segunda-feira, 19 de julho de 2010

Leitura, escrita e robôs




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Máquinas podem dar aula e até aprender com os alunos

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THE NEW YORK TIMES
Por BENEDICT CAREY
e JOHN MARKOFF
Los Angeles

Em um punhado de laboratórios mundo afora, cientistas da computação estão desenvolvendo robôs capazes de interagir com as pessoas e lhes ensinar coisas simples.

Vários países têm testado máquinas de ensinar nas salas de aula. A Coreia do Sul, conhecida por seu entusiasmo pela tecnologia, está "contratando" centenas de robôs como assistentes educacionais e colegas das crianças, além de experimentar robôs que ensinam inglês.

Até agora, o ensino é muito básico, e os robôs ainda são uma obra em progresso. Mas os modelos mais avançados são totalmente autônomos, guiados por softwares de inteligência artificial, que reconhecem fala e movimento.

Dessa forma, tornam-se interativos a ponto de rivalizar com os humanos em algumas tarefas educacionais. Pesquisadores dizem que o ritmo da inovação é tamanho que essas máquinas devem começar a aprender enquanto ensinam, tornando-se instrutores infinitamente pacientes e altamente capacitados para disciplinas como línguas estrangeiras, ou em terapias repetitivas, usadas para tratar de problemas de desenvolvimento como o autismo.

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Robótica social se converte em agente de aprendizado

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Mas esses avanços já provocam visões distópicas, além de um debate ético habitualmente confinado à ficção científica.

"Preocupa-me que, se as crianças crescerem sendo ensinadas por robôs e enxergando a tecnologia como o instrutor, elas a verão como seu senhor", disse Mitchel Resnick, diretor do grupo "Jardim da Infância Vitalício", ligado ao Laboratório de Mídia do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT).

A maioria dos cientistas da computação diz não ter nem a intenção nem a capacidade de substituir os professores humanos. A grande esperança quanto aos robôs, disse Patricia Kuhl, codiretora do Instituto para o Aprendizado e as Ciências Cerebrais, da Universidade de Washington, "é que, com a tecnologia correta num período crítico do desenvolvimento da criança, eles poderiam suplementar o aprendizado em sala de aula".

Lições de Rubi

"Kenka", diz uma voz infantil. "Ken-ka."

Na Universidade da Califórnia em San Diego (UCSD), um robô chamado Rubi ensina finlandês a um menino de três anos.

O tronco-tela de Rubi está montado sobre um par de sapatos, com um lenço colorido no pescoço e um sorriso fixo.

Ele levanta um tênis branco e diz "kenka", sapato em finlandês, antes de devolvê-lo ao solo. "Sinta; sou um kenka."

Num vídeo que mostra essa aula, o menino pega o tênis, diz "kenka, kenka" e segura o sapato para o robô ver.

O aspecto da maioria dos robôs sociais de hoje não é nem remotamente humano. Alguns falam bem, outros não. Alguns andam sobre duas pernas, outros, sobre rodas. Eles são uma companhia muito curiosa. Um robô da Universidade do Sul da Califórnia usado com crianças autistas segue uma pessoa num cômodo, aproximando-se indiretamente e parando a certa distância, como uma criança cautelosa querendo ser chamada para uma brincadeira.

Os pesquisadores estão notando que Rubi permite que crianças pré-escolares obtenham notas melhores em provas, em comparação a alunos submetidos a aprendizados menos interativos, como gravações.

Resultados preliminares sugerem que esses alunos obtêm "um aprendizado mais ou menos tão bom quanto com um professor humano", disse Javier Movellan, diretor do Laboratório de Percepção de Máquinas da UCSD. "A interação social aparentemente é um componente importantíssimo no aprendizado nessa idade."

Como qualquer aluno novo, Rubi demorou um pouco para encontrar um nicho. As crianças cercaram o robô quando ele chegou. Mas, no fim do dia, dois garotos já haviam arrancado seus braços. Engenheiros reprogramaram Rubi para chorar quando seus braços fossem puxados. Seus coleguinhas rapidamente recuavam diante desse som.

Os pesquisadores da UCSD, do MIT e da Universidade de Joensuu (Finlândia) recolocaram os braços no robô e relataram no ano passado como ele melhorou significativamente o vocabulário de nove crianças pequenas. Após testarem os alunos quanto ao conhecimento de 20 palavras e apresentá-los ao robô, os pesquisadores deixaram que Rubi agisse sozinho. O robô mostrou imagens na sua tela e instruiu as crianças a associarem-nas com as palavras.

Após 12 semanas, o conhecimento das crianças em relação às dez palavras ensinadas por Rubi aumentou significativamente, enquanto o conhecimento sobre as dez palavras do grupo de controle não evoluiu. "O efeito foi relativamente grande, uma redução dos erros em mais de 25%", concluíram os autores.

A robótica social é um ramo da computação voltado para a melhoria da comunicação entre humanos e máquinas. Nos Laboratórios Honda, em Mountain View, na Califórnia, pesquisadores chegaram a um resultado similar com o robô Asimo. Em uma sessão de 20 minutos, a máquina instruiu alunos do ensino básico a arrumar uma mesa, melhorando em cerca de 25% a taxa de acerto, segundo um estudo recente.

Na Universidade do Sul da Califórnia, em Los Angeles, os pesquisadores fizeram o robô Bandit interagir com crianças autistas. Os resultados preliminares, disse David Feil-Seifer, que comandou o estudo, sugerem que as crianças falavam com mais frequência e passavam mais tempo em interação direta quando o robô reagia a elas, em comparação a quando agia aleatoriamente.

Conexões

"Antes de terem linguagem, os bebês prestam atenção àquilo que chamo de zonas quentes da informação", ou seja, aquilo para que o pai ou a mãe estejam olhando, disse Andrew Meltzoff, codiretor do Instituto para o Aprendizado e as Ciências Cerebrais, da Universidade de Washington.

É assim, segundo ele, que o aprendizado começa.

Essa descoberta básica, a ser publicada neste ano, é parte de um campo chamado computação afetiva, que está ajudando os cientistas a descobrir exatamente quais características tornam um robô mais "real".

"Acontece que fazer um robô parecer mais com um humano não lhe gera melhores interações sociais", disse o neurocientista Terrence Sejnowski, da UCSD. Quanto mais humano o aspecto das máquinas, mais horripilantes elas podem parecer.

O que importa, segundo Sejnowski, é o comportamento da máquina. E elementos muito sutis podem fazer uma grande diferença.

O momento da resposta do robô é crucial. Os pesquisadores da UCSD concluíram que, se Rubi reagisse rápido demais a uma expressão ou um comentário da criança, atrapalhava a interação; o mesmo acontecia se demorasse demais. Mas, se o robô reagisse em cerca de 1,5 segundo, criança e máquina entravam numa suave sincronia.

E o ritmo físico é importante também. Em experiências recentes numa creche japonesa, pesquisadores demonstraram que um robô que balança no mesmo ritmo em que uma criança se mexe pode rapidamente estabelecer uma interação até com as mais medrosas crianças autistas.

"A criança começa a notar algo naquele movimento síncrono e se abre", disse Marek Michalowski, da Universidade Carnegie Mellon, da Pensilvânia, que participou dos estudos. Quando isso acontece, disse, "você pode colocar comportamentos sociais em cima da interação, como fazer contato visual ou saber a vez de falar, coisas nas quais essas crianças têm dificuldades".

Um jeito de começar esse processo é fazer uma criança imitar os movimentos de um robô, ou vice-versa. Num estudo ainda em andamento, cientistas da Universidade de Connecticut promovem sessões de terapia para crianças autistas usando um robô francês chamado Nao, um humanoide de 61 cm de altura. O robô, controlado remotamente pelo terapeuta, demonstra golpes de artes marciais e pede que a criança acompanhe; depois, estimula a criança a liderar.

"Adoro robôs, e sei que isso é uma terapia, mas sei lá -acho só divertido", disse Sam, 8, que sofre da síndrome de Asperger.

Essa imitação simples parece construir uma espécie de confiança e aumentar a sociabilidade, disse Anjana Bhat, professora-assistente do Departamento de Educação e coordenadora da experiência. "As interações sociais são muito dependentes de se alguém está em sincronia com você", disse ela. "Se você anda rápido, eles andam rápido; se você vai devagar, eles vão devagar -e logo vocês estão interagindo, e talvez você esteja aprendendo."

A personalidade influi também, em ambos os lados. Os pesquisadores notaram que, quando o professor-robô Asimo é "cooperativo" ("Vou colocar o copo d'água aqui; você acha que consegue me ajudar?"), crianças de 4 a 6 anos se saem muito melhor do que quando Asimo dá uma aula expositiva. A abordagem didática fez menos diferença para alunos de 7 a 10 anos.

"O fato é que a reação das crianças a um robô pode variar muito, conforme a idade e o indivíduo", disse Sandra Okita, pesquisadora da Universidade Columbia, em Nova York, e coautora do estudo.

Em suma, para que os robôs sejam mestres eficazes, terão de fazer aquilo que qualquer bom professor faz: aprender com os alunos quando uma aula está prendendo a atenção ou não.

Aprender com humanos

"Alguma pergunta, Simon?"

Numa tarde recente, Crystal Chao, pós-graduanda em robótica do Instituto de Tecnologia da Geórgia, ensinava Simon, um robô de 1,5 m de altura, a guardar brinquedos. Ela havia passado algumas instruções, mas o robô empacou.

Chao repetiu a indagação, talvez a mais fundamental de toda a educação: alguma pergunta?

"Deixe-me ver", disse Simon, com voz maquinal e infantil, apanhando um brinquedo. "Pode me dizer aonde isso vai?"

"No cesto verde", foi a resposta. Simon obedeceu e comentou: "Faz sentido".

Assim como os humanos podem aprender com as máquinas, as máquinas podem aprender com os humanos, disse Andrea Thomaz, professora-assistente de computação interativa do Instituto de Tecnologia da Geórgia e diretora do projeto. Por exemplo, disse ela, cientistas podem equipar uma máquina para entender as pistas não verbais que significam "estou confuso" ou "tenho uma pergunta" -o que lhe permite monitorar como uma aula está sendo recebida.

A capacidade de monitorar e aprender com a experiência é a próxima grande fronteira da robótica social -e provavelmente depende de desvendar os segredos de como o cérebro humano acumula informações na infância.

Em San Diego, pesquisadores estão tentando desenvolver um robô de aspecto humano, com sensores que se aproximem da complexas capacidades de um bebê de um ano para sentir, ver e escutar.

Bebês aprendem, aparentemente sem esforço, ao experimentarem, imitarem e moverem os membros. Será que uma máquina com suficiente inteligência artificial poderia fazer o mesmo? E quais sistemas de aprendizado seriam adequados?

O grupo de pesquisas adquiriu um robô japonês de US$ 70 mil, controlado por um sistema de pressão pneumática que faz as vezes de sentidos, o que lhe permite "sentir" o ambiente, além de "vê-lo" com câmeras embutidas. Essa é a parte fácil.

O desafio muito maior é programar a máquina para explorar, como fazem os bebês, e para evoluir a partir de cada experiência. Idealmente, seu conhecimento será cumulativo, não apenas lembrando a disposição de uma sala ou casa, mas usando o conhecimento armazenado para dar palpites embasados sobre uma nova sala. Os pesquisadores buscam nada menos do que capturar os fundamentos do aprendizado humano -ou, pelo menos, o seu equivalente em inteligência artificial. Se os robôs podem aprender a aprender, podem em princípio ser professores que respondam às necessidades da classe, ou mesmo de um aluno em especial.

Pais e educadores certamente têm dúvidas sobre a eficácia dos robôs, além de preocupações éticas. Mas, se os robôs sociais decolarem do mesmo jeito que outras tecnologias informáticas decolaram, os pais poderão ter perguntas mais específicas: será que esse robô realmente entende a minha criança? O seu estilo de ensinar é adequado às necessidades do meu filho, ou aos talentos da minha filha?

Ou seja, perguntas que fariam a respeito de qualquer professor.
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Colaborou Choe Sang-Hun, de Seul
Fonte: Folha online, 19/07/2010

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