Frei Betto*
É esperançosa a mensagem do papa, mas, ao contrário do que diz
Francisco, o problema no Brasil é o lobby antigay.
Doença é a homofobia
"Se uma pessoa é gay, procura Deus e tem boa vontade, quem sou eu, por
caridade, para julgá-la? O catecismo da Igreja Católica explica isso
muito bem. Diz que eles não devem ser discriminados, mas integrados à
sociedade. O problema não é ter essa tendência. Não! Devemos ser como
irmãos. O problema é fazer lobby."
São palavras do papa Francisco ao deixar o Brasil, no voo entre Rio e
Roma. A mensagem é esperançosa, mas, ao contrário do que o papa diz, o
problema no Brasil é o lobby antigay, liderado pelo deputado federal
Marco Feliciano (PSC-SP), presidente da Comissão de Direitos Humanos e
Minorias da Câmara.
Deputados que consideram a homossexualidade uma doença propõem a "cura
gay". Querem alterar a resolução do Conselho Federal de Psicologia que
impede seus profissionais de tratar homossexuais como doentes. O que é
um gay? Como diz a palavra inglesa, é uma pessoa alegre. Se os
homossexuais são felizes, por que submetê-los à terapia?
Terapia é própria para obsessivos, como é o caso de quem odeia constatar
que homossexual é uma pessoa feliz. Isto sim é doença: a homofobia,
aliás, como toda fobia. E há inúmeras: desde a eleuterofobia, o medo da
liberdade que, com certeza, caracteriza os fundamentalistas, até a
malaxofobia, o medo de amar sobretudo quem de nós difere.
Sugiro aos deputados cortar o mal pela raiz: proibir a promíscua
narrativa de "Branca de Neve e os Sete Anões", a relação pedófila entre o
lobo mau e a Chapeuzinho Vermelho e, na Bíblia, o relato da íntima
ligação entre Jônatas e Davi, aquele que "ele amava como a sua própria
alma". (1 Livro de Samuel, 18).
Segundo censo do IBGE, há no Brasil 60 mil casais assumidamente gays.
São pelo menos 120 mil pessoas que, em princípio, deveriam ser
"submetidas a tratamento". Considerando que a Parada de Orgulho LGBT
reúne, em São Paulo, cerca de 4 milhões de pessoas, haveria que
construir uma clínica do tamanho de 50 Maracanãs para abrigar toda essa
gente.
O processo terapêutico certamente teria início com uma sessão de
exorcismo, já que, no fundo, a obsessão fundamentalista considera a
homossexualidade muito mais coisa do demônio do que doença.
Outra sugestão é comprar um armário para cada gay e obrigá-lo a ficar lá
dentro. Dizem os moralistas que qualquer um tem direito de ser gay, não
deve é sair do armário.
Imagino que, terminado o processo de "cura gay", haverá uma grande
Parada de Ex-Gays subindo a rampa da Câmara em Brasília para agradecer
aos deputados que, iluminados, aprovaram a medida.
Ainda que todos os gays sejam confinados na clínica dos deputados, de
uma coisa não poderão se queixar: será divertido contar ali com shows de
Daniela Mercury e sir Elton Hercules John.
Saiba Feliciano que Alan Chambers, ex-presidente da associação Exodus
International, destinada a curar gays, declarou em junho deste ano que
também é gay, pediu perdão pelos sofrimentos causados a homossexuais e
fechou a entidade.
À luz do Evangelho, o melhor é seguir o conselho de santo Agostinho:
"Ama e faz o que quiseres." Ou, como diz Francisco, sejamos todos
irmãos.
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* CARLOS ALBERTO LIBANIO CHRISTO, 68, o Frei Betto, é assessor de movimentos sociais e escritor, autor de "O que a Vida me Ensinou" (Saraiva)
Fonte: Folha on line, 30/07/2013
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