quarta-feira, 24 de julho de 2013

Há que adorar o bebe real e o Papa Chico

Henrique Raposo*

 

Comunicando a partir de uma Londres rendida a um bebé, a repórter da CNN fez beicinho: "mas porque é que eles não anunciam as coisas nas redes sociais? Porque é que não anunciam já o nome do bebé no twitter?". Esta frase é a ilustração perfeita da cegueira apressadinha dos média. Anda tudo a correr atrás do tempo instantâneo. Anda tudo numa fona para extinguir a distância entre o acontecimento e o pensamento sobre esse acontecimento. Resultado? Em nome da tecnologia e de São Steve Jobs, o irracionalismo está a ser transformado numa coisa cool. É por isso que surgem estas birras contra qualquer coisa que não ande à velocidade warp da internet.

A monarquia britânica não tem de ceder à pressa mediática. Os nossos reizinhos só têm de continuar no seu ritmo ritualizado e rendilhado. Aliás, o charme da monarquia está nesta lentidão que os cínicos apelidam de "patusca". Não, não é "patusca". O adjectivo certo é outro: "digna". A lentidão da monarquia britânica carrega consigo uma inigualável dignidade histórica e institucional. A monarquia não é um governo de quatro anos, é o símbolo da nação. O seu ritmo, portanto, não pode ser o ritmo do twitter, facebook, CNN. O seu tempo não respira internets, respira séculos, é um tempo chinês, calmo, pausado. Se funcionasse dentro da cadência da CNN, a monarquia deixaria de ser a monarquia e até deixaria de interessar à CNN. O mesmo se passa com outra instituição, o Vaticano. Durante o conclave que elegeu o Papa Chico, a cultura apressadinha que nos apascenta curvou-se perante os rituais de uma fé lenta. Naquela semana, a sociedade do twitter, dos ipads, dos iphones e demais bugigangas ficou desarmada perante o vagar litúrgico.

Confesso que me sinto vingado nessas alturas. E sinto-me vingado não apenas nas crenças. Sim, é bom ver o mundo ajoelhado perante uma religião cá de casa. Sim, é bom ver o mundo curvado perante uma monarquia constitucionalíssima. Mas aqui o ponto é outro: sabe bem ver a resistência destes dois penedos ante o furacão mediático. Quando a "agenda" é dominada pela monarquia britânica ou pelo Vaticano, os média são forçados a desacelerar, são obrigados a pensar em coisas que estão além do aqui e agora, coisas que furam o bloqueio do engraçadismo cínico, coisas como este bebé que representa séculos, um bebé que corporiza nos seus três quilos e meio a renovação de uma nação inteira, um bebé que consegue a proeza de parar os apressadinhos. Nada mal para uma instituição lenta e sem pistoleiros de twitter. 
-------------------------------------
* Colunista do Jornal de Portugal Expresso.
Fonte: http://expresso.sapo.pt/ha-que-adorar-o-bebe-real-e-o-papa-chico=f822282#ixzz2ZyQVZKiu

Nenhum comentário:

Postar um comentário