Luiz Felipe Pondé*
O budismo light vai bem com vinho branco no calor. Nas redes sociais, a religião combina com Coca Zero
Por que a religião não é mais uma saída? Afirmei há algumas semanas
nesta coluna ("O Impasse Conservador", de 11 de agosto) que a religião
não era mais saída. Muitos leitores me perguntaram o que eu queria dizer
com isso.
No contexto do pensamento conservador é muito comum associar tradições
religiosas à defesa do hábito como instrumento contra os excessos do
"racionalismo político" herdeiro da Revolução Francesa e sua "engenharia
social".
Muitos conservadores (mas, evidentemente, não todos) são religiosos ou
defendem uma adesão religiosa de alguma forma. Entendem que a vida
pautada por alguma tradição religiosa responde a uma necessidade
profunda do ser humano e que, portanto, o anticlericalismo iluminista
francês atrapalha o homem quando o faz pensar que a religião seria
atraso de vida ou coisa de gente estúpida ou ignorante.
Voltaire, por exemplo, típico iluminista do século 18 francês, via a
religião como uma superstição das trevas. A crítica de Voltaire se
aplicaria bem ao caso do Estado Islâmico no Iraque e seus horrores como
cortar cabeças e clitóris.
Sei que muitas pessoas inteligentes são religiosas e que não se pode
afirmar definitivamente nada sobre a existência de figuras como o Deus
israelita, que o cristianismo abraçou na figura de Cristo. Vejo muitas
das tradições religiosas do mundo como grandes exemplos de sabedoria.
Nem tudo é o Estado Islâmico em religião.
Como dizia Chesterton, autor inglês do início do século 20, não há
problema em deixar de acreditar em Deus; o problema é que normalmente
passa-se a acreditar em qualquer bobagem como história, política,
ciência, ou, pior, em si mesmo, como forma de salvação. Eu acho que não
há salvação para o homem.
Existe também a literatura mística que descreve experiências diretas de
Deus e que é marcada por grandes transformações na vida dessas pessoas,
muitas vezes de modo enriquecedor. Sou um leitor apaixonado dessa
tradição.
Mas, então, por que digo que a religião não é saída? Antes de tudo para
mim, pessoalmente. Não nasci com o órgão da fé, como dizia o filósofo
Cioran no século 20. Mas, de modo mais amplo, entendo que as religiões
no mundo contemporâneo ou se acomodam aos ditames da sociedade de
mercado e viram mais ou menos produtos dela (e acabam ficando meio
inócuas), ou entram em choque com o mundo contemporâneo e caem na
tentação fundamentalista.
Existem tipos de religião. Um deles é a "nova era", forma de
espiritualidade ao portador, com alto poder de consumo e baixíssimo
comprometimento, do tipo "budismo light". Vai bem com vinho branco no
calor. Também há o tipo de religião nas redes sociais --vai bem com Coca
Zero.
Outro é a adesão "dura", que muitos chamam de fundamentalismos. Podem
ter viés político, como no Oriente Médio, ou os católicos comunistas da
América Latina (que reclamam do capitalismo e viram MST), ou moral, como
no caso dos evangélicos. Ou mesmo os católicos "praticantes".
Há também os sensíveis e cultos, que podem deixar qualquer ateu chocado
com como são mais inteligentes do que os ateus militantes (um tipo
basicamente chato).
Há também os que creem em "transes", do kardecismo doutrinário, meio sem
graça, aos cultos afro-brasileiros, mais interessantes e "coloridos".
Claro, há também os conversos às religiões orientais, que, na maioria
das vezes, têm baixo comprometimento ou viram monges de adesão "dura".
Há também os que entendem que as religiões falam todas a mesma coisa:
amor, generosidade, compreensão. A ideia é boa, mas não é verdade. Na
prática, as religiões não falam a mesma coisa. Por exemplo, um judeu e
um cristão podem concordar sobre como a guerra é ruim, mas é melhor que
não discutam sobre se Jesus é ou não o messias.
No mundo contemporâneo, uma religião, para ser bem-comportada, tem que
se submeter à lógica do Estado democrático laico, como diria John Stuart
Mill no início do século 19. Por isso, deve "baixar a bola" e entrar na
competição do "mercado de sentido da vida" e jamais questionar a
sociedade laica. Se o fizer, cai na tentação fundamentalista. Um beco
sem saída.
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* Filósofo. Escritor. Prof. Universitário.
ponde.folha@uol.com.brFonte: Folha online, 25/08/2014
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Pondé como psiquiatra é excelente filosofo, no tocante as religiões que pertence as sociedades de mercado, essas religiões são as "religiões de resultado", exemplo se voce doar tanto ou entrar na minha religião- voce tera tudo mesmo e muito mais. Pondé numa palestra disse que pessoas comparam e dizem que a sua religião é melhor que a outra, nesse nivel essas pessoas dizem que comparam a sua religião, de que é a mesma coisa que o seu sabonete é melhor que do outro. Haja saco para aguentar tanta agressão ao mundo espiritual
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