segunda-feira, 19 de julho de 2010

Avaliações de desempenho são cínicas e criam paranoia

Lucy Kellaway*


Recentemente, um e-mail circulou pela redação solicitando sugestões sobre como melhorar nosso sistema de avaliação de desempenho. Minha sugestão é muito fácil e barata: livrar-se de tudo e substituir por nada.

Normalmente, quando tenho alguma ideia brilhante sobre como o "Financial Times" pode ser melhor administrado, eu a proponho em particular. Não se deve lavar a roupa suja em público. Mesmo assim, quando o assunto é avaliação, as roupas de todas as outras companhias têm as mesmas manchas de sujeira que a nossa e, portanto, parece não ser vergonha nenhuma sugerir uma excursão em massa para a lavanderia.

Ao longo dos últimos 30 anos, fui avaliada umas três dezenas de vezes ? como bancária, jornalista e diretora. Sobrevivi a essa loucura da busca por fórmulas complicadas. Também sobrevivi ao costume informal em que as avaliações são chamadas de "career chats" (discussões de carreira), onde um clima artificial de igualdade prevalece. Fiz avaliações em mesas, sofás e até mesmo em refeições.

Mas nunca aprendi nada a meu respeito como resultado disso, nem estabeleci nenhuma meta posteriormente cumprida. Em vez disso, sempre tenho a sensação de que estou participando de um jogo de charadas, com a desvantagem de não existir uma resposta a ser descoberta e de não ser nem um pouco divertido. A norma é uma hora angustiante de conversa durante a qual você é forçado a engolir uma mistura indigesta de elogios e críticas relacionados a eventos acontecidos há muito tempo, que o deixa desmotivado e confuso com a pergunta mais básica: estou fazendo um bom trabalho? O resultado é arquivado, fazendo você se sentir meio paranoico, embora saiba quanta atenção será dada a ele: nenhuma.

Pelo menos eu tive que sofrer com apenas um lado do processo. Eu nunca - graças a Deus - tive que avaliar ninguém, o que deve ser ainda mais cansativo. Isso porque você precisa realizar a mesma operação com cada subordinado, permitindo de uma maneira desgastante que as pessoas acreditem que estão se saindo mais ou menos bem, uma vez que é muito difícil dizer sem rodeios que eles não estão se saindo bem.

Tenho um amiga que trabalha em uma empresa que passa um mês inteiro todos os anos avaliando sua equipe. Ela diz que o sistema foi "melhorado", de modo que ela não precisa mais classificar as pessoas em "realizadores excepcionais", "bons realizadores" e assim por diante. Em vez disso, ela analisa uma lista de atributos misteriosos - como "domínio de alavancagem" e "inovações holísticas" -, escolhendo três pontos fortes e uma necessidade de desenvolvimento (ou fraqueza, como se conhecia antes) para cada pessoa. Ela admite que esse sistema é uma idiotice completa. Mas quando sugiro que seja abandonado, ela parece chocada. "Fora de cogitação", responde. "Isso seria interpretado como se nós não ligássemos para o desenvolvimento de nosso pessoal."

Não por todo mundo, ao que parece. Recentemente, Samuel Culbert, professor de uma faculdade de administração da Califórnia, disse em uma estação de rádio americana que todos os sistemas de avaliação são uma baboseira completa. Ele acredita ainda menos neles do que eu. Eles são uma volta aos antigos e terríveis dias da administração por objetivo, disse, e continuam existindo somente porque permitem a administradores perversos controlar os funcionários e porque os gerentes de recursos humanos são como a KGB quando o assunto é acumular informações.

A alternativa de Culbert, que ele descreve em seu novo livro "Get Rid of the Performance Review" (Livre-se da análise de desempenho), é que chefes e subordinados deveriam ter conversas regulares e em condições de igualdade, em que diriam coisas como: "O que vocês precisam que eu faça? O que precisamos produzir juntos". Esta é uma ideia fantástica. O único problema é que ela não tem relação com o mundo como o conheço. Administradores não falam ou pensam desse jeito.

A coisa mais sinistra a respeito do sistema atual de avaliação de desempenho é que ele faz com que os administradores se iludam, pensando que estão gerenciando seu pessoal. Com o fim das avaliações, pouparíamos tempo e energia e as duas únicas coisas perdidas seriam o cinismo e a paranoia.
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*Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times". Sua coluna é publicada às segundas-feiras na editoria de Carreira
Fonte: Valor Econômico online, 19/07/2010

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