segunda-feira, 5 de julho de 2010

Crítica ao Projeto Harvard de Negociação

J. A. Wanderley*

Negociação

Consultor do MVC discorda do Projeto ‘Solução de Problemas’
como uma forma de negociar e cria o seu próprio conceito de Negociação Total

Isaac Newton, o genial físico inglês, quando perguntado sobre o porquê havia percebido o que outros não tinham enxergado, respondeu: “Eu vi mais longe porque subi em ombros de gigantes”. Inegavelmente, o Projeto Harvard representou um marco extremamente relevante no desenvolvimento das teorias e práticas de negociação, que foi a utilização da Solução de Problemas como uma forma de se negociar. Através da Solução de Problemas foi possível, por exemplo, o acordo de Camp David entre o Egito e Israel, acordo que teria sido inalcançável com a utilização das formas tradicionais de negociação. Entretanto, apesar dos seus inúmeros méritos, a abordagem do Projeto Harvard continha vulnerabilidades e sofreu críticas bastante procedentes.

As críticas

De acordo com o Projeto Harvard, existem três formas de se conduzir uma negociação, que são a do negociador durão e de confronto, que negocia com base na Barganha de Propostas Agressiva, a do negociador bonzinho, que tende a conceder continuamente, e a do negociador que age com base na Solução de Problemas.

Uma crítica consistente ao Projeto Harvard é que não foi considerada outra forma de se conduzir uma negociação, que é a da Barganha Suave, que pode ser utilizada com sucesso numa grande quantidade de casos. O que deve ser ressaltado é que o objetivo de qualquer barganha, seja ela agressiva ou suave, é o mesmo: obter o máximo de concessões e, se possível, chegar ao limite do outro negociador. O que diferencia as duas é que na Barganha de Propostas Agressiva não existe a menor preocupação com o relacionamento entre as partes. Assim sendo, tende a provocar ressentimento, raiva e o desejo de vingança, que vai se materializar quando a oportunidade aparecer.

Já na Barganha Suave, além do objetivo de se obter o máximo possível de concessões, também é considerado muito importante manter um ótimo relacionamento com a outra parte. E, ainda mais, dar ao outro negociador a sensação de que levou vantagem e venceu. É em função disto que existe o verdadeiro e o falso Ganha/Ganha.

Outra crítica consistente ao Projeto Harvard é que, embora não reste a menor dúvida de que a Solução de Problemas seja um caminho extremante importante, não são identificadas todas as dificuldades existentes no processo de tomada de decisão e, consequentemente, na solução de problemas. Assim, um estudo conduzido por Paul Nutt, professor da Universidade de Ohio, abrangendo um período de 19 anos com executivos e gerentes de 365 empresas, mostrou que mais de 50% das decisões, de uma forma ou de outra, fracassaram.

Reforçando este estudo há a constatação da demissão ou da aposentadoria forçada de um número razoável de CEOs. Só em 2000, por exemplo, foram cerca de 40 em empresas da lista da Fortune 500, tais como Compaq, Gillette, Hewlett-Packard, Xerox e Motorola. O fato é que embora a Solução de Problemas seja uma forma extremante poderosa e útil de se conduzir uma negociação, também é a mais difícil e, além do mais, não é a melhor e mais adequada para todos os contextos e situações como o Projeto Harvard quer fazer crer.

A Negociação Total

Em função disto, desenvolvi a abordagem que chamo de Negociação Total, que tem como princípio que o sucesso depende das decisões, escolhas e ações do negociador, e que uma decisão é tão boa quanto a melhor alternativa que se conseguiu encontrar. Assim sendo, vejamos três pontos importantes da abordagem adotada em Negociação Total:

1) Existem três formas principais de se conduzir uma negociação: Solução de Problemas, Barganha de Propostas Agressiva e Barganha Suave. Também deve ser ressaltado que os procedimentos do negociador bonzinho ou os do acomodado, que não se empenha muito para chegar ao limite do outro, são maneiras inferiores de se conduzir uma negociação, mas que mesmo assim, podem ser utilizadas como no caso de negociações de menor importância ou quando um valor médio, ou até mesmo o limite, puder ser adotado, em função de uma relação benefício/custo aceitável ou quando a situação exigir uma resposta urgente, em decorrência dos danos provocados pela demora.

2) Nenhuma das formas de negociação se aplica a todos os contextos e situações. Assim sendo, não existe “a melhor forma” de se conduzir uma negociação e o Projeto Harvard se equivoca quando quer estender a Solução de Problemas a todas as situações e contextos.

3) Qualquer uma das formas de negociação pode ser extremamente adequada se utilizada no contexto apropriado. Entretanto, pode ser danosa caso seja utilizada em contextos inadequados. A Barganha de Propostas Agressiva, por exemplo, é utilizada, e com muito êxito, pelos compradores de supermercado. Entretanto, se utilizada nas negociações internas de uma empresa que seja constituída basicamente pelo chamado “trabalhador do conhecimento”, trará como resultados um clima organizacional da pior qualidade, conflitos destrutivos e um Perde/Perde generalizado. Ou seja, jamais será possível se obter a tão desejada sinergia organizacional, que só pode ser alcançada caso as negociações internas sejam conduzidas com base na Solução de Problemas.

A conclusão

Assim sendo, Negociação Total considera que todo negociador que queira ter uma compreensão e um desempenho superior, aos níveis estratégico, tático e operacional, deve ter uma visão global e abrangente de possibilidades e levar em conta todas as formas de se conduzir uma negociação. Mas que é o momento, o contexto e a situação que vão definir a melhor forma a ser utilizada. Portanto, só com competência, inteligência, sabedoria e responsabilidade por suas decisões, escolhas e ações é que um negociador pode chegar a excelência de resultados.
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*J. A. Wanderley (Consultor Sênior do Instituto MVC em Negociação e Excelência de Desempenho, autor do livro Negociação Total, da Editora Gente)
Fonte: HSM Online - 05/07/2010

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