sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Ler sempre!

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Do discurso de Patrick Modiano quando recebeu o Prémio Nobel da Literatura, a 7 de dezembro de 2014, em Estocolmo:

«Sempre acreditei que o poeta e o romancista conferem mistério a seres humanos que parecem submersos pela vida quotidiana, às coisas aparentemente banais, e isso à força de os observar com uma atenção sustentada e de maneira quase hipnótica. Sob o seu olhar, a vida de todos os dias acaba por se envolver de mistério e por tomar uma espécie de fosforescência que não tinha à primeira vista mas que estava oculta em profundidade. O papel do poeta e do romancista, e também do pintor, é revelar o mistério e a fosforescência que se encontram em cada pessoa. 

Penso no meu longínquo primo, o pintor Amedeo Modigliani, cujas telas mais comoventes são aquelas em que ele escolheu para modelos pessoas anónimas, rapazes e raparigas das ruas, serventes, pequenos agricultores, jovens aprendizes. Ele pintou-os com traços precisos que lembram a grande tradição toscana, de Botticelli e dos pintores de Siena do séc. XV. Desta maneira ele deu-lhes - ou melhor, revelou-lhes - toda a graça e a nobreza que existiam neles sob a sua humilde aparência. 

O trabalho do romancista deve ir neste sentido. A sua imaginação, longe de deformar a realidade, deve penetrá-la em profundidade e revelar esta realidade como ela é, com a força dos infravermelhos e ultravioletas para detetar o que se esconde por trás das aparências. E não estarei de longe de acreditar que, no melhor dos casos, o romancista é uma espécie de vidente, e mesmo de visionário. E também um sismógrafo, pronto a registar os movimentos mais impercetíveis.»
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Fonte:  www.snpcultura.org . Citado por  Silvia Guidi
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