Adriana Brondani*
Eclipse, a terceira parte da saga Crepúsculo, bate recordes e consagra o significado que essas criaturas entre a vida e a morte têm para a nova geração. Os vampiros de hoje representam a personificação da beleza e juventude eternas e do amor que nunca morre. No início, eram repulsivos e marcados pelo odor fétido da decomposição. Não tinham aspirações nem sentimentos, só desejo pelo sangue para perpetuar sua existência, embora já carregassem a característica que mais se relaciona ao seu sucesso: o dom de burlar a morte. Hoje, eles são como a gente e partilham conosco a capacidade de amar e o desejo de se esquivar da morte.
A real ameaça da perda da juventude e da própria vida é uma sensação muito perturbadora. Afinal, temos uma genética que busca a preservação da vida. No nível molecular, protegemos nosso DNA contra danos que podem acelerar o destino final. Paradoxalmente, sabemos que temos prazo de validade. Nossas células nascem, multiplicam-se, param de se duplicar e envelhecem. Um tecido jovem se multiplica muitas vezes, enquanto a mesma célula, vinda de um adulto de 80 anos, sofre um número muito menor de duplicações. Conclusão: vivemos em contagem regressiva, durante a qual nossos próprios tecidos vão se esgotando.
Até o oxigênio ajuda a envelhecer. Por causa dele, produzimos radicais livres que danificam nossas estruturas biológicas. O bom é que fazer exercícios e ter uma alimentação rica em frutas e hortaliças melhora nossos sistemas de remoção dessas moléculas e retarda o envelhecimento. Ainda assim, nada se compara à vida eterna dos vampiros... Aliás, na vida real, a “imortalidade” só é encontrada em células indesejadas – as células tumorais, que de tão alteradas não morrem facilmente.
Somos seres finitos e vivemos com os dramas que nossa existência impõe. Sem a pressão do fim, a vida não poderia ser mais tranquila? Não temos essa resposta, assim como não entendemos a morte. Reside aí o sucesso dos vampiros, no simples desejo inconsciente de experimentar – ainda que nos livros ou filmes – o mundo dos mortos-vivos.
O enredo, mistério e desfecho da trama Crepúsculo seduzem. No entanto, o desafio de prolongar a vida com a beleza da juventude é o cerne da questão. Edward deseja Bella, mas sabe protegê-la, inclusive dele mesmo. Conhece o mundo, porque está nele há décadas e não precisou morrer para ganhar experiência. Mora em uma linda casa, dirige carros e, ainda, pode proporcionar a Bella o que ela mais ambiciona: juventude eterna e paixão sem fim. O coração de Edward não bate e sua pele é fria – mas um jovem com tantas qualidades não merece ser descrito como um príncipe das trevas. Para as adolescentes de hoje, ele é um verdadeiro príncipe encantado.
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*Professora de Ensino Superior e pós-graduação e produtora de conteúdo científico para jovens
Fonte: ZH online, 22/07/2010
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