PAUL KRUGMAN*
Os republicanos estão se sentindo bem a respeito das eleições de meio de mandato tão bem que começaram a dizer o que realmente pensam. Essa semana, a liderança do partido no Senado parou de fingir que se importa com déficits e disse explicitamente que, enquanto não se pode ajudar os desempregados ou prevenir demissões massivas de professores, o custo é literalmente nenhum obstáculo quando o assunto é corte nos impostos para os afortunados.
E essa é uma razão – há outras – pela qual você deve temer as consequências caso o Grand Old Party de fato se dê tão bem quanto espera em novembro.
Por um tempo, os líderes republicanos posaram de inimigos inflexíveis do vermelho (no orçamento). Há duas semanas, na resposta oficial dos republicanos ao programa de rádio do presidente Barack Obama, o senador Saxby Chambliss empenhou o seu tempo aos males da dívida do governo, “uma das ameaças mais perigosas que confrontam hoje os EUA”. E continuou: “Em algum ponto, devemos dizer basta”.
Mas, na segunda-feira, Jon Kyl, do Arizona, foi questionado com a pergunta óbvia: se os déficits são tão preocupantes, o que dizer sobre o custo no orçamento de estender os cortes de Bush nos impostos para os abastados, que o governo Obama quer deixar expirar, mas que os republicanos desejam tornar permanente? O que deveria tomar o lugar de US$ 650 bilhões ou mais em receita perdida na próxima década?
A resposta foi de tirar o fôlego: “Você de fato precisa contrabalançar o custo dos gastos aumentados. E é a isso que os republicanos se opõem. Mas você jamais deve contrabalançar o custo de uma decisão deliberada para reduzir os impostos cobrados aos americanos”. Então, é impossível pagar US$ 30 bilhões em auxílio aos desempregados, mas 20 vezes a quantia em corte nos impostos para os ricos não conta.
No outro dia, Mitch McConnel, líder da minoria no Senado, confirmou que Kyl estava reproduzindo a linha oficial do partido: “Não há evidência qualquer de que os cortes nos impostos de Bush de fato diminuíram a receita. Eles aumentaram a receita, por causa da vibração que esses cortes nos impostos tiveram na economia. Então, acho que o senador Kyl estava expressando o ponto de vista de virtualmente todos os republicanos sobre o assunto.”
Agora, há muitas coisas que se poderia chamar de economia Bush, economia que, mesmo antes da recessão, era caracterizada por fraco crescimento nos empregos e em estagnação da renda familiar – vibração não é uma das características. Mas a real notícia aqui é a confirmação de que os republicanos permanecem compromissados a um profundo vodu: a alegação de que cortar impostos na verdade aumenta a receita.
Não é verdade, é claro. Ronald Reagan disse que seus cortes nos impostos reduziriam o déficit, depois viu a dívida federal quase triplicar. Quando Bill Clinton aumentou os impostos nas rendas mais altas, os conservadores previram um desastre econômico – o que seguiu, na verdade, foi um boom econômico e uma memorável troca de déficit do orçamento para superávit. Foi quando vieram os cortes de impostos de Bush, ajudando a tornar aquele superávit em um déficit persistente, mesmo antes da quebra da bolsa.
Mas estamos falando de economia vodu aqui, então talvez não seja surpreendente que a crença nos poderes mágicos dos cortes em impostos seja uma doutrina zumbi: não importa quantas vezes você a mate com fatos, ela continua a voltar. E, apesar de repetido fracasso na prática, é, mais do que nunca, a visão oficial dos republicanos.
Por que isso deveria assustar você? No papel, solucionar os problemas fiscais dos Estados Unidos em longo prazo é factível: controle mais forte dos custos do Medicare mais um aumento moderado nos impostos nos levaria pela maior parte do caminho. E a percepção de que o déficit é administrável ajudou a manter os custos de empréstimo baixos nos EUA.
Mas se políticos que insistem que a maneira de reduzir déficits é cortar impostos não os aumentarem e começarem a ganhar as eleições, quanta fé podemos ter que o que precisa ser feito será feito? Sim, podemos ter uma crise fiscal. Mas, caso ela aconteça, não será porque gastamos muito tentando criar empregos e ajudar os desempregados. Será porque os investidores olharam para nossas políticas e concluíram, justificadamente, que nos transformamos em uma república das bananas.
É claro, flertar com a crise é possivelmente parte do plano. Sempre houve um sentimento de que a economia vodu era uma “história de capa” para a real doutrina, que era “deixe a fera morrer de fome”: golpeie a receita com cortes nos impostos, depois demande cortes nos gastos para fechar o abismo resultante no orçamento. O fato é que deixar a fera morrer de fome basicamente se resume a criar uma crise fiscal, na crença de que a crise pode ser usada para fazer passar políticas impopulares, como desmantelar a seguridade social.
De qualquer forma, realmente devemos agradecer a Kyl e a McConnel por suas repentinas explosões de franqueza. Eles agora esclareceram, caso alguém tivesse dúvidas, que a postura anterior em relação ao déficit era inteiramente hipócrita. Se realmente obtiverem a vitória eleitoral que esperam, eles não tentarão reduzir o déficit – tentarão explodi-lo ao exigir cortes nos impostos ainda mais explosivos.
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*PAUL KRUGMAN
New York Times Service
Tradução: Fernanda Grabauska
Fonte: ZH online, 18/07/2010
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