Propriedade intelectual:
Indústrias de agroquímicos,
de alimentos e ONGs questionam patente
para vegetais e movimenta a UE
O brócolis, ou pelo menos uma de suas muitas variedades, agora é o prato principal em uma disputa que poderia ter repercussões significativas para as indústrias de alimentos, de agroquímicos e agrícola da Europa e de todo o mundo.
A questão é determinar se é permitido, ou deveria ser, patentear um vegetal. De acordo com uma diretriz da União Europeia de 1998 sobre a proteção de inovações biotecnológicas, não é permitido patentear processos biológicos na reprodução de animais e plantas. Se for demonstrado, no entanto, um novo desenvolvimento técnico na produção de um vegetal, a Agência Europeia de Patentes pode conceder a patente desse desenvolvimento específico.
O problema, portanto, resume-se a determinar se um novo sistema de produção é um processo biológico convencional ou um tecnológico patenteável. É esse princípio que está sendo colocado à prova atualmente em dois casos separados em avaliação pelo conselho de apelações da agência.
O primeiro caso envolve uma patente concedida em 2002 à empresa britânica Plant Bioscience, que desenvolveu um método para aperfeiçoar as propriedades anticancerígenas do brócolis - vegetal há muito conhecido por suas qualidades benéficas à saúde, servindo para prevenir tanto doenças cardíacas como o câncer, desde que não fervido por muito tempo.
A patente da empresa foi contestada pela Syngenta, multinacional agroquímica suíça, e pela Limagrain, uma cooperativa francesa de sementes. Elas argumentam que a patente do brócolis deveria ser revogada, já que basicamente envolve um processo biológico e, assim, não deveria ser patenteável.
O outro caso sob avaliação na agência envolve um método, desenvolvido pelo Ministério de Agricultura israelense, de produzir tomates com baixo conteúdo de água, o que os torna mais adequados para a produção de ketchup. O caso foi aberto após uma queixa da Unilever, uma grande produtora de ketchup, contra a patente israelense dos tomates.
A agência deverá dar seu veredicto sobre ambos os ainda neste ano. Mas as audiências preliminares na sede da agência já provocaram, na semana passada, polêmicas calorosas e não apenas sobre a confirmação ou revogação dessas duas patentes. Políticos, associações de agricultores, o Greenpeace e outras organizações não governamentais aproveitaram esses dois casos para questionar o princípio básico da concessão de patentes para vegetais.
O argumento desse grupo é que se as atuais patentes de brócolis e tomates forem mantidas, permitindo-se a concessão para os vegetais em geral, haverá consequências negativas para consumidores e produtores independentes. Eles acreditam que tais patentes criariam uma concentração ainda maior do mercado agrícola e de alimentos, elevando preços.
Um advogado do Greenpeace advertiu que se a agência confirmar as patentes dos tomates e brócolis estaria abrindo as "comportas", já que há milhares de pedidos na fila por patentes sobre a produção de vegetais e animais.
À primeira vista, pareceria um pouco estranho ver esses grupos de pressão política e pública aliando forças com multinacionais. Mas não é bem assim, tendo em vista que seus motivos para contestar as patentes do tomate e do brócolis são radicalmente diferentes.
As ONGs e os grupos de agricultores independentes suspeitam que as multinacionais usam os casos não para revogar as patentes, mas para fortalecer o atual sistema. Em outras palavras, se a agência confirmar as patentes, ficará mais fácil para essas multinacionais conseguir uma proteção similar para suas sementes e outros processos biológicos. A ONGs avisam que confirmar as patentes ameaça estender ainda mais o controle das empresas nos setores agrícola e de alimentos.
A agência sustenta que isso não é seu problema. Insiste que seu papel é somente examinar se a patente envolve um novo desenvolvimento técnico ou não. A agência sustenta não estar autorizada a avaliar implicações sociais, econômicas ou ecológicas - essa tarefa cabe a parlamentares e autoridades reguladoras. É por isso que as patentes dos brócolis e tomates agora passaram a aparecer no radar político europeu.
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Por Paul Betts, Financial Times
Fonte: Valor Econômico online, 26/07/2010
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