"Uma análise racional da obrigação moral e de suas consequências é um
guia mais efetivo para planejar
o futuro do que a pancada da empatia."
- Paul Bloom
Quando adolescente, o psicólogo canadense Paul Bloom
trabalhou extensivamente com crianças autistas. Ao se graduar em
psicologia pela Universidade de McGill, ele esperava se tornar um
psicólogo clínico de crianças. Seus interesses mudaram quando conheceu o
professor John Macnamara, que havia estudado a interface entre
psicologia e filosofia. Bloom trabalhou com Macnamara como graduando e
se especializou em desenvolvimento cognitivo e aquisição da linguagem no
MIT.
Como professor – primeiro, na Universidade do Arizona e, depois, em
Yale – Bloom desenvolveu uma teoria da aprendizagem das palavras que
inclui, em seu núcleo, a cognição social e a teoria da mente. A teoria
da mente é uma competência cognitiva específica que reconhece os outros
como agentes intencionais, capazes de interpretar as mentes, seus
desejos e crenças.
Diretamente dependente da linguagem, é esta capacidade que nos permite avaliar nosso estado mental e o das pessoas ao nosso redor - resultando em empatia ou julgamento - mesmo que tais observações venham de sinais indiretos. A grande questão da ciência cognitiva é compreender como aprendemos a formar estas crenças e quando esta capacidade surge na evolução humana. Para solucionar este desafio, Bloom e seus estudantes começaram a explorar uma série de desafios relacionados à natureza, à arte, ao prazer, à religião e à moral, descobrindo que alguns valores tidos como cruciais para uma humanidade mais igualitária podem ser justamente aqueles que nos fazem agir de forma egoísta - como a empatia, quando destituída de um sentido racional de justiça.
Ex-presidente da Sociedade pela Filosofia e Psicologia (SPP) e coeditor do periódico Behavioral and Brain Sciences, um dos mais importantes na área, Paul Bloom escreve sobre o papel da empatia e da razão no progresso moral da sociedade. Para Bloom, a empatia não tem valor absoluto. Colocamos nossas famílias acima dos outros justamente por sentirmos mais empatia por aqueles mais próximos. Ainda, Bloom argumenta ser impossível desenvolver empatia por sete bilhões de estranhos no planeta, refutando a ideia de que precisamos ver a humanidade como uma família. Para ele, o que devemos fazer é ensinar o valor universal da vida, seguindo a linha de Steven Pinker, que defende que faculdades mentais mais complexas - como razão e justiça - são mais eficazes como um guia para o futuro. Leia abaixo:
PAUL BLOOM | As pesquisas atuais sobre empatia estão florescendo, enquanto a neurociência cognitiva passa pelo que alguns chamam de “revolução afetiva”. Existe um crescente foco nas emoções, especialmente naquelas que envolvem pensamento e ação morais. Aprendemos, por exemplo, que alguns sistemas neurais ativos quando sentimos dor são acionados quando observamos o sofrimento alheio. Outros pesquisadores estão explorando como a empatia emerge em chimpanzés e noutros primatas, bem como se desenvolve em crianças e quais circunstâncias são necessárias para dispará-la.
Este interesse não é apenas teórico. Se conseguirmos compreender como
funciona a empatia, poderemos produzir mais empatia. Alguns indivíduos
são empáticos a apoios políticos ou a ideologias religiosas que promovem
crueldade aos seus adversários, enquanto outros são deficientes de
empatia por questões genéticas, pais abusivos, experiências brutais ou
por uma mistura de todos acima. No extremo disso, reside 1% das pessoas
que são clinicamente chamadas de psicopatas. Uma lista padrão da
condição inclui “insensibilidade e falta de empatia”; muitos outros
traços da psicopatia são consequência deste déficit fundamental, como a
falta de culpa e a mentira patológica. Alguns culpam o déficit de
empatia como grande culpado pelo sofrimento no mundo. (...)
“O declínio da violência pode dever algo à expansão da empatia”,
escreveu o psicólogo Steven Pinker, “mas também deve muito a difíceis
faculdades como prudência, razão, justiça, autocontrole, normas e tabus e
formação de direitos humanos.” Uma análise racional da obrigação moral e
de suas consequências é um guia mais efetivo para planejar o futuro do
que a pancada da empatia.
Jeremy Rifkin [autor de The empathic civilization] e outros
têm argumentado, razoavelmente, que o progresso moral envolve expandir
nossa preocupação com a família e com a tribo para toda humanidade. Mas,
é impossível ter empatia com sete bilhões de estranhos ou sentir por um
desconhecido o mesmo que você sente por seu filho, seu amigo ou seu
companheiro. Nossa melhor esperança para o futuro não é pensar na
humanidade como uma família, mas sim apreciar o fato de que, mesmo que
não tenhamos empatia por estranhos distantes, suas vidas têm o mesmo
valor que a vida daqueles que amamos.
Isso não é um chamado para um mundo sem empatia. Uma comunidade de
psicopatas poderia ser suficientemente inteligente para inventar
princípios de solidariedade e de justiça (pesquisas sugerem que
criminosos psicopatas são adeptos de julgamentos morais). O problema com
aqueles vazios de empatia é que, mesmo que reconheçam o que é correto,
eles não possuem motivação para agir em direção a isso. Uma centelha de
sentimentos comunitários é necessária para converter inteligência em
atitude.
Mas, uma centelha pode ser tudo que precisamos. Colocando de lado os
extremos da psicopatia, não há evidência que sugira que pessoas com
menos empatia são piores do que os outros. Simon Baron-Cohen [professor
de Psicopatologia Desenvolvimental em Cambridge] observa que algumas
pessoas que sofrem de autismo ou da síndrome de Asperger, mesmo que
sejam deficientes de empatia, são altamente morais e possuem um forte
desejo de seguir as regras e de assegurar que sejam justamente
aplicadas.
Onde a empatia realmente importa é nos nossos relacionamentos pessoais.
Ninguém quer viver como Thomas Gradgrind – o utilitarista caricato de
Charles Dickens, que ameaça todas as interações, incluindo aquelas com
seus filhos, por questões explicitamente econômicas. Empatia é aquilo
que nos torna humanos; é aquilo que nos torna tanto sujeitos quanto
objetos de preocupação moral. Empatia apenas nos trai quando a levamos
como um guia moral.
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Fonte: http://www.fronteiras.com/canalfronteiras/noticias/?16,262
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