quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Deus e o dinheiro

Editorial

Bem-intencionada, como sempre, mas destoando da realidade em vários pontos, a Campanha da Fraternidade de 2010 prega anacronismos incompatíveis com a realidade do mundo moderno. Ao condenar pontos centrais do sistema capitalista, como o lucro e a lógica de mercado, a mobilização ecumênica coordenada pelo Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil (Conic) resvala para a utopia e não oferece alternativas concretas. Quando oferece – como no caso da crítica ao agronegócio –, propõe fórmulas já desgastadas e inaplicáveis. Pouca gente ainda acredita que a reforma agrária, nos moldes antigos, seja uma solução econômica e social adequada para o país. Já a agricultura familiar tem que existir e ser incentivada, mas para conviver com a produção industrializada e não para substituí-la.

Ainda assim, o debate proposto pelas igrejas cristãs é oportuno, pois o mundo está saindo de uma crise econômica gerada exatamente pelas deformações do sistema capitalista. De outra parte, o consumismo predatório precisa mesmo ser contido, pois está na origem da violência, da degradação ambiental e das desigualdades sociais. Ao propor regras para o sistema financeiro e para o capital especulativo, o Conic não destoa em nada das lideranças políticas mundiais que chegaram à mesma conclusão após a crise do ano passado.

Inoportuna talvez seja a pregação de uma incompatibilidade radical entre Deus e o dinheiro, como sugerem alguns setores religiosos. Da mesma forma como é equivocada e perigosa a chamada Teologia da Prosperidade, que coloca o dinheiro como pré-requisito para a conquista da paz espiritual, também não constrói a demonização do lucro, que é uma legítima recompensa para o trabalho. Como em tudo, a virtude está no meio: o capitalismo, enquanto não surgir uma alternativa melhor, pode ser praticado com responsabilidade social, respeitando as pessoas e suas crenças.
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Fonte: ZH online, 18/02/2010

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