Para o professor Mokhtar Ben Barka, professor de
Ciências Políticas
especializado em Estados Unidos
e Oriente Médio, Barack Obama não teria
coragem de deixar de proteger Israel
Para Mokhtar Ben Barka, professor de Ciências
Políticas especializado em Estados Unidos e Oriente Médio na
Universidade de Valenciennes, na França, o elo entre os EUA e Israel é
antes de tudo religioso. “Escolhidos de Deus”, os americanos acreditam
que “amar Israel é obedecer à vontade de Deus”. Como seus predecessores,
Barack Obama não teria coragem de deixar de proteger Israel.
CartaCapital: O
senhor costuma dizer que o “fator religioso” é mais forte nos Estados
Unidos do que em outros países democráticos. De que forma a
religiosidade americana faz de Israel um aliado?
Mokhtar Ben Barka: O
“fator religioso” tem enorme impacto nos EUA. Essa religiosidade é
histórica, remonta ao século XVII, quando judeus começam a ir aos
Estados Unidos. É conectada à certeza de que eles, os americanos, foram
os escolhidos de Deus, como dita a Bíblia. Nasce então nos americanos a
certeza de que eles vivem na Nova Jerusalém. Amar Israel, especialmente
para os evangélicos, os protestantes conservadores, faz parte da fé
cristã. De fato, você não pode ser cristão se não amar Israel. Amar a
Grande Israel, aquela de Abraão, como na Bíblia, é obedecer à vontade de
Deus. Por isso, em 1948, sob a presidência de Harry Truman, os Estados
Unidos foram o primeiro país a ratificar Israel, como novo Estado. A
criação de Israel passa a ser uma profecia cumprida. Israel torna-se o
principal aliado dos EUA. Os evangélicos, inclusive aqueles
fundamentalisas, passam ainda a ter maior influência na política
exterior dos EUA sob George W. Bush.
CC: E o lobby judeu?
MBB: É fortíssimo, principalmente nos EUA. Lobistas judeus têm muita influência sobre os congressistas americanos.
CC: A mídia
israelense critica John Kerry, o qual busca mediadores para o
cessar-fogo na Turquia e no Catar, não no Egito. Pela primeira vez,
faria sentido o comportamento do secretário de Estado?
MBB: Os EUA encontram-se em uma posição bastante desconfortável. De
fato, a Turquia é uma potência emergente, um país respeitado no mundo
árabe. Os cataris, embora dominados pelos EUA, podem negociar com o
Hamas, considerado um movimento terrorista por americanos e europeus.
Esses países poderiam formular um tratado de paz favorável também para
Gaza. Por sua vez, o Egito, que tirou do poder a Irmandade Muçulmana, um
braço do Hamas, está mais preocupado em favorecer Israel.
CC: Pelo fato
de Obama ter raízes na África muçulmana, ele não poderia, como se
pensava quando foi eleito pela primeira vez, posicionar-se de forma mais
equilibrada no Oriente Médio do que seus predecessores?
MBB: Seria a
primeira vez na história. Nenhum presidente americano tem coragem para
agir de tal modo. Uma posição equilibrada no Oriente Médio marcaria o
fim da carreira de Obama, e com repercussões graves para o Partido
Democrata.
CC: Os EUA
foram o único país a votar na semana passada contra uma resolução do
Conselho de Direitos Humanos da ONU para fomar uma comissão
internacional chamada a investigar os ataques israelenses contra a
Palestina. Aquele voto, dado por um país que busca o cessar-fogo, não
lhe parece contraditório?
MBB: Voltamos à
herança religiosa dos EUA, ao elo com Israel. É impensável para
Washington se opor a Israel. Obama tenta satisfazer ambos os lados. Fala
em cessar-fogo para ajudar Gaza, vítima de um massacre, mas vota contra
uma comissão de observadores da ONU para averiguar se os ataques de
Israel fogem às normas do direito internacional.
CC: No mundo
árabe, com seus 19 países, há diferenças enormes entre eles. Mas, de
forma geral, até que ponto os árabes apoiam a Palestina?
MBB: É um tema
importante para a vasta maioria. No entanto, países em diferentes
regiões reagem de maneiras diferentes. As monarquias conservadoras do
Golfo Pérsico não querem se envolver no conflito, embora possam
lamentá-lo. Já no Magrebe é intenso o apoio aos palestinos. A Tunísia,
por exemplo, está a enviar medicamentos, mantimentos e roupas para Gaza.
De todo modo, apesar de simpatizar com os palestinos, nem todos os
governos árabes concordam com a ideologia do Hamas.
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Reportagem por Gianni Carta
Fonte: Carta Capital online, 03/08/2014
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