terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Niemeyer - igrejas e exéquias

Dom Antonio Carlos Rossi Keller*

A morte do Niemeyer comoveu o país. Confesso que também me comovi e rezei privadamente pela alma do homem que, embora assumidamente comunista e ateu – uma tautologia não estivéssemos no Brasil -, tem uma alma imortal.
A comoção, a meu ver, se justifica pela presença de Niemeyer no imaginário popular do homem que construiu a nova Capital, projetando nela e alhures obras arquitetônicas que ficaram gravadas na mente de brasileiros e estrangeiros. Justifica-se ainda pela longevidade do arquiteto, uma vez que a velhice, sobretudo a centenária, costuma despertar uma certa admiração e uma pontinha de inveja em todos. Um velhinho centenário é sempre uma criatura indefesa a quem queremos abraçar e proteger.
Por outro lado, Niemeyer manteve a lucidez de um gigante ao longo de seus 105 anos incompletos. E não me consta que tenha repudiado suas ideias, nada indefesas. Aliás, ninguém estaria a salvo se elas tivessem prosperado no Brasil. Onde os ídolos do arquiteto tomaram o poder deixaram um legado de morte e destruição do homem e do humano. De idealista Niemeyer nada tinha, sua ideologia era o materialismo dialético marxista e a consequente rejeição de nosso patrimônio espiritual e cultural judaico-cristão.
Nas últimas homenagens a Niemeyer puderam ser vistos dois padres, um pastor luterano e um rabino realizando conjuntamente as “exéquias” do arquiteto. Espírito cristão? À exceção do rabino evidentemente. Ausência de julgamento? Solidariedade com a família? Nada disto! Pura e simplesmente absoluto desrespeito às convicções íntimas mantidas durante décadas por Niemeyer e, como não?, aos sacramentos da fé.
Qual teria sido a reação do arquiteto se lhe fosse dada a possibilidade de despertar e dizer algumas palavras aos presentes antes de voltar ao sono da morte? Que hinos gostaria de ouvir: "com minha Mãe estarei" ou o da Internacional Socialista? Que bandeiras quereria ver hasteadas ao lado da brasileira: a do Apostolado da Oração ou da Rússia stalinista? Que símbolos ostentados: a cruz ou a foice e o martelo? Em que presença preferiria passar estes últimos instantes antes de voltar ao pó: a dos religiosos ou a dos camaradas?
Ora, demos a palavra ao morto! Bem, sabemos que o morto já as havia pronunciado reiteradas vezes antes do passamento. E não as respeitaram!
Como bons cristãos, devemos nos abster de julgar o destino da alma imortal de Niemeyer, que confiamos ao Deus bondoso e misericordioso. Como bons cristãos, devemos nos solidarizar com a dor da família, apoiando-os com nossas orações e – no caso daqueles que lhes são próximos – com a presença. Como bons cristãos, sobretudo se sacerdotes, devemos conhecer o sentido dos ritos que realizamos, sem o que são meras repetições vazias de palavras e gestos.
Niemeyer construiu algumas igrejas, é verdade. Do ponto de vista arquitetônico, o juízo sobre elas pode variar de pessoa a pessoa. Mas, da perspectiva cristã, elas são qualquer coisa exceto lugares de culto. Sua mais famosa é a Catedral de Brasília e a que foi encomendada pelo Arcebispo de Belo Horizonte, a mais recente. Dom Rossi Keller, bispo de Frederico Westphalen, diz em poucas e inequívocas palavras o que são as “igrejas” de Niemayer:
“A meu ver, a intenção do marxista Niemeyer era clara: a resignificação do sagrado... golpe do marxismo soviético, com seus imensos prédios cheios de... vazio. Expressão de uma alma sem fé: vazio, espaços vazios. Na verdade, a meu ver, era como que um grito de uma alma que teve na infância marcas católicas, mas que, infelizmente perdeu-se em uma ideologia falida. A arquitetura sagrada cristã tem alma, tem quem a habite: é casa de Deus e casa do homem. É lugar de encontro: vê-se, toca-se, sente-se o odor do eterno. Tem Presença, é habitada. Tudo aponta para a eternidade, de certa forma, já presente. A torre é como um dedo apontado para cima, para lembrar o homem que há um Deus e um céu. A abóbada é representativa do céu definitivo. O Átrio, representa as portas da eternidade, acolhedoras, abertas. A nave mostra a necessidade do caminho, do estar no mundo, etc. Niemeyer nunca poderia expressar isto em sua arquitetura, não porque não fosse capaz. Mas porque não tinha o dom da fé. Portanto sua arquitetura, a meu ver é cheia de ... vazio: bonita, elegante, até digna. Mas, infelizmente, vazia.”
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* Bispo Diocesano da Igreja Católica de Frederico Westphalen, Rio Grande do Sul.
Imagem da Internet

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