sábado, 1 de maio de 2010

Origens

NILSON SOUZA
Acho que isso acontece com todo mundo. Um dia você olha uma foto dos seus avós, ou dos seus bisavós, e sente vontade de ir atrás deles. Pensa: estes velhos que me olham de algum lugar do passado tiveram a sua história de vida e seria muito legal conhecê-la. Como a máquina do tempo não tem marcha a ré, a alternativa é investigar com familiares mais antigos, pesquisar registros de nascimentos, casamentos e passamentos, ou, no caso dos descendentes de estrangeiros, que somos a maioria, tentar refazer o caminho dos imigrantes que ajudaram a povoar este país.

Com a informatização do mundo, as fontes de pesquisa se multiplicaram e possibilitaram a formação de verdadeiras florestas de árvores genealógicas. Atualmente, é bem fácil pegar o sobrenome da família e investigar por onde andaram e o que fizeram os seus parentes mais remotos. Se você for um pesquisador obsessivo, talvez possa chegar ao Velho Testamento e encontrar por lá algum tio-tetravô com 969 anos, como o célebre Matusalém.

Mas se você tem um sobrenome popular como o meu, a tarefa se torna um pouco mais complexa. Nós, da turma do S (souzas, silvas e santos), tanto podemos ter parentesco com os senhores que mandavam no país há dois ou três séculos quanto com os escravos que adotavam os seus sobrenomes. O consolo é que, segundo os especialistas, basta voltar 30 ou 40 gerações para se concluir que todos os brasileiros são contraparentes.

Sei de gente que investiga as vidas passadas de seus ascendentes na expectativa de encontrar traços de nobreza na família. Por isso também é próspera a indústria dos brasões, que associa símbolos medievais a sobrenomes. Ainda movido pela curiosidade, consultei alguns catálogos de heráldica e descobri que os souzas geralmente são representados por um escudo vermelho, com uma caderna de crescentes de prata. Caderna, segundo o Aurelião, é um reunião de quatro peças semelhantes num escudo. Até gostei das minhas luas prateadas, mas, sinceramente e com todo o respeito a quem investe nisso, não senti vontade de pendurar uma placa daquelas na parede do meu escritório.

Prefiro reservar o espaço para a fotografia dos meus bisavós maternos, que é a minha referência parental mais antiga. Sentados diante de uma cerca feita de taquaras e vestidos com roupas simples da lida doméstica, um velho de barbas brancas e uma senhora de rosto enrugado me olham com familiar serenidade, na qual traduzo inquestionável convite para matear com o passado.
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Fonte: ZH online, 01/05/2010

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