Marcelo Gleiser*
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Está na hora de nós aceitarmos limites sobre o que se pode conhecer do Cosmo
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Em 1992, o vencedor do Nobel de física, Steven Weinberg, publicou um livro com o título da coluna de hoje. Nele, Weinberg expressou a visão de que, por trás da aparente diversidade do mundo natural, existe uma união que pode ser revelada por meio das leis da física. Segundo Weinberg, todas as manifestações do mundo material podem ser expressas através de leis quantitativas que derivam de uma teoria que explica tudo o que existe, a Teoria Final. Seria o triunfo definitivo do reducionismo.
A ideia não é nada nova. Suas origens são bem mais antigas do que a própria ciência ou mesmo a filosofia ocidental. Em religiões monoteístas, o mundo e seus habitantes são criação de um Deus. Se tudo vem de Deus, tudo tem a mesma origem. Essa unidade aparece mesmo em crenças onde não existe uma divindade central, como o conceito de Brahma no politeísmo hindu, ou na figura do Buda, no budismo. Com o desenvolvimento das rotas de comércio entre a Ásia e a Europa no século 6º a. C., essas ideias influenciaram os primeiros filósofos da Grécia Antiga, os pré-socráticos.
Tales, o primeiro deles, instituiu a ideia de que tudo o que existe no mundo é feito de um único tipo de matéria, propondo assim uma unificação material. "Tudo é água", disse ele, sugerindo que as diversas expressões da matéria revelam-se nas propriedades da água, sempre transitória.
Esse monismo, a noção de que a diversidade aparente das coisas é ilusória e de que existe uma unidade fundamental, é o conceito-chave da busca pelo "campo unificado", a expressão moderna da Teoria Final.
Na física, teorias unificadas se referem apenas aos constituintes fundamentais da matéria, as chamadas partículas elementares, como o elétron, os quarks (integrantes dos prótons e nêutrons) e suas interações.
Seria ingênuo supor que um conhecimento das partículas de matéria e das forças que elas exercem umas sobre as outras poderia dizer algo sobre o clima terrestre, o funcionamento do cérebro ou a duplicação de DNA. Essas questões têm de ser abordadas através de outros métodos, expressos através de leis muito diferentes que regem esses domínios específicos.
Mas, mesmo dentro do seu limite de atuação, será que a noção de que podemos chegar a uma teoria final da matéria e de suas propriedades faz sentido? Tudo o que sabemos hoje sobre as partículas e suas forças está no Modelo Padrão: existem 12 tipos de partículas de matéria e quatro forças entre elas: gravidade, eletromagnetismo e forças nucleares forte e fraca.
Uma teoria unificada da matéria demonstraria que essas forças são, na verdade, manifestação de uma só. Essa unificação só apareceria em altíssimas energias, muito além do que podemos testar com experimentos atuais. Vamos supor que uma teoria unificada dessas forças exista, quem sabe uma versão futura da teoria das supercordas. Eu diria que mesmo essa teoria jamais poderia ser considerada uma teoria final. E por quê?
Porque sabemos apenas aquilo que podemos medir. Todo o conhecimento científico que temos do mundo natural depende dos nossos instrumentos de observação. Mesmo que esses instrumentos avancem em sua precisão, jamais poderão ter precisão perfeita. Existem barreiras tecnológicas e mesmo conceituais para isso. Sendo assim, jamais poderemos conhecer a totalidade dos fenômenos materiais para nos certificar de que nossa teoria cobre tudo o que existe. Estamos cercados de uma escuridão perene, que demarca o limite do que sabemos sobre o mundo. Uma teoria final significaria um conhecimento absoluto, o que é uma impossibilidade. É hora de aceitarmos nossas limitações.
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*MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA) e autor do livro "A Harmonia do Mundo"
Fonte: Folha online, 28/02/2010
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