Trabalho em equipe
Pós-doutorando do Centro de Excelência em Geogenética do Museu de História Natural da Universidade de Copenhague e coautor do estudo sobre Inuk, o cientista Morten Rasmussen foi o braço direito de Eske Willerslev durante a pesquisa e responsável por fazer as análises qualitativas do DNA do homem ancestral. Em entrevista ao Correio, ele diz que novas pesquisas podem resolver as questões sobre as rotas migratórias, um vazio que ainda existe na ciência.
Como os senhores conseguiram fazer o primeiro sequenciamento do genoma de um ancestral humano e como obtiveram as amostras?
Nós recolhemos a amostra de cabelo de um espécime escavado em 1986 que estava no Museu de História Natural da Dinamarca. O DNA foi extraído e nós começamos o processo de sequenciamento. Essa não é a primeira vez que recolhemos DNA de amostras humanas antigas. A coisa interessante é que nós juntamos o genoma completo. A partir de 3,5 bilhões de pedaços de DNA, nós formamos um gigante quebra-cabeças, usando a referência humana como modelo.
De que maneira o senhor acredita que o estudo poderá ajudar a entender culturas extintas? Qual o grau de importância para a ciência em sua opinião?
Esse estudo nos permitiu encontrar dados sobre culturas extintas que seriam impossíveis de outra maneira. O Inuk pertence à cultura Saqqaq, de onde há material humano muito limitado. Recolhemos quatro tufos de cabelo e quatro fragmentos ósseos. Com base nisso, somos capazes de dizer algo sobre as feições físicas dessa pessoa, sobre seus ancestrais e inferir padrões migratórios com uma resolução muito mais alta. Nossa pesquisa é a prova do princípio de que podemos atualmente obter sequenciamento genético de culturas extintas. Também tivemos sucesso em obter a qualidade da sequência final emum nível muito próximo do que vemos em modernos projetos de sequenciamento. Algo que era impensável.
Como os senhores obtiveram o DNA do Inuk e quais as principais características desse indivíduo?
O DNA foi extraído de uma parte do maior tufo de cabelo encontrado. As principais características que pudemos inferir sobre o Inuk são: olhos castanhos, cabelo e pele escuros, dentes frontais na forma de pás, tendência à calvície, cera do ouvido seca, tipo sanguíneo A positivo. Nós também podemos dizer que ele se adaptou a um clima frio e que provavelmente morreu jovem — principalmente por causa do grande tufo de cabelo encontrado e sua tendência à calvície.
Quantos cientistas trabalharam no projeto e quais os principais passos até se chegar ao total sequenciamento genético?
O estudo reuniu 52 coautores de diversas disciplinas científicas. Desde a extração do DNA até a bioinformática para a genética da população. O processo para obter o sequenciamento genético consiste em primeiro extrair o DNA. Então, adicionamos sequências específicas do DNA a todos os fragmentos extraídos. Com base em marcadores específicos, reconhecemos e sequenciamos o DNA. Finalizamos com várias pequenas sequências de DNA — nesse caso, 3,5 bilhões —, que precisamos juntar para concluir o sequenciamento genético. Depois disso, pudemos começar a análise, procurando determinar com o que o Inuk se parecia e de onde seus ancestrais vieram.
O que mais o senhor acredita que o estudo poderá revelar sobre nossos ancestrais?
O estudo é uma prova de princípio. Dada a idade da amostra, revela coisas importantes sobre as populações do Novo Mundo Ártico. Podemos dizer que havia várias migrações independentes na Groenlândia. Os parentes mais próximos do Inuk viviam na Sibéria. Se expandirmos o número de amostras sequenciadas, seremos capazes de responder a questões sobre migrações ainda com detalhe maior.
Esse estudo nos permitiu encontrar dados sobre culturas extintas
que seriam impossíveis de outra maneira
Para entender:
Um homem moreno, de olhos castanhos, com tipo sanguíneo A positivo, dono dentes no formato de pás e ouvidos com cera seca, além de cabelos compridos — apesar de uma forte tendência à calvície. Assim era o humano pré-histórico que viveu na Groenlândia aproximadamente 4 mil anos atrás e constituiu a primeira cultura do Novo Mundo Ártico, chamada Saqqaq. A descrição detalhada desse indivíduo ocorreu graças a um tufo de pelos, que permitiu, pela primeira vez na ciência, sequenciar o genoma de um ancestral do homem. A descoberta, liderada pelo biólogo dinamarquês Eske Willerslev, foi publicada ontem pela revista especializada Nature e promete revolucionar o estudo de povos extintos. (Paloma Oliveto in CB online) __________________________________________
Reportagem de Rodrigo Craveiro
Fonte: Correio Braziliense online, 11/02/2010
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