quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Minorias são rejeitadas na França, diz consulesa em SP

Alexandra Loras, consulesa da França em São Paulo
O sobrenome Coulibaly, do sequestrador que matou quatro reféns no mercado judeu em Paris na semana passada, remeteu aos parentes de Alexandra Baldeh Loras, 37. "Fiquei rezando para que não fosse um dos meus primos. É um nome comum na África." Não era da família.

Francesa de origem muçulmana e judaica, que vive no Brasil há dois anos como consulesa do país em São Paulo, Alexandra, como todos os seus compatriotas, procura respostas para os atentados em Paris em meio ao luto.

"Um dos terroristas é negro e francês como eu. O que aconteceu na vida dele para se tornar tão violento?", indaga ela, filha de pai de Gâmbia (oeste da África).

Em meio à comoção, ela levanta mais questões: "Por que esses jovens se tornaram loucos assim? Por que caíram no extremismo?".

Formada em ciências políticas e estudiosa do fenômeno da integração, ela assina um blog sobre minorias (www.alexandraloras.com).

A também jornalista afirma que "a França precisa se assumir como nação multicultural e multirracial".

Ela conta ter ouvido e lido nas redes sociais muitas reações violentas: "Animais, selvagens, negro sujo, árabes imundos". "A pátria-mãe francesa parece ter esquecido os 400 anos de escravidão e 300 de colonização", diz.

"E hoje não quer assumir esses filhos. Eu me coloco entre eles. Nos sentimos rejeitados. E me refiro aos africanos, aos árabes, aos asiáticos e aos judeus também."

Segundo ela, quando um filho não tem pai, ele pode ter outro que o acolhe e lhe dá importância. "O 'pai terrorismo' pegou alguns desses filhos e deu o senso de pertencimento a um grupo, espaço, comida e dinheiro. Precisamos tentar resgatá-los."

Para ela, é importante pesquisar sobre esses jovens que vão para a Al Qaeda. "Para saber o que vai pela cabeça deles para trilhar esse lado da escuridão. Do que eles precisam para se sentir parte do povo francês?"

Ela lembra que a integração é possível. Cita que entre os artistas mais amados da França atualmente estão Omar Sy –ator de origem senegalesa que ganhou o César (o Oscar francês) pelo filme "Os Intocáveis" (2011)– e Jamel Debbouze, ator e comediante de origem marroquina (de "Astérix e Obélix "" Missão Cleópatra").

Alexandra fez sua tese de mestrado na prestigiosa Sciences Po –universidade onde se forma a elite política do país– sobre os negros na televisão francesa, onde foi apresentadora por sete anos.

"Na França do poder e na televisão, onde trabalhei nos canais France 3 e TF1, eu era a única negra", afirma.

Ela lembra que o "Charlie Hebdo" é um jornal de esquerda, que sempre publicou charges que podem ser interpretadas como xenófobas, racistas e antissemitas. "Que liberdade de expressão estamos defendendo? Pode-se faltar com respeito a profetas reverenciados por uma comunidade que não tem poder nos meios de comunicação para se expressar?", indaga.
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Reportagem 
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Fonte: Folha online, 13/01/2015

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