quinta-feira, 8 de julho de 2010

O luxo que cresce...

Expansão:
Henri-François Pinault, CEO do grupo PPR,
está no Brasil para decidir onde colocará lojas de sua grifes
Balenciaga, YSL e Bottega Veneta vêm aí
O bilionário francês Henri-François Pinault podia ser visto ontem no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, torcendo pela Espanha. Um entusiasta do futebol, ele atrasou o embarque para o Rio só para acompanhar a semifinal contra a Alemanha. "Quando a França ganhou a Copa em 1998, a vitória trouxe uma onda de otimismo para a economia. Então, como sou latino e tenho muitos negócios na Espanha, torço por eles. Minha mulher é mexicana, acabo pendendo mais para eles ainda", brincou. Sua vibração pela vitoriosa Fúria, contudo, não chegou aos pés de sua expectativa com os times africanos ou com o Uruguai - todos usando uniformes coladinhos Puma, uma de suas marcas.


Aos 48 anos, Pinault é dono de uma das maiores fortunas da França. É chairman e CEO do grupo PPR (Pinault-Printemps-Redoute), um conglomerado que faturou €16, 9 bilhões em 2009 e envolve operações de varejo como Fnac, Conforama e Redcats; grifes de luxo como Gucci, Balenciaga, Bottega Veneta e Yves Saint Laurent, entre outras; e a marca esportiva Puma. Não bastasse o brilho dessas bandeiras, Pinault agregou mais uma estrela ao seu universo ao casar oficialmente, no ano passado, com a atriz Salma Hayek, mãe da caçula de seus três filhos, Valentina Paloma.

E o moço, claro, ainda tem berço. Seu pai, François Pinault, é dono da holding Artemis que, entre outros negócios, tem a casa de leilões Christie's e o ícone de Bordeaux, Château Latour. Como a família é da região da Bretanha, pai e filho são muito empenhados em ações locais. O que se estende, é claro, ao futebol. Henri-François é o responsável pelo Rennes, clube da primeira divisão do campeonato francês, e onde Luis Fabiano estreou na Europa.

Há dez anos ele não vinha ao Brasil. A última vez foi em 1999 quando veio inaugurar a primeira Fnac no Brasil. Comprou o que era então uma operação de varejo da editora Ática, no bairro de Pinheiros, em São Paulo, uma loja "totalmente inspirada" na Fnac, e que acabou por se converter na bandeira francesa.

Pinault está de volta agora para investigar o mercado nacional, atraído pelo "boom" da economia nacional. Procura endereços em São Paulo para abrir num prazo de 12 a 18 meses lojas das grifes Balenciaga, Yves Saint Laurent e Bottega Veneta. Num prazo ainda mais curto, quer mais uma Gucci, mas ainda sem cidade definida - tem uma no shopping Iguatemi e outra na Villa Daslu.

Em busca dos melhores pontos, ele encontrou-se com Carlos Jereissati do grupo Iguatemi e, como estava hospedado no hotel Fasano, foi dar uma volta na rua Oscar Freire, que fica próxima. Seu braço direito Robert Polet foi ao shopping Cidade Jardim, do grupo JHSF. No processo de desenvolvimento internacional do PPR, os países emergentes são a "chave". As nações de novos ricos responderam por 39% das vendas do grupo Gucci neste primeiro trimestre, onde concentram 157 de suas 615 lojas próprias das grifes de luxo.

Para chegar mais próximo de um diagnóstico do país, Pinault teve encontros com outros empresários como Eliana Tranchesi, da Daslu, além de consultores especializados, entre eles, os da McKinsey. A agenda carioca de hoje incluía Oskar Metsavaht, da Osklen, e Roberto Stern, da H.Stern. Fez uma visita especial a Track & Field, marca esportiva nacional. Uma das estratégias de Pinault para o grupo PPR é agregar novas etiquetas de lifestyle esportivo e performance ao redor da Puma, formando assim um núcleo de "massa". Ele procura por empresas médias, com identidade definida, que tenham potencial de internacionalização. Daí seu interesse pela Track & Field.

Mas ir às compras, em época de crise, não é uma questão de impulso. Em novembro do ano passado, Pinault anunciou que para se concentrar nas frentes de grifes de luxo - capitaneada pela Gucci -, e na de marcas esportivas - que vão gravitar em torno da Puma -, seria necessário vender suas operações de varejo: Fnac, Conforama e Redcats. A notícia foi uma bomba tão grande quanto o futebol apresentado pela França nessa Copa, ainda mais pela empresa estar listada na bolsa de Paris.

Pinault garante que a decisão foi tomada em 2005, o ano que assumiu como CEO do grupo - antes ele ocupava a mesma função apenas na Fnac. Diz que a venda da divisão de varejo não se deve ao desempenho insatisfatório das redes. "Elas têm se saído bem, apesar da crise." (veja quadro) E que por isso não precisa correr para vender a Fnac, por exemplo. Tanto que vai continuar a esticar a rede no país. O braço brasileiro da operação vai melhor ainda, afirma ele, com a abertura da décima unidade no país, em Belo Horizonte.

Na sua primeira passagem pelo Brasil, passou dois dias em São Paulo. Dessa vez ficou três na capital paulista e partiria hoje do Rio. Turismo não entrou na programação. Mas Pinault conseguiu provar o cardápio do melhor restaurante no país, o DOM. Destaque para o aligot (purê de batata com queijo), preparado por Alex Atala. "É incrível". Entre um café expresso duplo e garrafas de água Panna, que inclusive serviu à repórter, na anti-sala de sua suíte, no Fasano, ele concedeu a seguinte entrevista ao Valor.

Valor: O Brasil mudou muito desde que o sr. inaugurou a Fnac aqui em 1999?
Henri François-Pinault: Sim, não era como é hoje. Era com inflação alta, dificuldade de importar produtos via Miami. A questão da segurança era muito difícil. Nosso depósito ficava fora de São Paulo, então, havia roubo de caminhões. Foi difícil, mas decidimos ficar. Ainda era só uma loja, tínhamos planos de abrir uma e depois outra. Devagar, mas em definitivo. E hoje, temos 9 lojas e vamos abrir a décima em outubro em Belo Horizonte.

Valor: A Fnac vive um bom momento no Brasil?
Pinault: A boa notícia é que estamos aqui no momento certo, para aproveitar a oportunidade do enorme potencial do país. Há dez anos fazemos bons negócios no Brasil. A Fnac pode chegar entre 35 a 50 lojas no país. Não faremos isso imediatamente, precisamos achar os lugares. Temos que fazer isso do jeito certo.

Valor: Mas o senhor não anunciou que estava vendendo a Fnac?
Pinault: Sim. Mas é um tópico diferente. Mas deixa eu explicar a estratégia da PPR. Eu assumi a posição de CEO da PPR em 2005. Quando eu cheguei, fiz uma revisão de todos os negócios que tínhamos dentro da PPR para ver qual era o potencial e as ambições para os próximos 10 anos. Então, tínhamos a divisão de luxo, que estava começando a ir muito bem. E do outro lado, o que eu chamo de divisão de mercado de massa da PPR, naquela época, a Printemps, a Fnac, a Conforama, e Redcats. Se você quiser ser forte como varejista, você precisa ter uma posição muito forte no seu mercado doméstico. Isso é sempre verdade. Veja o WalMart, ele é muito poderoso nos EUA. E por isso é poderoso na Inglaterra. É uma condição, ser forte e ter a chance de expandir internacionalmente. É o nosso caso. Somos bem fortes na França com a Fnac, a Redcats e a Conforama. E a consequência é que, por volta de 65% do faturamento de €16,9 bilhões, ou seja €11 bilhões vêm do varejo. E €7 bilhões do faturamento total é na França. Então, o grupo tem um alto nível de dependência da economia francesa. É muito difícil ter crescer por causa do fato da França não crescer. A conclusão que eu tirei naquela época, e fiz uma proposta para o conselho de diretores da PPR, foi nos concentrarmos nas operações que nos dessem maior projeção internacional. A primeira manobra foi vender a Printemps, em 2006. Ao mesmo tempo, decidimos olhar para negócios que pudéssemos comprar para fazer essa transformação no grupo. Procuramos diferentes companhias. Em 2007, fizemos um acordo e assumimos o controle da Puma com uma oferta para a aquisição. Essa foi a chave para montar a divisão de mercado de massa. Vimos que o futuro seria construir um portfólio de vestuário e acessórios pelo lado do luxo, e de marcas esportivas e acessíveis a partir da Puma. Comecei a vender os negócios menos importantes que estavam no grupo. O primeiro foi a YSL Beauté, que licenciamos para a L'Óreal. E com o sucesso desta iniciativa, decidimos vender as operações de varejo - Fnac, Conforama e Redcats - para termos condições de fazer outras aquisições.

Valor: Mas então chegou a crise.
Pinault: No começo de julho de 2008, a crise financeira chegou. Não havia mais possibilidade de vender ou comprar companhias porque era impossível achar financiamento. Decidimos fazer uma pausa, e trabalhar, de meados de 2008 até abril de 2009 para reestruturar nossos negócios, trabalhar com os preços. Trabalhamos muito, até com a divisão de luxo e a Fnac, reestruturando e reorganizando, tentando atividades diferentes em todos os lugares. Atravessamos a crise até que muito bem, porque conseguimos manter a margem de lucro da PPR de 2009 em comparação com a de 2008, o que foi uma grande conquista. E foi dentro dessa estratégia que tomamos a decisão de vender, sem pressa, a Fnac, a Conforama e a Redcats. Mas isso foi anunciado publicamente só em novembro passado.

Valor: Mas se a estratégia era essa porque só anunciaram no ano passado?
Pinault: Porque quando você anuncia o que você vai fazer, existe muita pressão. Por isso não dissemos nada sobre isso em 2005, em 2006, em 2007 e em 2008. Vamos construir o grupo focando em vestuário e acessórios em dois segmentos, o de luxo e o de massa. Isso será feito com dois portfólios. Um que é o da Gucci, que já existe e podemos tornar mais forte no futuro. O outro com a Puma, que construiremos assim que pudermos vender em boas condições as operações de varejo. Então, é importante entender isso: não é que essas operações não sejam um bom negócio. São maravilhosas e muito lucrativas. É só por causa da estratégia assumida pelo grupo. Então, é por isso que a Fnac, como você perguntou, vai ser vendida. Não tenho nenhum problema com ela. A Fnac teve um ano incrível, está crescendo e é muito lucrativa. Tem um enorme potencial de crescimento, graças ao Brasil. O que não é o caso de nenhuma operação da Europa Ocidental . E no Brasil, a Fnac é prioridade máxima.

Valor: O que torna o Brasil estratégico para a Fnac?
Pinault: Temos uma operação muito forte aqui, numa economia que cresce, que é chave. Não temos nenhum concorrente da Europa nesse negócio. Dart não está aqui. Media Markt que é a número 1 na Europa em eletrônicos, não está no Brasil. Por termos essa vantagem é que devemos acelerar o processo aqui.

Valor: O senhor pretende abrir novas lojas no Brasil? De que marcas?
Pinault: Primeiro, o mercado de luxo é a principal prioridade e está crescendo nos países emergentes. Os consumidores estão cada vez mais comprando produtos de luxo. Se quisermos ter crescimento nos próximos 10, 15 anos temos que estar nesses países. Isso significa que estão no topo da nossa lista. O potencial do Brasil é incrível, mesmo com as dificuldades de importação. Mas basicamente, o que chamamos de nossas "global brands" que são a Gucci, YSL, Bottega Veneta e Balenciaga estarão no Brasil nos próximos meses .

Valor: Em poucos meses?
Pinault: Entre 12 e 18 meses, com certeza. Não há como não termos essas marcas aqui. Essas são as nossas grifes de âmbito mundial, têm a mesma estratégia. Claro que a Gucci está muito mais avançada do que as outras. As outras estão sendo abertas agora na China. A YSL foi aberta no ano passado. A Balenciaga também há 4 anos. Bottega há 3 anos. Então, estamos procurando lugares para essas lojas aqui no Brasil.

Valor: Então, a Gucci vai ser mais rápida do que as outras?
Pinault: Com a Gucci temos duas lojas. E planos para abrir mais. Vocês têm um bom potencial aqui. O fato é que precisamos ter cuidado por causa das taxas de importação. Se levarmos isso em consideração a diferença do preço daqui e dos EUA é muito grande. Se não houver uma mudança, os consumidores brasileiros terão que comprar no exterior. E se for assim, não há motivo para abrir 10, 15 lojas no país, que funcionariam só como showroom.

Valor: Nesse caso, as novas lojas serão operadas diretamente?
Pinault: Podemos ter parceiros. Mas o ideal para essas quatro marcas seria as lojas próprias. Mas, em cidades grandes, podemos ver se acharmos um bom parceiro, uma loja de departamentos, como nos EUA.

Valor: Não temos lojas de departamentos por aqui nesses moldes
Pinault: Não, mas eu ouvi que há alguns modelos que têm ambientes especiais, que proporcionam boa experiência de compras. É possível também uma parceria com shoppings como o Iguatemi que têm as licenças da Diane Von Furstenberg e do Christian Louboutin.

Valor: Mas sempre começando por São Paulo?
Pinault: Normalmente, sim. 70% dos nossos negócios estão aqui, então faz sentido.

Valor: E a próxima Gucci vai ser em São Paulo?
Pinault: Já temos duas lojas aqui. Uma no Iguatemi e outra na Villa Daslu. Então, a próxima não vai ser em São Paulo. Não sabemos onde ainda. Mas é bom ressaltar que mudamos o direcionamento da Gucci por aqui. No ano passado, o Brasil e a América Latina estavam sob a responsabilidade do time dos EUA. Então não tínhamos uma leitura correta do mercado. Agora mudamos isso. Estamos com um brasileiro responsável pelo Gucci Group no Brasil e na América Latina. O nome dele é Roberto Paz. E ele está com na Gucci há 20 anos. Talvez ele seja o melhor varejista que temos aqui nessa divisão. E ele conhece o Brasil, entende o que deve ser feito e onde. Foi por isso que vim aqui. Agora, estamos no lugar certo, e em forma para acelerar a expansão no país.

Valor: O sr. tem interesse em comprar alguma marca brasileira?
Pinault: Na frente de luxo não porque temos de expandir a rede já constituída. Mas no portfólio de massa queremos reunir ao redor da Puma marcas de lifestyle esportivo. Se encontrarmos alguma oportunidade que complemente o portfólio por que não? O Brasil tem marcas muito legais. O lifestyle brasileiro é muito significativo.

Valor: O sr. visitou a Track & Field. O que achou?
Pinault: É um conceito muito interessante em fitness.
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Reportagem: Angela Klinke, de São Paulo
Fonte: Valor Econômico online, 07/07/2010

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