quinta-feira, 29 de julho de 2010

''O destino do homem não está escrito em uma molécula''


"A existência de uma mutação do DNA nos faz pensar
em algo escrito dentro de nós, de inevitável.
Mas, de fato, não é assim",
explica Francesco Cavalli Sforza,
filósofo e divulgador do campo da genética.
 "A nossa vida é feita daquilo que comemos, bebemos, respiramos.
Falar de 'risco genético' certamente não equivale
 a uma condenação".


O fato de ver a própria ciência como presa do "business" não incomoda um especialista de genética?
É um efeito colateral indesejado, mas nada imprevisto. A presença de possíveis fraudes não anula o que a genética está fazendo e fará de bom pela saúde do homem. Há alguns anos, um pesquisador inglês que se chama Bryan Sykes escreveu um livro no meio do caminho entre ciência e romance. Intitulava-se "Le sette figlie di Eva" [As sete filhas de Eva] e imaginava outros muitos tipos de mulheres que viveram na Europa entre 10 e 12 mil anos atrás, dos quais descenderiam todas as europeias. O sucesso do livro levou ao nascimento de um site que prometia, por meio de um teste de DNA, estabelecer quais das sete Evas era a sua própria progenitora. Estávamos, obviamente, nos limites da fraude, mas os organizadores decidiram pelo menos devolver os lucros para a pesquisa científica universitária. O fim, desta vez, foi nobre pelo menos.

Mas na Internet encontra-se de tudo, de testes para encontrar o namorado certo até aqueles que indicam a uma criança em qual esporte ele se dará bem. Não se corre o risco de exagerar?
Ouvi que os sites para a pesquisa dos próprios antepassados são o terceiro mais frequentado da Internet, depois dos de pornografia e de jogos de azar. Com relação à genealogia e outras bizarrices, o DNA, com efeito, sabe dizer ainda pouca coisa de científico. Mas a minha convicção é que essa molécula tem, no fundo, um intuito totalmente seu. Lembro o caso de William Shockley, vencedor do Nobel de física de 1956 pela invenção do transistor. Ele propôs um banco de sêmen dos prêmios Nobéis e cientistas intelectualmente superdotados. Mas quando uma mulher aceitou ser fecundada por ele, no contrato, surgiram divisões insanáveis. Shockley recusou, de fato, assumir o menino em caso de nascer com deficiências. Sinal de que, talvez, nem ele acreditava nos milagres do DNA.

Várias teorias sustentam que, na escolha do parceiro, somos inconscientemente guiados pelas suas características genéticas.
Acredito que seja verdade até certo ponto. Ainda hoje, assim como nas sociedades dos primeiros caçadores e agricultores, escolhemos o nosso parceiro em um raio de dois a quatro quilômetros de onde vivemos. As exigências logísticas parecem dominar sobre todo o resto, tanto que alguém comentou: "O cupido tem as asas curtas".

E no que se refere à previsão das doenças por meio dos testes genéticos?
Curar doenças curando os genes é uma promessa extraordinária, mas ainda é uma promessa. Para torná-la mais concreta, será necessário muito tempo, e isso foi verdade para todos os grandes passos da ciência. No caso dos testes de DNA, encontrar um risco para uma doença pode até ter efeitos positivos, estimulando as pessoas a cuidar mais de sua própria saúde e eliminar os comportamentos incorretos. Quando as doenças têm a sua origem em uma causa hereditária forte, de fato, elas também nunca prescindem totalmente dos fatores ambientais ou da história pessoal de um indivíduo. Nenhum homem é filho só dos seus genes. Senão, teriam razão aquelas pessoas que gastam 60 mil dólares para congelar seu próprio DNA à espera de que as técnicas da clonagem sejam tão perfeitas que permitam renascer uma segunda vez.
________________________
A entrevista é de Elena Dusi, publicada no jornal La Repubblica, 28-07-2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Fonte: IHU online, 29/07/2010

Nenhum comentário:

Postar um comentário