moda
pega, logo surgirão assessores especializados, capazes de alavancar o
Índice Klout de qualquer um disposto a pagar pelo serviço. E pode ser um
negócio lucrativo, porque um patamar duramente conquistado pode
despencar se o personagem tirar duas semanas de férias, distante das
redes sociais.
Empresas mencionadas pela Wired estão
também utilizando o Índice Klout de clientes para decidir a quem dar
maior atenção. Talvez num futuro próximo tenhamos celebridades Klout
sendo convidadas a furar filas, ganhar descontos especiais em hotéis e
restaurantes, e obter upgrades instantâneos em viagens aéreas.
Com a novidade vieram as críticas. A ideia de ter a vida profissional
ou pessoal afetada por algoritmos obscuros criados por pós-adolescentes
recém-egressos de Stanford pode ser detestável. Lucy Kellaway, do Financial Times,
afirma não fazer sentido sintetizar em um número algo tão subjetivo
quanto o grau de influência. Simplista, o Índice Klout iguala
celebridades pop a chefes de Estado.
Joe Fernandez, o criador, declarou à Wired que vê o Índice
Klout como uma forma de dar mais poder às pessoas comuns, de
democratizar a influência. Parece ter boas intenções. No entanto, em um
mundo obcecado com a aparência e o status, os índices de
influência podem também constituir mais um componente para alimentar a
estratificação social, a ansiedade e o comportamento de manada,
características já marcantes, e irritantes, do nosso tempo.
---------------
* Thomaz Wood Jr. escreve sobre gestão e o mundo da administração.
thomaz.wood@fgv.br
Fonte: http://www.cartacapital.com.br/economia/influencia-2-0
Nenhum comentário:
Postar um comentário