Mauro Santayana*
O processo sucessório deste ano é o mais complicado de todos os registrados na história eleitoral brasileira, desde a redemocratização de 1946. A razão é simples: todas as articulações se concentraram em São Paulo, sem que as forças políticas regionais fossem ouvidas. O presidente da República não é rigorosamente um político de São Paulo, embora ali tenha sido menino e aprendido a viver. Sua sensibilidade pelas questões nacionais o fez afastar-se do PT paulista, na escolha de sua candidata, embora tampouco tivesse ouvido todas as bases regionais de seu partido e dos aliados que o apoiam.
Decidiram os tucanos de São Paulo que só ganharia as eleições de outubro, e serviria ao Brasil, uma chapa que restaurasse, com o vigor da modernidade, a aliança entre Minas e São Paulo, rompida em 1930 pelos fatos conhecidos. Tendo em vista a pujança econômica do grande estado, concluíram que a cabeça de chapa caberia ao governador José Serra, e a segunda posição ao governador de Minas. Não meditaram que essa chapa repetiria a de 1926, em que São Paulo apresentou o senador Washington Luís (seu governador até 1924) como candidato à Presidência, com o apoio decisivo de Minas, e o mineiro Fernando de Mello Vianna, como vice. Os dois não chegaram ao fim do mandato: três semanas antes, em 24 de outubro, foram depostos pela Revolução de 30.
Não entendem alguns analistas políticos que as razões de Minas não se apequenam no provincianismo. A recusa de seu governador em aceitar a posição que lhe está sendo oferecida vai além do orgulho natural do político com a popularidade que alcançou em um dos cargos executivos mais emblemáticos na História do Brasil, em dois mandatos seguidos. Há, no entanto – e essas, sim, bem maiores – as razões essenciais de Minas.
Desde seus primeiros momentos, os mineiros têm, na manifestação de suas ideias e nos atos concretos, lutado pela descentralização geográfica do poder e a construção de sistema federativo eficiente e justo. A primeira reivindicação de autonomia regional foi dos Emboabas e a primeira reivindicação federalista, dos inconfidentes. É interessante repetir que os mineiros sempre manifestaram sua simpatia com os movimentos descentralizadores, embora contribuísse com sua ação, a fim de evitar a fragmentação do país. Foi assim que ajudou a pacificação do Sul, ao contribuir com os esforços de conciliação dos Farrapos com o governo do Império. Mas, quando o jovem imperador Pedro II, mal aconselhado pelos seus áulicos, decidiu dissolver a Câmara, a fim de favorecer a renovação de acordo comercial com a Inglaterra, lesivo ao Brasil, os mineiros – unidos aos paulistas de Feijó e Tobias de Aguiar – levantaram-se em armas, em 1842.
Eles demonstraram, mais tarde, e de forma efetiva, esse compromisso com a brasilidade, na política de integração nacional, com Juscelino. A Sudene – depois desvirtuada durante o governo militar – constituiu uma iniciativa importante de nossa história, a fim de redimir a parcela mais injustiçada da nacionalidade.
Tancredo estava convencido da necessidade de uma cruzada nacional para a integração política, social e cultural do país, e isso só se realizaria mediante novo e sólido pacto federativo. Com o estadista mineiro, há 25 anos, sob a aclamação das ruas, os brasileiros esperavam realizar esse projeto e construir uma nação justa para com os cidadãos e para com as regiões brasileiras. Eles imaginavam possível obter a confiança do povo a fim de retomar o projeto nacional iniciado por Vargas e continuado por Juscelino, sem descuidar a real autonomia federativa dos estados. Agora, com Aécio, os mineiros voltaram a crer que isso será possível, mas a oportunidade lhes está sendo negada. Aécio, com o respeito e amizade que tem pelo governador José Serra, provavelmente dirá mais uma vez “não” à irritante pressão dos tucanos paulistas para que seja candidato à Vice-Presidência.
Os mineiros se encontram profundamente magoados com a forma com que trataram seu governador nestes meses. Dificilmente entenderiam a improvável capitulação de Aécio aos ucasses paulistas. Ele só pedira a oportunidade de o Brasil ser ouvido, e que o PSDB acatasse essa vontade.
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*Jornalista. Analista político.
Fonte; JB online, 24/02/2010
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