André V. Singer*
O rebaixamento do Brasil pela Standard & Poor’s, ao provocar
mais uma rodada de reações tópicas de um governo desesperadamente
carente de orientação, inaugura o que pode ser um dos últimos capítulos
do segundo mandato de Dilma Rousseff. Não tanto pelas consequências
econômicas da nota negativa, mas pelo vácuo político que ajuda a formar
em torno do Planalto enquanto, do outro lado da Praça dos Três Poderes, a
contagem regressiva dos que se engajaram na tese do impeachment começa a
atrair mais adeptos.
Em resposta à perda do selo de boa pagadora, a presidente ordena
cortes urgentes e medidas administrativas de contenção. Trata-se do
equivocado cálculo de que ao ceder a esmo às pressões imediatas, agora
potencializadas pela agência de rating, diminuirá a adesão ao plano
golpista. Não percebe que a única coisa que pode preservá-la –e junto
com ela a integridade democrática e as conquistas sociais do período
lulista– seria apresentar uma perspectiva coerente de médio prazo,
organizando arco de forças interessadas em acordo mínimo de estabilidade
e fim da recessão.
Mas para tanto, Dilma precisaria sair da encalacrada em que começou a
se meter no dia seguinte à reeleição, quando, ao contrário de tudo o
que prometera, foi buscar no mercado financeiro alguém para comandar o
Ministério da Fazenda. Isolada do conjunto da burguesia, aconselhada por
Lula desde 2012 a tirar Guido Mantega, com a Operação Lava Jato
desmontando os partidos, na iminência de ter Eduardo Cunha no comando da
Câmara dos Deputados, a recém-reeleita deu o passo fatal.
Com uma economia já parada e os juros em ascensão permanente, Dilma
optou por um ajuste fiscal draconiano e assassino. Não foi preciso
sequer esperar que os cortes orçamentários fossem efetivados. Bastou o
anúncio deles para que todos os agentes –consumidores, investidores,
empresas – começassem a contrair as atividades.
O resultado aí está. Uma recessão prevista de pelo menos 2,5% em
2015, o desemprego em alta, a renda do trabalhador em baixa e, com a
arrecadação despencando, o rombo fiscal aberto. Diante do estrago, numa
espécie de reflexo condicionado, os conservadores pressionam por mais
dureza e rigor. Só que atendidos tais apelos, daqui a alguns meses
estaremos em um poço ainda mais profundo e o governo –qualquer que seja
ele– em maus lençóis.
Do ponto de vista de classe, um pacto de ruptura com esse círculo
vicioso seria possível e permitiria diminuir as perdas de todos. Porém, o
tempo político para que a presidente o encabece se esfuma dia a dia. A
triste alternativa do impeachment, como arremedo antidemocrático do
parlamentarismo que não temos, poderá jogar o problema no colo de um
eventual “gabinete” Michel Temer.
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André Vítor Singer é um cientista político, professor e jornalista brasileiro.Fonte: Sul21 13/09/2015
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