IVO LIMA*
Entre a moral (deveres, civilidade, regras) e a ética, acho que é urgente a escola ser um lugar de repercussão, ou melhor, espaço de reflexão sobre essa questão da vida que se quer viver, porque é essa falta de resposta que, no fundo, leva à incivilidade e à violência, entre outras coisas.
Ives de La Taille, psicólogo da USP
Às vezes, fico me perguntando o que está acontecendo com o ser humano, principalmente numa época em que a humanidade galgou importantes conquistas científicas em várias áreas do conhecimento.
Se tomarmos o setor da Comunicação, por exemplo, entre outros inventos fantásticos, podemos citar o celular. No início, havia aqueles aparelhos que pareciam um trabuco na cintura, tão pesados que deixavam o usuário até andando de lado. Com o passar do tempo, a evolução científica encarregou-se de modificar os modelos de aparelho celular: há uma variedade de tamanhos, bem menores, mais bonitos e com muitas opções.
Mas como o ser humano anda utilizando esse aparelho no seu dia a dia? Em sala de aula, por exemplo, ouvindo música no lugar errado, na hora errada, sendo petulante, quando o educador e mesmo os colegas lhe chamam a atenção. Isso atrapalha demais o andamento das aulas, comprometendo as explicações, as discussões, a realização das atividades e, consequentemente, o aprendizado.
No coletivo — ônibus — com ele ligado alto e, muitas vezes, em músicas que desfilam um repertório de palavrões que deixa os usuários horrorizados com tamanha falta de respeito e de desconfiômetro. Se os passageiros, o cobrador ou mesmo o motorista pedirem para o cidadão ler o aviso fixado no ônibus “Proibido o uso de aparelhos eletrônicos”, é tratado com ignorância e, quando não, com agressões verbais ou físicas. Diante dessa situação e de muitas outras, fica aqui uma sugestão para as operadoras de aparelhos celulares: quando venderem um aparelho ao cliente, ofereçam junto um manual de Etiqueta do celular. Quem sabe, assim, muitas pessoas possam tomar conhecimento da importância de usar o aparelho adequadamente e, principalmente, levem em conta o outro que está ao seu lado, aliando tecnologia e respeito para com seus semelhantes.
Recentemente, uma repórter de um canal de televisão de abrangência nacional perguntou a um adolescente: “O que você acha de ficar com o celular ligado alto em locais inadequados?” Veja o que ele respondeu: “Antes que as pessoas me incomodem, eu incomodo elas”. Isso mostra como muitas pessoas estão pensando e agindo no espaço coletivo, ou seja, os outros não contam, porque, em primeiro lugar, está satisfazer caprichos, mesmo caindo no ridículo.
Se, por um lado, podemos nos beneficiar dos avanços da ciência, por outro lado, o despreparo no manuseio delas e a falta de consciência das pessoas acabam causando muitos transtornos à sociedade, pois o que está prevalecendo com essas atitudes infelizes é a falta de educação, de respeito ao próximo, numa demonstração de falta de bom senso que causa indignação. E o resultado disso, entre outras consequências, é a violência.
Mas o que fazer para alterar esse quadro, além de sugerir a organização por parte das operadoras, de um manual de Etiqueta do celular? Que as pessoas passem a perceber que não podem se comportar como se estivessem numa ilha, isoladas, que saibam que pequenas ações ou grandes refletem para o bem ou para o mal delas e dos outros.
Além disso, seria muito importante que levassem a sério a regra de ouro, que diz: “Não faça, aos outros aquilo que não quer façam a você”. Praticar isso não é algo simples. Mas não custa nada procurar fazer a sua parte, para que tenhamos uma sociedade melhor, a partir de bases fundamentais, como: educação, respeito, ética, justiça social, cuidado com o meio ambiente, cultivo da dimensão espiritual, entre outros requisitos. É mais fácil só reclamar e dizer que o mundo está perdido, que não há mais solução.
________________________________________________*Ivo Lima é professor de Filosofia e escritor, autor do livro O recheio que faltava em sua vida
Fonte: Correio Popular online, 16/02/2010
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