Célia Siqueira Farjalatt*
“Para ganhar um Novo Ano que mereça este nome, você meu caro,
tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo;
eu sei que não é fácil.
Mas tente,
experimente,
consciente...”
Carlos Drummond de Andrade
Clima de festa e de esperança, mas também de muitas expectativas, de certo pessimismo, de saturação. No cenário tecnológico e científico, a antevisão de fabulosas conquistas. Vejam, por exemplo, como já se pesquisa a produção de órgãos com células-tronco. Dia chegará em que teremos fígado e rins, miolos e o resto reconstituídos.
Neste clima, de um lado a esperança mais inocente, de outro a incredulidade, despede-se o Ano Velho, que encarquilhado já deu seus últimos sinais de vida. Nós o empurramos, sem cerimônia, para um canto da memória e lá o deixamos com os despojos de outros anos, vividos e sofridos. Agora, não o queremos mais, pois preferimos os anseios, as louvações, os afagos para o Novo Ano.
É tempo de retrospectivas pelos jornais, tevês e rádios. Tempo de entrevistados deitarem falação, de políticos enaltecerem seus planos infalíveis, a serem executados no “Dia de São Nunca”. Alguns deles ainda conseguem ser originais, mas a maioria repete banalidades e chateações, e fazem calorosos votos de felicidades, que provocam bocejos e sorrisos de ironia.
As coisas nem sempre mudam de ano para ano. Ou melhor, mudamos nós, como lamentava o poeta. Temos olhos mais frios e argutos, às vezes, cínicos. Não é que não se acredite em novos planos, em novos tempos mais felizes e calmos, e, sobretudo, mais honestos. Acreditamos, sim, mas em termos. Hoje, já desconfiamos de políticos sorridentes, de legisladores em causa própria, de enfatuados medalhões; de gente medíocre e ainda chata, de uma chatice de arrepiar.
Mas o Ano Novo está aí, com mil promessas. Que seja o portador de dias mais sossegados, sem pivetes e sem meninos drogados. Que as crianças encontrem seu espaço e muita ternura, muita paciência, além de boa dose de senso comum.
Que, no Novo Ano, os jovens percebam que os tempos exigem esforço, trabalho e colaboração. Por exemplo, que respeitem a escola onde estudam, que ela seja seu segundo lar e que, quando partirem, saibam que lá estão deixando os melhores anos de sua vida.
Que, enfim, homens e mulheres não se robotizem nem esperem apenas as respostas que saem dos terminais dos computadores sem sentimento e emoção. Que as alegrias sejam repartidas, as responsabilidades divididas; que o egoísmo, a ingratidão, a ganância sejam banidos para sempre. Espero tudo isso no decorrer do próximo ano. Tudo isso e o céu também.
*Célia Siqueira Farjalatt, cronista do Correio, escreve nesta página às segundas, quintas e sextas
FONTE: Correio Popular online, 01/01/2010
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