quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Nós, robôs

Paulo Rossi


Há dois ou três meses, li entrevista com um pesquisador inglês que pretende ser o primeiro ciborgue, misto de ser humano e robô. Ele já implantou chips debaixo da pele duas vezes e pretende radicalizar a experiência nos próximos 10 anos, inserindo a engenhoca na base do crânio. O tal cientista considera a comunicação humana muito falha. E projeta, graças à informatização da mente, praticar algo próximo à telepatia.

A edição de janeiro da revista Galileu publica reportagem intitulada “Dez ideias para a nova década”, que joga mais lenha na fogueira da inteligência artificial. O norte-americano Thornton May, diretor da IT Leadership Academy — espécie de laboratório de futurismo — aposta que, em sete anos, haverá “vacinas de idiomas”. Ninguém vai precisar estudar para aprender línguas. Chips instalados no cérebro transformarão qualquer um em poliglota.

Não sei se bato palmas para a engenhosidade humana ou se fico preocupado com as gerações que estão por vir. Ao mesmo tempo em que a tecnologia abre janelas para formidáveis viagens, escancara a porta para um modo de vida que nada tem a ver com evolução.

Vislumbro crianças e adolescentes desinteressados pelo estudo e pelo debate intelectual. Afinal, por que gastar a massa cinzenta em livros se um minúsculo artefato dará conta do recado, sem o mínimo esforço? A inventividade dos criadores poderá criar um paradoxo: faltarão interessados em sucedê-los nas pesquisas científicas, já que as pílulas de conhecimento estarão disponíveis nas prateleiras.

Tenho receio de que a humanidade se transforme em algo parecido com o que se vê no filme Wall-E, uma das muitas animações geniais da Pixar: cidadãos obesos, enfiados numa poltrona cibernética, entupidos de informações, mas sem olhar nos olhos do vizinho ou perceber o que se passa bem em frente ao nariz.

Vai ver que estou ficando velho, conservador e resistente a inovações. Depois dos 40, bate a nostalgia dos tempos em que videogame se chamava telejogo e celular só se via nos episódios da série Jornada nas estrelas. Mesmo assim, é bom os donos de cursinho de inglês botarem as barbas de molho...

Fonte: Correio Braziliense online, 06/01/2010

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