sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Empresas contratam mais matemáticos, físicos e estatísticos

Eles traçam prognósticos,
calculam riscos e
ajudam a compor equipes multidisciplinares.

Talvez você ainda não tenha encontrado um matemático, um estatístico ou um físico nos corredores da empresa em que trabalha, mas as chances de que isso venha a ocorrer são crescentes. O mundo corporativo está cada vez mais interessado em profissionais oriundos das ciências exatas, por uma série de fatores. O primeiro, mais óbvio, é que dominar os segredos dos números e saber como processar informações aparentemente desconexas resulta em vantagens competitivas concretas, pois ajuda a compreender melhor a realidade e a fazer prognósticos diante de cenários complexos.

Há também a tendência de diversificar o perfil das equipes, tornando-as multidisciplinares- a formação em exatas contribui para dar metodologia e equilíbrio a decisões que muitas vezes se baseiam muito mais no "feeling" do que na análise ponderada de uma situação. Por fim, surgiu uma motivação mais recente, influência direta da crise financeira global. "Uma das grandes lições aprendidas foi a necessidade de aprimorar a gestão de risco. E os maiores especialistas nessa área vêm das ciências exatas", diz a consultora Renata Dolabella Fabrini, sócia da Fesa.

Abrem-se, assim, excelentes perspectivas nas grandes corporações para quem associa os conhecimentos técnicos das ciências exatas à capacidade de gestão e liderança. Trajetórias como a de Cláudia Santos, 40 anos, principal executiva no Brasil da fabricante de microprocessadores AMD, tendem a se tornar mais comuns. Formada em matemática pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em 1988, ela começou a trabalhar como estagiária na IBM sem grandes pretensões além de uma carreira técnica na área de processamento de dados. "Depois de alguns anos como analista de sistemas, passei para o setor de vendas e, já vislumbrando a perspectiva de uma carreira executiva, fui incorporando outros atributos que me deram um perfil mais generalista", lembra Cláudia. Até que um dia, reconhecida pelas habilidades de liderança e capacidade de relacionamento pessoal, foi convidada a assumir a gerência de vendas.

Após 11 anos na IBM, aceitou um convite da Microsoft para exercer o mesmo cargo. Mais cinco anos e veio a proposta para assumir o comando da AMD, onde lidera uma equipe de 50 pessoas. Curiosamente, seu braço-direito na nova empresa é o diretor de vendas Sérgio Santos. Ele também é matemático, formado pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Um dos obstáculos que Cláudia e outros profissionais oriundos da área de exatas precisam superar para galgar posições mais altas na hierarquia das grandes empresas é o velho estereótipo de que matemáticos, estatísticos, físicos e afins são pessoas fechadas, ensimesmadas e pouco hábeis em relacionamentos interpessoais. Eles seriam pequenos gênios escondidos por trás de óculos de lentes grossas- verdadeiros nerds.

"A maior parte dos meus colegas são pessoas extrovertidas e divertidas, que adoram bater papo e apreciam as coisas boas da vida, como cinema e música", descreve Cláudia. Em compensação, o estereótipo tem também um lado positivo. "Ao topar com o currículo de alguém que vem das ciências exatas, não dá para ignorar o quanto a pessoa tende a ser aplicada e estudiosa, pois aprender o que eles aprendem certamente não é fácil", diz Renata Fabrini, da Fesa, psicóloga por formação.

O maior interesse da iniciativa privada nos melhores cérebros das ciências exatas vem sendo percebido em centros formadores como o Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa), mantido pelo governo federal, cujos programas de pós-graduação são referência no país. "Nossos alunos chegam com o interesse primordial de seguir carreira acadêmica, mas o assédio das empresas aumentou muito nos últimos tempos e nem sempre é possível resistir", diz o professor Luiz Velho, coordenador do Visgraf, o laboratório de computação gráfica. Os convites já não chegam apenas de bancos e instituições financeiras, como era a regra até pouco tempo.

Um dos casos mais recentes entre os egressos do Impa foi o de Marcos Vinícius Rayol Sobreiro, recrutado para ocupar o cargo de gerente de implantação de novas tecnologias da empresa de telefonia Oi. "As companhias perceberam que os matemáticos têm uma contribuição importante a dar no desenvolvimento de novos mercados", diz o professor Velho, pioneiro da computação gráfica no país e ex-integrante da equipe de efeitos especiais da TV Globo.

O que aproxima a academia e as empresas privadas são os projetos que unem ambas as partes em torno de objetivos comuns. Vários dos atuais alunos do Impa, a maior parte deles na faixa entre 25 e 30 anos de idade, já prestam serviços para empresas como freelancers. Embora a maioria mantenha a disposição em seguir carreira acadêmica, alguns não escondem que estão atentos à nova realidade do mercado e não descartam a possibilidade de trabalhar em uma empresa privada. "Faço mestrado justamente para ampliar meu leque de opções profissionais. As empresas querem pessoas capacitadas e eu acredito que quem investe nos estudos levará vantagem no mercado", diz Cristiane Botelho.

Seu colega Leandro Cruz, que acumula o mestrado com uma nova graduação- em ciências da computação-, planeja atuar no promissor setor de tecnologia da informação. Philip Thompson recebeu propostas da iniciativa privada quando concluiu a graduação em engenharia, um ano e meio atrás. "Sempre há cartazes espalhados aqui pelo Impa oferecendo emprego. Minha preferência pela academia é puramente passional, já que eu certamente ganharia mais dinheiro se trabalhasse em uma empresa", reconhece. O colombiano Juan Pablo Gama está de olho num emprego em seu país. "Soube que a companhia de petróleo Ecopetrol está recrutando matemáticos sem experiência profissional", conta.

Quando concluiu o doutorado em física na Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, em 1997, Lourenço Miranda, hoje com 38 anos, estava decidido a se tornar professor. Foi quando um amigo falou sobre o interesse de uma grande empresa por alguém com o perfil dele- era o Banco Santander, que estava à procura de um analista de derivativos. Miranda aceitou fazer uma entrevista no banco e foi imediatamente convidado a assumir o cargo. "Era uma sexta-feira e eu teria que dar a resposta na segunda. Nunca tinha sequer ouvido falar de derivativos. Mas acho que fiquei louco e topei o desafio", lembra.

Ele logo percebeu as grandes diferenças entre o universo acadêmico e o corporativo. "Ao estudar física a gente não aprende a enfrentar um chefe, a lidar com prazos curtos e a buscar metas financeiras", compara. Miranda foi criticado pelos colegas de universidade e chamado de "traidor" da academia. "Hoje, vários deles entram em contato perguntando como fazem para mandar o currículo", brinca.

Em 1999, com apenas dois anos no Santander, Miranda se transferiu para o ABN Amro como principal executivo de modelagem e risco operacional. No banco, montou uma equipe com 20 subordinados. Em 2002, foi transferido para a Holanda com a missão de comandar a área para o mundo inteiro.

Com o dilaceramento do ABN após sua venda, em 2007, o executivo recebeu mais uma proposta irrecusável: trabalhar como consultor da IFC (Corporação Financeira Internacional), braço do Banco Mundial que concede empréstimos, produtos para gestão de riscos e presta consultoria ao setor privado dos países em desenvolvimento.

Baseado em Washington, ele viaja pelo mundo. A entrevista para esta reportagem, inclusive, foi concedida do aeroporto de Dubai, onde Miranda aguardava o voo para o Sri Lanka. "Da academia, eu trouxe como principal bagagem a disposição de aprender e o prazer em conhecer coisas novas. Isso tem feito toda a diferença na minha carreira", diz Miranda.
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Reportagem de Por Maurício Oliveira, para o Valor, de São Paulo
Fonte: http://www.valoronline.com.br/?impresso/carreira/292/6090029/empresas-contratam-mais-matematicos,-fisicos-e-estatisticos

2 comentários:

  1. Como faço para encontrar empresas interessadas em físicos? Nas feiras de estágios das universidades só se encontra vagas para engenheiros, e o que poderia ser útil para um físico acaba sendo só solicitado pelo pessoal de ciências da computação e similares.

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    1. Abel, perdoa-me, mas não saberia responder a tua pergunta. Atualmente resido na França e não sei como isso se passa por aqui. Obrigado por ler o meu blog. Um abraço e como dizem, os franceses: BON COURAGE!

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