quinta-feira, 25 de julho de 2013

Análise: Mensagem é ao espírito, não ao corpo

CLÓVIS ROSSI*


A mensagem que o papa dirigiu a todo o Brasil, a partir da Comunidade da Varginha, fala essencialmente ao espírito e não ao corpo, ao contrário, por exemplo, da retórica da Teologia da Libertação, a corrente da igreja supostamente mais dedicada à questão social. 

O papa em momento algum do curto texto fez menção a sistemas políticos ou econômicos. O eixo central de sua mensagem são valores imateriais, o que é coerente, de resto, com trechos de suas falas anteriores desde a chegada ao Rio. 

Tanto é assim que o papa colocou acima da fome concreta de estômagos vazios "uma fome mais profunda" e esta, acrescentou, "só Deus pode saciar". 

Mesmo na menção aos pilares fundamentais de uma sociedade predominam valores, como a família, "educação integral", a saúde, inclusive a espiritual. Até a violência, fenômeno que certamente inferniza a vida da comunidade, "só é vencida a partir da mudança do coração", disse o papa. 

Solidariedade foi outro valor enfatizado, para o que o papa recorreu a uma velha e conhecida frase popular, a de que, em caso de necessidade de alimentar mais uma boca, basta adicionar água ao feijão. Em termos menos populares, deixou claro que compartilhar não é ficar mais pobre, mas enriquecer. 

Ou seja, o valor da solidariedade, que impregna o catolicismo (e todas as religiões), supera os bens materiais. É uma mensagem tradicional da igreja mas muito difícil de vender ao público em uma era de consumismo e hedonismo. 

No mais, o papa disse o óbvio e o que todos os seus antecessores de uma maneira ou outra já disseram, ao fazer "um apelo a quem mais recursos, às autoridades públicas e a todos os homens de boa vontade empenhados na justiça social: não se cansem de trabalhar por um mundo mais justo e solidário. Ninguém pode permanecer insensível às desigualdades que ainda existem no mundo". 

Desde pelo menos a encíclica "Rerum Novarum", de Leão 13, publicada em 1891, é essa a pregação da igreja, o que não impediu que as desigualdades continuassem e, pior, nos anos mais recentes, se ampliassem em alguns países ricos, antes menos desiguais. 

O papa certamente diria, a propósito, que a causa é a falta de um Deus capaz de saciar a fome de felicidade. 

De forma indireta, Francisco deu aval à proposta que a presidente Dilma Rousseff lhe fez, de colaboração em iniciativas contra a pobreza. O papa ofereceu "colaboração à qualquer iniciativa que possa significar um verdadeiro desenvolvimento de cada homem". 

No conjunto, uma mensagem atemporal, como costuma ser próprio da igreja. 
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* Colunista da Folha
Fonte:  http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/07/1316495-
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