segunda-feira, 19 de julho de 2010

Cristovam Buarque - Entrevista

eleições 2010



 
Ex-governador do DF defende a aliança entre a esquerda e o PMDB
e afirma que a parceria é fundamental para viabilizar a
 vitória contra Joaquim Roriz


O embate entre vermelhos e azuis na capital da República sempre teve alguns personagens emblemáticos. Enquanto o ex-governador Joaquim Roriz (PSC) é o expoente histórico do lado anil, os rubros obtiveram a maior vitória com Cristovam Buarque. Ex-reitor da Universidade de Brasília, Cristovam surpreendeu a cidade ao ser eleito governador, em 1994, contra o candidato de Roriz. Nas duas eleições seguintes, foi a vez do troco dos azuis. Dezesseis anos depois, passada uma enorme crise política e o fortalecimento do antigo governador, muitos apostavam na tradicional disputa. Mas desta vez, Cristovam preferiu tentar a reeleição ao Senado Federal. Depois de deixar o Partido dos Trabalhadores, se filiar ao PDT e disputar uma campanha presidencial, ele acredita que é hora de continuar o trabalho como parlamentar. Cristovam sabe o quanto é difícil derrotar o adversário, mas garante que ele não é imbatível. “Ninguém pode negar que ele tem carisma e uma gratidão muito grande de quem ganhou um lote, mas acho que todo esse movimento ético e a Caixa de Pandora acabam afetando a força dele”, aposta. Para a disputa, os partidos considerados de esquerda fizeram uma parceria com o PMDB, ex-legenda do rival. Com isso, precisam contornar as divergências históricas entre os grupos. Para Cristovam, a aliança vale a pena. “Seria muito difícil vencer a eleição para governador sem (Tadeu) Filippelli”, diz ao se referir ao presidente do PMDB no DF e considerado antigo braço direito de Roriz. Para completar a estratégia, o senador aposta que a fórmula é elaborar um bom plano de governo. “Precisamos definir claramente as nossas bandeiras para que o povo vote na gente e não vote contra o Roriz.”

Sem o direito de perder

Com a crise política que abateu Brasília, o seu nome foi lembrado por muita gente como forte candidato a governador. Por que o senhor não quis se candidatar ao GDF?
Brasília precisa de pessoas que a administrem e de outras que a representem no cenário nacional. Agnelo Queiroz fará o trabalho como eu faria, mas ter um representante como eu é difícil, porque se leva muito tempo para isso. Há 12 anos, eu dedico minha vida pública a uma causa nacional, que é fazer uma revolução na qual a escola do mais pobre vai se tornar tão boa quanto a escola do mais rico. Para ser governador, eu teria de parar toda essa luta. O maior partido dessa cidade é o PT, e eu sou do PDT. O governador daqui deve ser do PT.

Não gostou de ser governador?
Adorei ser governador, como adorei ser reitor (da Universidade de Brasília), mas não vejo por que querer repetir o que já se fez. Em geral, não dá certo. O Lula é o primeiro presidente no qual o segundo mandato foi igual ou melhor ao anterior. É muito difícil competir com você mesmo. Fiz um bom governo, apesar de ter sido derrotado para a reeleição. Meus projetos até hoje estão sendo copiados. A marca principal do governo Lula é o Bolsa Família. Foi inventado aqui no Distrito Federal.

O senhor já disse que gosta da Marina Silva, tem uma boa
relação com o José Serra e o seu partido é coligado com o PT. Em quem vai votar para presidente?
Vou votar na Dilma. Esses três são pessoas decentes, não têm os resquícios do regime autoritário e não vêm da direita conservadora. Em 1998, o Serra fez campanha para mim e subiu no meu palanque. Marina, além de amiga, foi minha aluna. Tenho um carinho muito grande por ela. A Dilma vem dessas forças progressistas, é uma mulher que lutou contra a ditadura e foi do PDT por quase todo tempo. Voto nela porque sou de uma frente que tem Dilma como candidata a presidente. Não tenho o direito nem a razão de votar em outra pessoa.

Na crise da Caixa de Pandora ficou clara uma relação muito
promíscua entre o governo e os deputados distritais. Quando o senhor era governador, os deputados faziam propostas indecorosas?
O que mais me orgulho é que ninguém chegou a propor esse tipo de coisa. Nunca recebi uma proposta de empreiteiro e acho que nenhum secretário do meu governo recebeu. O que havia eram discussões sobre quem seria o administrador de uma cidade, barganhas ao nível da política, mas sem envolver dinheiro.

O senhor teve uma oposição ferrenha na Câmara Legislativa liderada por Luiz Estevão e Tadeu Filippelli, que agora é seu aliado. Como o senhor avalia essa aliança?
Eu defendo a aliança. Nós temos dois lados nesta eleição. O Filippelli veio para o lado da gente e trouxe o PMDB. Não temos o direito de perder essa disputa. A vinda do Filippelli é quase que uma condição para viabilizar a eleição do Agnelo. Seria muito difícil ganhar sem ele. Há uma dúvida se Roriz será candidato. Se ele não fosse, poderia ser Agnelo contra Filippelli. Agora, o que a gente tem de discutir é como será o governo. Qual o papel, terá o Filippelli e qual será o comportamento dele. Mas, pelo que tenho conversado com ele, acho que o mesmo tipo de contribuição que ele está dando para ganhar a eleição, ele vai dar para que seja um bom governo.

Ele vai ter força na área de obras como sempre teve em Brasília?
É cedo para falar sobre isso. Temos de mostrar que o nosso governo é diferente. E vai ser preciso ter a colaboração do próprio Filippelli para provar isso. Independentemente de quem será o secretário, temos de acabar com a promiscuidade entre empreiteiros e governo.

Existe alguma restrição em subir no palanque com políticos envolvidos na Caixa de Pandora?
Quando o PT votou por aceitar o PMDB, colocou-se uma condição de que os envolvidos não estivessem no palanque. Não só fisicamente, mas no sentido de disputar a campanha. Pelo que tenho acompanhado, não sei se todos, mas muitos já estão fora. Ou porque foi cassado, ou porque optou por não ser candidato, ou alguma outra influência dentro do PMDB.

Mas Benício Tavares e Rôney Nemer continuam e são candidatos.
Esse é um problema que o PT e o PMDB vão ter de resolver no processo. Eu sou parte e não vou dizer que não tenho responsabilidade, mas houve um acordo de que essas pessoas não estariam no palanque.

Sente-se constrangido de fazer campanha com eles?
Até aqui eu não fiz campanha com nenhuma dessas pessoas. A única pessoa com quem fiz campanha foi com o Filippelli e, sinceramente, não tenho me sentido constrangido. Com a base do PMDB também não tenho sentido constrangimento. Aliás, tenho sido tratado de forma muito respeitosa e carinhosa pela militância do partido.

Essa é a primeira vez que faz campanha em Brasília fora do PT. Como está a relação com a militância petista?
Na semana passada, estive em um evento com o presidente Lula e disse para ele que estou em lua de mel com o PT. Estou positivamente surpreso com a receptividade que tenho recebido do Partido dos Trabalhadores.

Depois que saiu do PT, o senhor entrou em um clima de divergência e fez muitas críticas ao governo federal. Isso pesou na hora de fazer a aliança?
Não. Eu não saí do PT porque fui demitido por telefone. Eu saí dois anos depois disso. Foi um longo processo, porque eu faço política para fazer uma revolução na educação, e não estava sentindo no governo essa predisposição. O governo Lula fez mudanças substanciais em quase tudo. Na educação de base, fez uma evolução na mesma velocidade que vinha sendo feita há 20 anos. Não houve um salto. Chegou um ponto em que eu tinha de fazer um gesto. Ou ficava PT, terminava o meu mandato e voltava para a Universidade de Brasília em horário integral ou mudava de partido. Eu sempre disse que estava pronto para ser candidato a presidente outra vez, mas no DF não seria contra o partido. Porque minha relação com o PT no Brasil é política e no Distrito Federal, é psicológica.

O senhor já falou que colocaria a bandeira do PT no caixão.
Vai ter do PT, mas também do Náutico, do Brasil, do Distrito Federal, da UnB e do PDT. Eu não repudio nada do que fiz até aqui. Para mim, não foi um erro ter saído do PT. As pessoas dizem que eu fui contra o Lula, mas não tem uma votação minha contra o governo. O que faço é crítica de uma pessoa leal sobre o fato de não se ter feito mudanças na educação. O único choque maior foi na relação interna do governo com o PMDB no Senado.

Agora está novamente junto ao PT no DF.
Há alguns anos, eu disse que estaria aqui com o PT ou não seria candidato. Uma vez eu comuniquei ao governador Arruda que não estaria com ele em 2010. E o governador Arruda, com aquela habilidade dele, disse que tudo bem, mas queria o Marcelo Aguiar como secretário para implantar a escola em horário integral.

Mas isso não era um consenso dentro do PDT.
Não era. Essa era a minha posição. Se a gente escolhesse um lado ali, o partido se esfacelava. Se dissesse para fazer oposição radical ou para entrar no governo Arruda, o partido ia ficar dividido e acabava. Por isso, ficamos esse tempo todo autorizando quem quisesse entrar no governo. Diferente de agora. O Marcelo Aguiar quis ir para o governo Rosso por uma opção dele, que eu respeito. Ele não foi com o nosso apoio.

O governador Rogério Rosso lhe ligou para tratar do assunto?
Ligou para dizer o que ia fazer, não para perguntar a minha opinião. Porque eu defendia que o partido não deveria participar do governo. Eu disse ao Marcelo que, como partido, ele não deveria entrar até que o governador demonstrasse que ele fez uma ruptura com o passado.

Ele está demonstrando isso?
O Rosso está sendo muito habilidoso. Está mantendo-se equilibrado. Não mostrou que está havendo uma ruptura, mas também não se pode dizer que é uma continuidade.

Roriz imbatível ou dá para derrotá-lo?
Imbatível ele não é. Roriz sempre ganhou por uma diferença muito pequena. Tanto de mim, quanto do (Geraldo) Magela e do Agnelo, em 2006, para o Senado. Forte ele é, mas ele nunca venceu por uma avalanche de votos.

Por que o Roriz mantém essa força, mesmo depois de tantas denúncias?
Ninguém pode negar que ele tem carisma e uma gratidão muito grande de quem ganhou um lote, mas acho que todo esse movimento ético e a Caixa de Pandora acabam afetando a força dele. E o pessoal do lote está envelhecendo. Tem uma geração nova surgindo que a gente ainda não consegue medir para onde vai.

Em quem o senhor votou em 2006 para governador do DF?
Votei na Arlete (Sampaio). Não disse naquele momento por que era candidato a presidente. Não tinha porque escolher um lado, uma vez que o meu partido não tinha candidato e ia acabar deixando todos os outros contra mim. Na verdade, acho que a maior parte dos candidatos do PDT votou no Arruda.

No DF virou tradição o suplente assumir a vaga no Senado. Os seus suplentes estão aptos a serem senador se for preciso?
Acho que sim. O Wilmar Lacerda é um dos mais hábeis políticos do PT. Ele é o executivo do PT Nacional, o gerente do partido. O outro (Roberto Wagner, do PRB) é um comunicador antigo e é um advogado muito conhecido.

Como o Agnelo vai conseguir criar uma relação com a Câmara Legislativa?
Vai depender da eleição. A gente tem de brigar para ter uma boa bancada. De qualquer maneira, acabou o tempo do mensalão. Acho que mesmo que o Roriz ganhe, e ele não vai ganhar, até porque não se sabe se continuará sendo candidato, mas qualquer um que venha a ganhar não vai poder ter uma relação como foi a última.

Caso o Roriz tenha o registro negado, como vai ser a repercussão em Brasília?
Ele vai escolher um candidato e jogará toda a sua força. Vai tentar ganhar simpatia dizendo que foi vencido no tapetão, que tínhamos medo dele e por isso o tiramos por meio da Justiça. Por isso, precisamos definir claramente as nossas bandeiras para que o povo vote na gente e não vote contra o Roriz. É um erro querermos ganhar por sermos contra ele. Temos de ganhar por causa das nossas propostas. Se a gente tiver um bom programa e souber traduzir isso na linguagem da população, pode vir Roriz ou quem ele quiser que a gente ganha. Nós temos de dizer como será feito para que no próximo governo seja impossível roubar.

O DF sempre elegeu um senador de cada lado. Por que agora o senhor acredita que pode ser eleito com o Rodrigo Rollemberg?
O nosso destino está muito ligado, ou elegemos os dois ou perdemos juntos. Na minha última eleição, tive muitos votos do outro lado, mas dessa vez isso vai acontecer menos. Nunca estiveram tão claro os dois lados.

Qual o maior problema do grupo adversário?
Acho que é o cansaço. Eles estão há muito tempo no governo. Ficamos só quatro anos. No resto, desde o começo, está o mesmo grupo. Roriz iria para o quinto mandato. É muito tempo no poder. O povo cansa. É preciso renovação.
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Reportagem por :Ana Maria Campos Ricardo Taffner
Fonte: Correio Braziliense online, 19/07/2010

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